Persistência leva alunos de escola pública de SP à COP28 com iniciativa contra efeito estufa

Grupo foi convidado em campanha da Unesco para mostrar projeto que envolve microalgas

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Rio de Janeiro

Com poucos recursos, alunos de uma escola pública de São Carlos, no interior de São Paulo, improvisaram ferramentas e pegaram materiais emprestados para construir um projeto de combate às mudanças climáticas com microalgas, organismos capazes de reduzir o efeito estufa.

A iniciativa fez com que os estudantes, da Escola Estadual Professor Sebastião de Oliveira Rocha, fossem selecionados em uma campanha da Unesco que leva escolas para a COP28 (conferência do clima da ONU), em Dubai.

"Esse tipo de iniciativa já é feita largamente nas universidades pelo mundo. A nossa inovação foi trazer uma pesquisa que é de alto gabarito para a escola pública", diz Gustavo Batista, 17, aluno da 3ª série do ensino médio que coordena a equipe.

imagem mostra vidros de laboratório transparentes irradiados por uma luz amarela, rosa, vermelha e azul
As algas são cultivadas sob uma luz específica que gera a fotossíntese - Divulgação

O projeto foi desenvolvido por estudantes de um dos clubes juvenis do colégio, que, por ser em tempo integral, tem agremiações dedicadas a diferentes áreas do conhecimento, incluindo artes e ciências.

Segundo Milene de Oliveira, professora de química da escola e orientadora do clube que está na COP28, os alunos viram a necessidade de fazer um projeto relacionado às mudanças climáticas. Eles mesmos buscaram possibilidades a serem adotadas pelo grupo, até encontrarem as microalgas.

Esses organismos são capazes de reduzir o gás carbônico, responsável pelo aumento do efeito estufa que eleva a temperatura do planeta, no ar. De acordo com Milene, a capacidade das microalgas em absorver carbono é maior do que a de árvores em crescimento.

Os alunos fizeram o cultivo das algas em aquários, com luzes artificiais para gerar a fotossíntese, processo que reduz o carbono no ar. As algas foram sendo "alimentadas" com uma espécie de fertilizante.

Os materiais usados para construir o sistema, como bombinhas de aquário e canos de plástico, são simples. Até mesmo o primeiro protótipo de luz artificial foi feito de maneira artesanal pelo pai da professora Milene.

De acordo com ela, o destaque do projeto foi a proatividade dos alunos. "Eu trabalhei junto com o grupo, mas a maior parte do que fizemos foram eles que trouxeram até mim, de tamanho protagonismo que eles têm."

Imagem mostra alunos mexendo com equipamentos da pesquisa. Eles usam um uniforme verde escuro que sinaliza a equipe. Sobre a mesa, é possível ver um aquário com água verde, onde as algas estão armazenadas. Eles também tem um microscópio e um laptop sobre a mesa.
Alunos da Escola Estadual Professor Sebastião de Oliveira Rocha, em São Carlos (SP), cultivam algas capazes de absorver gás carbônico - Célio Messias/EducaçãoSP

Os estudantes foram atrás de parcerias com outras instituições para viabilizar a pesquisa. Eles conseguiram, por exemplo, amostras de microalgas com a UFSCar (Universidade Federal de São Carlos). Parte dos aquários foi dada pelo Instituto de Química da USP de São Carlos.

Cientistas das instituições parceiras também fizeram orientações sobre a parte técnica do projeto e um deles, o professor da USP Tadeu Malheiros, sugeriu a inscrição da iniciativa na COP. Segundo Gustavo Batista, aluno e coordenador do grupo, a escola foi uma das selecionadas entre 300 candidaturas de todo o mundo.

A equipe buscou maneiras de viabilizar a viagem a Dubai depois da aprovação pela Unesco. No fim, eles conseguiram financiamento da Finep (Financiadora de Estudos e Projetos), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Na preparação para a palestra na COP28, ganharam bolsa integral para fazer aulas intensivas de inglês por um mês em um curso de idiomas privado em São Carlos (SP). Além das atividades da Unesco, está prevista apresentação no pavilhão do Brasil e no hub da USP.

"Tem sido muito difícil essa preparação, porque a nossa realidade é outra. Mas a gente sempre fez com muita determinação e acreditando que tudo daria certo. O segredo foi a nossa persistência", diz o aluno Gustavo Batista.

A escola construiu o projeto pedagógico com planos de ação para educação ambiental, segundo a diretora Lucinei Tavoni. Ela diz que, neste ano, tirou inspiração na ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, para falar sobre a necessidade de ser "sustentabilista" com os alunos, termo usado no primeiro discurso de Marina como chefe da pasta.

"É preciso formar uma nova geração de pessoas conscientes de como precisamos do meio ambiente para sobreviver. Nós incorporamos isso e elaboramos ao longo deste ano na escola várias ações nesse sentido, até mesmo fortalecendo os clubes de ciências", afirma.

O colégio tem outras iniciativas nessa área, incluindo um biodigestor que usa resíduos descartados na merenda para produzir biogás. No ano passado, esse projeto venceu o Solve For Tomorrow, prêmio da Samsung que reconhece iniciativas de destaque em escolas públicas.

Se a gente continuar produzindo estudos que vão parar nas nossas bibliotecas e ninguém usa, é muito ruim. Esses diálogos permitem desenvolver pesquisas aplicadas que vão para a vida real. Neste caso, para os produtos educacionais

Tadeu Malheiros

Professor de engenharia da USP de São Carlos

Para Malheiros, professor de engenharia da USP que lidera a equipe que apoiou os alunos no estudo das microalgas, a cooperação entre colégios e universidades é um fator importante para promover impacto social e incentivar jovens a seguir carreira na ciência.

Ele coordena uma pós-graduação voltada para professores da educação básica sobre ensino de ciências ambientais. Por meio desse programa, pesquisadores da USP também colaboram com escolas para desenvolver atividades práticas e educativas.

"Se a gente continuar produzindo estudos que vão parar nas nossas bibliotecas e ninguém usa, é muito ruim. Esses diálogos permitem desenvolver pesquisas aplicadas que vão para a vida real. Neste caso, para os produtos educacionais", diz.

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