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Professora da USP, jornalista e psicóloga, é autora de "Atletas Olímpicos Brasileiros"

O esporte e a imortalidade

Kobe Bryant foi um dos poucos atletas que se tornaram imortais

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Mais de uma vez atestei a capacidade de alguns atletas de se tornarem imortais. Essa condição rara se deve exclusivamente ao fato de terem realizado um feito fora da média. Embora pareça simples, essa conquista é prerrogativa de poucos, tão poucos que é capaz de caber em um caderno espiral pequeno, desses que constam em toda lista de material escolar no princípio do ano letivo.

Embora o presente seja pródigo em nomes que frequentam os noticiários televisivos, as redes sociais ou as capas dos jornais, a imortalidade depende de muito mais do que um gol salvador nos acréscimos do segundo tempo, uma cesta de três pontos quando todos são levados a crer no empate ou um ace salvador depois de muitos pontos e um resultado persistente.

A imortalidade, para um atleta, é construída em um processo longitudinal. Envolve muitos anos de atividade, derrotas tão inesquecíveis quanto as vitórias em finais de campeonato e títulos improváveis até para os mais crédulos torcedores. Ou seja, o esporte nada é, e nada seria, sem o atleta, esse ser capaz de impor com sua habilidade o limite da humanidade.

Há tempos, ele é capaz de alcançar a eternidade, ao chegar próximo da perfeição com um gesto único, realizando aquilo que a maioria dos mortais nem sequer imaginaria ousar.

O atleta se afirma como imortal ao longo de sua trajetória, e não apenas em um único gesto. A construção de uma trajetória que se consagra muito mais como périplo do que como carreira colabora para esse imaginário heroico.

A vida e a morte de Kobe Bryant demonstram isso. Embora afastado das competições há quatro anos, seus feitos e suas conquistas ainda permanecem na memória afetiva e cognitiva não apenas dos torcedores do Los Angeles Lakers mas também de todos os amantes do basquetebol e do esporte.

Habilidoso desde os tempos de colégio, ele passou pelo “vestibular” da profissionalização do basquete americano sendo um dos calouros mais disputados de sua geração.

Kobe Bryant em ação pelos Lakers - Jerome Miron - 10.abr.16/USA TODAY Sports

Outros aspirantes também chegaram à NBA como candidatos a ídolos, porém não tiveram a longevidade, nem as conquistas de Kobe Bryant. Sua aposentadoria afirmou sua transcendência, levando-o a ser lembrado por suas conquistas, e não pelo calvário que acompanha aqueles que desejam tirar do corpo aquilo que já não é mais possível.

Afinal, como cantou Pablo Milanés, o tempo é implacável com o que passou. O tempo, e somente ele, transforma o ídolo esportivo momentâneo, forjado nas redes sociais e no trabalho de agentes de comunicação, em herói. Para usufruir dessa condição não basta querer, é preciso ser. E isso se dá a partir de ações, não de promessas.

Kobe construiu sua carreira com habilidade motora e atitude. A excelência, valor moral tão caro à cultura americana, sempre foi sua meta. 

Nomeou-a como “mentalidade mamba” e, a partir de então, afirmou como atitude um estilo que transcenderia as quadras e se tornaria sua marca para além delas. Coisa de gênio. Genial em quadra, espetacular por manter-se em alta depois da transição de carreira, momento em que 
o atleta precisa se reinventar.

Gostar de esporte é uma atividade que envolve consciência do diverso e conhecimento do específico. A morte prematura de um humano que arrebata multidões, como foi Kobe Bryant e outros atletas, atesta isso. A comoção pela perda de uma pessoa que parece ser muito mais próxima a nós do que realmente é demonstra a capacidade que o esporte tem de entrar em nossas vidas sem pedir licença ou permissão. O atleta é o astro que provoca a emoção que arrebata, invade e fim.

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