A carta em defesa da democracia, escrita por um grupo de ex-alunos da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, tem sido alvo de ataques informáticos. Ela está disponível para ser subscrita online, mas alguns heróis, não querendo que a carta chegue ao seu destinatário, que é o povo brasileiro, têm tentado boicotá-la.

É uma carta a favor da democracia e, para mim, todos os que atentam contra a democracia são heróis. Na democracia, quem tem o poder é o povo, que somos todos nós. Logo, todos os que são contra a democracia desejam deixar de exercer o poder. São pessoas abnegadas e humildes.

Sendo inimigos da democracia, são inimigos de si mesmos. Portanto, são inimigos dos inimigos da democracia. O que significa que são amigos da democracia. Acho eu. Entretanto, fiquei com dor de cabeça.

Mas mantenho que há algo de admirável em quem se bate contra a democracia. É como se admitisse: eu não saberia exercer o poder, não tenho jeito para decidir, iria com certeza votar na pessoa errada. É provavelmente por isso que pretende derrubar o sistema. Mais vale ser uma pessoa só a decidir do que um conjunto de babacas iguais a mim, pensará o antidemocrata.

E a tenacidade do antidemocrata revela ainda um amor convicto à ditadura. Os democratas não conseguem viver como desejam numa ditadura. Mas, para um antidemocrata, não é difícil viver numa democracia como se estivesse numa ditadura: ninguém o impede de não ir votar; se lhe apetecer estar preso, fecha a porta da casa à chave; tendo saudades da polícia política, pode pedir a um amigo que o torture; querendo experimentar a censura, não compra jornais. Mas ele pretende impor o seu regime preferido aos outros, mesmo podendo saboreá-lo sozinho. E por isso fará tudo para derrubar a democracia.

Bem, na verdade, isso era o que faziam os antidemocratas do meu tempo. Estes contentam-se com tentar boicotar a subscrição de uma carta na internet. De fato, os antidemocratas estão cada vez piores. O que significa que estão cada vez melhores.