Jovem nega agressão a motorista de ônibus que despencou no Rio
"A última cena que eu tenho em mente é quando eu estava segurando na barra de ferro perto da porta e ouvi o ônibus bater na lateral. Com o impacto, ele [o condutor] caiu sobre o volante porque estava discutindo comigo", conta o estudante Rodrigo dos Santos Freire, 25.
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Ele e o motorista André Luís Oliveira, 33, são acusados de homicídio por terem provocado o acidente com o ônibus que despencou de um viaduto no Rio de Janeiro matando oito pessoas, no dia 2 de abril.
Apoiado em muletas, com ferimentos nas pernas, fratura na bacia e o rosto coberto parcialmente por uma máscara cirúrgica para proteger uma lesão na mandíbula, o universitário chegou caminhando lentamente no escritório do advogado Gentil Portela Cordeiro, onde falou pela primeira vez sobre o acidente.
"Não fui eu o grande insano que chegou lá e deu um monte de chute na cara do motorista sentado e dirigindo", diz, enquanto tenta reconstituir o que aconteceu naquele ônibus da linha 328, que liga a Ilha do Governador (zona norte) ao centro do Rio.
Passageiros disseram à polícia que Freire teria agredido o motorista com chutes no rosto em meio a uma discussão.
Sexta-feira, à Folha, o jovem reconstituiu com detalhes o ocorrido no ônibus. Mas, quando questionado diretamente sobre as agressões, é vago. "Não tenho essa parte clara na minha mente".
"Peso 57 quilos. Eu não tenho força para chutar uma pessoa e fazer ela desmaiar. Agredir uma pessoa sentada é um ato de covardia."
O jovem contou à Folha que naquela tarde estava atrasado para o segundo dia de aula no curso de licenciatura em física da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Ele entrou no ônibus por volta das 16h10 e sentou-se em um dos bancos atrás do motorista. Lia um livro de cálculo quando percebeu que estava próximo de seu ponto. O sinal para que o ônibus parasse, diz, já estava acionado.
Freire afirma que só se levantou quando o ônibus parou, já que o veículo seguia em alta velocidade. Então, a porta foi aberta. Ele diz que, quando se aproximou da saída, o motorista fechou a porta e arrancou. Ele diz ter gritado, mas ignorado, correu para frente do ônibus, pulou a roleta e mais uma vez gritou, dizendo que queria descer.
Freire diz ter sido agredido verbalmente pelo motorista. "Ele disse: `quem mandou você ir rebolando'". Em sua versão, o motorista parou nos dois pontos seguintes sem abrir a porta da frente e até se levantou para discutir com ele.
Nesse tipo de ônibus, os passageiros entram pela porta da frente, pagam a passagem ao motorista, que também é cobrador e passam pela roleta. A porta de saída fica na parte de trás do veículo.
"Eu falava: cara você está maluco. Está me sequestrando, me mantendo em cárcere. Não tinha fundamento me manter ali. Era um direito meu exigir sair", afirma.
Com a dicção dificultada pela perda de sete dentes no acidente, diz que se arrepende de ter pego aquele ônibus. "O que mais me abala foi o fato de eu ter quase morrido, de terem ocorrido diversas mortes. E de eu ter que mostrar para os familiares dessas vítimas que não sou culpado".
Para ele, a culpa do acidente é da empresa de ônibus Paranapuan. "Aquele motorista não estava num bom momento. Estava a fim de descontar a raiva dele", diz, acrescentando: "Ele disse 'fica quieto aí se não vou te jogar dessa porra'. Me ameaçou várias vezes."
Daniel Marenco/Folhapress | ||
O estudante Rodrigo Freire, 25, diz não ser o responsável por queda de ônibus de viaduto no Rio |
COMPORTAMENTO
Na faculdade, Freiere é apontado como "um estudante exemplar" por estar entre os três melhores alunos de sua turma com índice 7,8 de CR (Coeficiente de Rendimento).
"É inexplicável e lamentável o que aconteceu porque ele sempre foi um rapaz motivado, participativo, educado, pontual e, se não fosse o acidente, tudo indica que ele teria virado monitor", diz o coordenador do curso de Física, João José Fernandes de Sousa.
Freire já se envolveu em dois casos de agressão, ambos registrados na 37ª DP. A primeira, em 2010, por lesão corporal contra a dona do imóvel alugado por ele; a segunda, em 2012, contra o cunhado, também por lesão corporal.
"Só lembro de um desentendimento que tive com o meu cunhado, numa briga que ele teve com a minha irmã. Ele registrou queixa num momento de raiva, mas hoje somos grandes amigos", diz.
Ele diz que tem feito consultas semanais com uma psicóloga. "Graças a Deus tenho a mente tranquila. Não fui causador daquele acidente, daquelas mortes. Sobrevivi por um milagre".
A reportagem foi até a casa do motorista André Luís de Oliveira, na última quarta-feira, na favela Parque União, no Complexo da Maré, zona norte, mas uma moradora do imóvel disse que ele não voltou mais ao local após o acidente.
O advogado do motorista também não foi encontrado. A Folha entrou em contato com empresa Paranapuan, mas não recebeu retorno até a conclusão desta edição.
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