Política não é ambiente de pureza, diz Eduardo Paes
Aos 20 minutos da entrevista à Folha, na última sexta-feira (5), o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), 42, pediu licença para fumar uma cigarrilha e solicitou ao fotógrafo que não registrasse a cena.
O hábito adquirido do ex-presidente Lula, aliado desde 2008, havia sido abandonado no ano passado. Foi retomado na campanha deste ano.
"Por que prefeito? Fica ansioso?", pergunta o repórter. "Talvez... Não posso fazer campanha o tempo todo", responde Paes.
Diferente do aliado Sérgio Cabral (PMDB), que não pôs o pé na rua para sua campanha à reeleição ao governo do Estado --alegou à época problemas no joelho, após semanas sem aparecer --, Paes não se poupou.
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Eduardo Paes é reeleito prefeito do Rio de Janeiro no 1º turno
Daniel Marenco/Folhapress | ||
Prefeito reeleito do Rio, Eduardo Paes, posa para foto durante entrevista à Folha em seu gabinete |
Fez agenda de candidato todas as noites. Visitou favela, casa de artista na zona sul, fez reunião com evangélicos. Nenhuma divulgada à imprensa. Só anunciava os compromissos dos finais de semana.
Na maioria das vezes eram carreatas nas zonas oeste e norte. Desfilava em carro aberto com dezenas de cabos eleitorais correndo a frente, tocando a campainha da casa de eleitores e distribuindo bandeiras e panfletos para verem o candidato.
Numa das agendas, foi abordado por um membro da comitiva, após horas de corpo a corpo, espantado com tanto empenho. "Você está em último nas pesquisas?".
"Para uma pessoa que gosta de fazer campanha como eu, que sempre foi muito disciplinado, saia na rua todo o dia, fazia 500 reuniões independente da quantidade de pessoas, é difícil", disse ele na entrevista, na sede administrativa da prefeitura, no centro, sobre como fazia para conciliar a agenda de prefeito e candidato.
A aprovação de 87% do eleitorado ao seu governo, detectada pelo Datafolha ao fim de agosto, não conteve o prefeito no gabinete. A votação recorde de 64,6% dos votos válidos deve retê-lo por mais quatro anos no comando do município, resistindo ao provável assédio para tentar o Palácio Guanabara em 2014.
"Não há hipótese [de sair para disputar o governo]. Vou entregar a bandeira olímpica como fui pegar em Londres", repetiu ontem após a vitória.
Casado com a arquiteta Cristiane, 34, e pai de dois filhos (Bernardo, 8, e Isabela, 7), Paes é irrequieto. Dorme cerca de cinco horas por dia, raramente atrasa reuniões e tem reações explosivas a contestações.
POLÍTICA NÃO É PUREZA
Foi assim, por exemplo, que reagiu à divulgação, pelo site da revista "Veja", do vídeo no qual Jorge Esch, presidente estadual do PTN, dizia ter ouvido de seu coordenador de campanha, Pedro Paulo, promessa de R$ 1 milhão pelo apoio da sigla nanica. Irritou particularmente ao prefeito o título da matéria: "mensalão de Paes".
"Não aceito ataque à minha honra. Porque essa coisa de ética na política é importante para mim. Porque política para mim foi opção. Eu andei para trás sob o ponto de vista material. Sou um filho da classe alta carioca, que tinha todas as oportunidades da vida e resolvi entrar na política. Não acumulei patrimônio. Viajava para a Europa e deixei de viajar para lá. Deixei de frequentar Angra dos Reis. [...] Não gosto desse jogo de vulgarização da delinquência na política. É muito ruim", disse ele, que afirma ser o "maior interessado" na investigação aberta pelo Ministério Público Eleitoral.
Paes diz que apoiou a sigla com material de campanha. E reconhece que alguns dos seus aliados se juntaram à sua candidatura apenas em busca dos panfletos e placas financiados pelo PMDB.
"Não negocio apoio em troca de espaço em governo e delinquência em governo. Na discussão com os partidos tratamos de apoio material. Mas tudo dentro da lei. As pessoas tomam decisões pragmáticas na vida. Alguns partidos me apoiaram porque eu era favorito. Não tem pecado nisso. Na política tem gente pragmática. Não se está lidando num ambiente de pureza. Está lidando no ambiente da política. Se eu não fosse o favorito, não agregaria em torno de mim 20 partidos. Não vou entregar meu governo para eles. Se podem somar voto, por que vou recusar apoio?", disse Paes.
O prefeito passou os três anos e dez meses de primeiro mandato sem protagonizar escândalos. Quando foi acusado de comprar, para construir casas populares, terreno de empresa de doadores de campanha, cancelou a operação e pediu avaliação judicial do imóvel.
Ele reconhece como erro político a nomeação do ex-ministro Carlos Lupi (PDT) a cargo comissionado em seu gabinete logo depois de o aliado ser demitido do Ministério do Trabalho sob suspeita de irregularidades em contratos com ONGs.
Servidor concursado do município, ele teria de se reapresentar à Secretaria de Assistência Social. Foi nomeado para fazer "a interlocução com Brasília". Paes diz que queria lhe dar "status".
