Iraque, Líbano e Jordânia surgem após Primeira Guerra Mundial
Até a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a maior parte da região conhecida como Oriente Médio fazia parte do Império Otomano. Após o conflito, o território que atualmente leva o nome de Síria e Líbano passou para o controle da França. O Reino Unido, por sua vez, passou a dominar o que equivale a Iraque, Israel, Jordânia e territórios palestinos.
As fronteiras criadas com a divisão entre as duas potências são um dos principais fatores que desencadearam os conflitos regionais que ainda persistem, segundo especialistas entrevistados pela Folha Online. Além das divisões, o favorecimento das minorias e os movimentos nacionalistas também são apontados como motivos para a instabilidade local.
Khalil Hamra/AP |
Militantes palestinos do grupo Hamas; fronteiras, nacionalismo e favorecimento de minorias fomentaram instabilidade na região |
"A França e o Reino Unido assinaram um tratado que dividia os territórios do Oriente Médio de acordo com os seus interesses, sem necessariamente levar em consideração os antigos laços étnicos e políticos que existiam na região há muitas gerações sob o Império Otomano", disse, por telefone, à Folha Online Joshua Gleis, membro do Belfer Center for Sciences and International Affairs da Universidade Harvard.
As fronteiras estabelecidas "não eram necessariamente aceitas como legítimas, naturais, ou mesmo realistas pela população que vivia nesses países", de acordo com Theodore Feifer, pesquisador que participou de diversas conversas de paz na região enquanto trabalhou no Departamento de Estado dos Estados Unidos.
As divisões territoriais foram criadas também em função das promessas feitas a vários grupos locais, explicou Feifer. O especialista em Oriente Médio cita como exemplo as promessas feitas pelos britânicos aos judeus e aos árabes de que, se eles se unissem à revolta contra os otomanos, receberiam seu próprio país.
Minorias
Os movimentos nacionalistas, segundo Gleis, coincidiram com a Primeira Guerra. Para o acadêmico, o que potencializou os efeitos negativos das fronteiras artificiais e do nacionalismo foi a forma como as potências operavam na época do pós-guerra. "Elas pegavam a minoria de uma região específica e lhe davam o poder local", disse Gleis. "A razão pela qual faziam isso era porque sabiam que, se essas minorias deixassem de se alinhar com a França ou Reino Unido, então eles perderiam o poder."
Marcelo Katsuki/Fol | ||
O analista afirma que essa é a razão pela qual os sunitas chegaram ao poder no Iraque, os alauítas se tornaram poderosos na Síria, e os cristãos, no Líbano.
"Esse é o cerne do problema que vemos hoje --uma mistura de fronteiras erradas, países que reclamam o controle de uma certa região e histórias nacionalistas conflitantes, como você no conflito israelo-palestino." Para o analista, o que provavelmente foi o maior fator de mudança na Primeira Guerra Mundial foi a criação de novos países por todo o mundo, e mesmo na Europa.
Israel
Sobre a criação de Israel, Feifer afirma ser uma questão mais ampla. O movimento nacionalista (sionista) judeu se desenvolveu em meio aos movimentos nacionalistas europeus do século 19. "No entanto, os otomanos tinham a Palestina [território que atualmente abrange Israel, a Cisjordânia e a faixa de Gaza]", disse o pesquisador.
Os judeus já falavam com os otomanos sobre terem seu Estado, segundo Gleis. "O que mudou foi que eles [britânicos] tinham compromissos com os judeus, de apoiar uma nação judia na Palestina", afirmou Feifer.
Com os otomanos sendo derrotados na guerra e os britânicos assumindo o controle na região, a criação de um Estado judeu parecia mais viável. No entanto, Israel só seria criado em 1948, após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Para Gleis, a criação de Israel não difere de outros países que surgiram na mesma época, como Jordânia, Líbano e Iraque, exceto pelo fato de o nacionalismo ter ganhado terreno entre os judeus antes que entre os outros povos da região.
"Se você olhar para os países independentes antes da Primeira Guerra, você não consegue encontrar muitos, especialmente no mundo árabe", disse Gleis. "O nacionalismo chegou ao mundo árabe um pouco depois, mas a Primeira Guerra Mundial fomentou o nacionalismo no Oriente Médio." "Israel, ao menos, era uma área que havia existido, conhecida como Israel ou Palestina", afirmou. "A Jordânia sempre foi parte da Síria, de Israel, da Arábia Saudita ou do Iraque, mas nunca havia existido antes."
De acordo com Gleis, entre os focos de tensão atuais da região são resultado da Primeira Guerra o conflito étnico em Israel --entre israelenses e palestinos--; no Iraque, entre sunitas, xiitas e curdos; no Líbano, que era parte da Síria, e foi criado pelos franceses para proteger os cristãos da região; e na Jordânia, cuja maioria da população é palestina.
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