Café na Prensa

Tudo sobre a bebida, do grão à xícara

Café na Prensa - David Lucena
David Lucena
Descrição de chapéu Agrofolha alimentação

Café catado das fezes do jacu é bom, mas sabor não justifica o preço

Valor vai além da questão sensorial e envolve aspectos como excentricidade e produção limitada

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Domingos Martins (ES)

Quando as pessoas conhecem a história do café do jacu e descobrem o valor que a iguaria custa, logo perguntam: "vale a pena"?

Como o Café na Prensa mostrou, o Jacu Bird Coffee é um café produzido na fazenda Camocim, no município de Domingos Martins, bem perto da famosa Pedra Azul, nas montanhas capixabas, a partir de grãos defecados pelo jacu, uma ave silvestre, e o pacotinho com apenas 100 g custa R$ 118.

Para entender o preço, é preciso analisar outras variáveis que não apenas o sabor.

Primeiro, há um storytelling exótico, e as pessoas amam uma boa história. Ricos estão dispostos a pagar caro por todo tipo de excentricidade gastronômica.

Ave jacu em meio ao cafezal
Ave jacu é flagrada em meio ao cafezal na fazenda Camocim, no Espírito Santo - David Lucena/Folhapress

Além disso, como as aves não são mantidas em cativeiro, a produção depende do quanto os jacus que vivem na região da fazenda vão comer e defecar –e mais, o quanto dessas fezes serão efetivamente localizadas pelos funcionários da fazenda.

Logo, a combinação da excentricidade com a limitação natural da produtividade explica o preço.

O Café na Prensa experimentou o café a convite do produtor. De fato, a bebida tem baixo amargor e sabor bastante agradável. Mas a própria fazenda produz cafés melhores, mais complexos e com notas mais frutadas do que seu grão mais famoso.

É que a região das montanhas capixabas, como mostrou o Café na Prensa, tem condições geoclimáticas muito favoráveis ao cultivo de café de alta qualidade. Logo, se houver um cuidado no cultivo, na colheita e no processamento, é possível produzir cafés excelentes, independentemente de ter sido ingerido e defecado pelo jacu.

Prova é que a fazenda Camocim já foi premiada em importantes concursos de qualidade por outros grãos que não o do jacu.

Um dos argumentos mencionados para a alta qualidade do café é que o jacu só se alimenta dos melhores frutos, aqueles que já estão bem maduros. Assim, com essa seletividade feita pela ave, o café já teria um potencial maior.

Ocorre que este trabalho pode ser feito de maneira ainda mais precisa por seres humanos. Há fazendas nas montanhas capixabas que fazem uma colheita seletiva tão meticulosa que o agricultor chega a passar mais de 10 vezes por safra em um mesmo pé de café, a fim de colher somente os frutos que estão em perfeito estado de maturação.

Ademais, há uma oferta cada vez maior de cafés fermentados, que proporcionam sabores exóticos à bebida sem que os grãos precisem passar pelo sistema digestivo de nenhuma ave.

Porém, há que se reconhecer a origem sustentável do processo. Tudo começou quando as aves começaram a causar problemas para a plantação, uma vez que comiam os frutos e até destruíam galhos de cafeeiros.

Então, em vez de tentar lutar contra os animais e expulsá-los do seu habitat natural, a fazenda decidiu se inspirar no café que era produzido na Indonésia a partir das fezes da civeta –um pequeno mamífero– e, assim, tirar proveito da situação e elaborar um café exótico e com alto valor comercial.

Em suma, se você tem condições financeiras e quer experimentar o exótico café do cocô do jacu para ter uma história para contar na mesa de bar, vale a pena, pois certamente você tomará um bom café.

Mas se você se interessa apenas pelo sabor e busca um café com notas frutadas e bastante doçura e acidez, o mercado está cheio de opções muito mais baratas e melhores –algumas inclusive produzidas na mesma região, quiçá na mesma fazenda.

Acompanhe o Café na Prensa também pelo Instagram @davidmclucena e pelo Twitter @davidlucena

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