"Estava olhando para um ex-ministro, presidente de partido. Não pesei de maneira adequada o fato de ele ter saído do governo da Dilma por um escândalo. Pensei: 'Um ex-ministro, uma figura representativa, vai voltar para um Centro de Assistência Social da prefeitura em Santa Cruz?' Pelo lado mais humano, sem avaliar a dimensão política, nomeei ele assessor do meu gabinete para dar um status. Foi uma falha. Mas o problema é quando se insiste no erro", disse Paes, que exonerou Lupi assim que o caso foi divulgado pela Folha.
SECRETARIADO
Ao formar o secretariado, lotou em pontos chaves quadros técnicos, como na Saúde, Educação e Fazenda. Nesta última, escolheu Eduarda La Rocque, em 2008 eleitora de Fernando Gabeira (PV). Atualmente no IPP (Instituto Pereira Passos), ela foi uma das principais responsáveis pelo canteiro de obras que se tornou a cidade.
A gestão Paes atingiu em 2011 taxa de investimento de 17,9% --percentual dos recursos usados em obras em relação ao total gasto pelo município. Em 2009, era de 3%.
A campanha do prefeito teve como trunfo a união entre os governos federal, estadual e municipal. Mas as transferências de verbas não aumentaram significativamente em comparação ao último ano da gestão César Maia (DEM). A média anual dos repasses não obrigatórios ficou em R$ 121 milhões, abaixo dos R$ 143 milhões em 2008.
Além do aumento da arrecadação de impostos, o principal motor financeiro da prefeitura foi o empréstimo de US$ 1 bilhão do Banco Mundial. Com os recursos, o Rio pagou parte de dívida com a União, reduziu os juros sobre o restante, e economizou a partir de agosto de 2010 até fim de 2011, R$ 585 milhões segundo a Prefeitura.
Os recursos ajudaram a prefeitura a atingir R$ 3,3 bilhões em investimento no ano passado. A complicada operação financeira, porém, não teve um segundo na propaganda eleitoral.
O principal apoio da União aos projetos de Paes se deu por meio de bancos públicos. O BNDES autorizou financiamento de R$ 1,2 bilhão para a construção da via Transcarioca --o que representa 74% do custo total. A Caixa Econômica Federal comprou, através de fundo de investimento com recursos do FGTS, todos os títulos imobiliários da zona portuária, que financia a revitalização da região.
A maior parte das obras olímpicas de responsabilidade municipal tem recursos disponíveis ou já estão em andamento. Paes conseguiu que parte dos equipamentos para que os Jogos Olímpicos fossem erguidos com recursos privados.
Com a folga orçamentária, construiu equipamentos de saúde e educação por toda a zona oeste. Os canteiros, apoiados num gasto de mais de R$ 150 milhões em publicidade em quatro anos --quase inexistente na gestão Maia--, consolidou sua popularidade na região mais pobre.
As marcas criadas na sua gestão, como Clínica da Família (postos de saúde), EDIs (creches) e BRTs (corredores exclusivos de ônibus), passaram, com a divulgação e obras concluídas, a fazer parte da discussão política no Rio.
Todas estão concentradas nas zonas oeste e norte. O Parque Madureira, onde comemorou no domingo a vitória, simbolizou em sua campanha a prioridade que deu em obras ao subúrbio.
VITÓRIA EM TODA A CIDADE
O peemedebista inverteu o cenário eleitoral da capital. Desde 1996, quando é possível analisar voto por zonas eleitorais, o prefeito eleito sempre apresentou a maior força na zona sul, área dos moradores mais ricos, segundo o livro "A geografia do voto", do cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC-Rio. Em 2008, Paes mudou o cenário ao bater Fernando Gabeira (PV) ignorando os eleitores da beira-mar.
Repetiu o feito esse ano. Na zona oeste atingiu 71% dos votos válidos. Mas venceu também na zona sul, onde obteve 51% dos votos válidos.
"A classe média começa a ter mais conhecimento do governo no processo eleitoral. Os mais pobres não. Estou convencido de que os mais pobres são mais informados [sobre as ações do governo]. Como eles dependem do serviço público..."
Filho de família rica, Paes declarou redução de patrimônio apesar do lucro obtido com a venda de cinco salas de que era proprietário em 2008. Diz que o salário de prefeito, R$ 13 mil, "é uma merreca", e mal dá para pagar as contas.
"Para o meu padrão de vida como prefeito do Rio é muito baixo. Não é um tema que eu queira perder tempo tratando, mas só dá para pagar as contas porque vivo numa casa oficial, não tenho despesas do lar. Tenho dois filhos, tenho uma vida de classe média alta. Não é barato colégio, curso de filho. Política para mim foi opção. Algumas pessoas emergem com a política. Eu não emergi com a política. Não mudei meu status de vida. Ao contrário", disse.
Um dos principais cabos eleitorais do Rio em 2014, Paes nega que vá sair da prefeitura para concorrer ao governo do Estado. Apoia o nome do vice-governador, Luiz Fernando Pezão, para encabeçar a chapa, mas diz ser "um luxo" contar com a opção do senador Lindbergh Farias (PT).
Permanecendo até 2016, terá de esperar por dois anos a próxima eleição. Ele diz não fazer planos, mas afirma ter uma opção. Estudar em alguma universidade norte-americana por um ano.
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