O Mundo É uma Bola

O Mundo É uma Bola - Luís Curro
Luís Curro
Descrição de chapéu Futebol Internacional Judô

Medalha é medalha, mas umas valem mais, no íntimo, que outras

Tem aquela que vem depois de o atleta brilhar e/ou se exaurir; e aquela, olímpica incluída, que ele ganha sem ter feito nada

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Menos de três semanas depois de ter sido apresentado pelo Real Madrid, Endrick, 18, ganhou seu primeiro título.

Em partida na Polônia, o Real Madrid, novo time do ex-palmeirense, derrotou o Atalanta por 2 a 0 e faturou a Supercopa da Europa.

Esse confronto opõe o vencedor da Champions League (Real Madrid) e o ganhador da Liga Europa (Atalanta), que é o segundo interclubes em importância na Europa.

Os gols do gigante madrilenho foram do uruguaio Valverde e do francês Mbappé, ex-Paris Saint-Germain, que fazia sua estreia pelo Real.

O que Endrick fez? Nada. Assistiu ao jogo inteiro do banco de reservas, já que o treinador Carlo Ancelotti decidiu não recorrer a ele.

Apito final dado, título assegurado, o camisa 16 comemorou, felizão, no gramado com os companheiros, entre eles os compatriotas Vinicius Junior, Rodrygo e Éder Militão, todos titulares nessa decisão.

Sorrindo e com uniformes brancos, Endrick e Mbappé, do Real Madrid, medalha no peito e troféu na mão, comemoram em Varsóvia (Polónia) a conquista da Supercopa da Europa sobre o Atalanta
Endrick (esq.) e Mbappé, medalha no peito e troféu na mão, comemoram em Varsóvia (Polónia) a conquista da Supercopa da Europa, na vitória do Real Madrid sobre o Atalanta - Jennifer Lorenzini - 14.ago.2024/Reuters

Endrick recebeu sua medalha dourada, admirou-a, manteve-a pendurada no pescoço e, troféu entregue, segurou-o e posou para fotos com ele, inclusive ao lado de Mbappé,

E tudo bem. Endrick foi relacionado, gostaria de ter jogado, não pôde porque o técnico não quis. A medalha será guardada em algum lugar, talvez exposta junto com outras que o atacante tenha –colecionou algumas na ainda curta carreira.

Aí, quando for mostrar as láureas para alguém da família, para algum amigo, explicará: "Esta é a do meu primeiro título com o Real Madrid, a da Supercopa europeia de 2024". E o interlocutor, curioso, dirá: "Legal. E o que você fez nesse jogo?". E Endrick falará: "Nada. Nem joguei".

Medalha é medalha, mas algumas possuem uma história bem mais significativa, bem mais empolgante, que outras. Detêm um valor muito maior, pelo contexto em que são conquistadas.

São aquelas que vêm depois de uma grande atuação, seja em uma final, seja em um campeonato todo, quando o conjunto da obra consagra e satisfaz o jogador.

Mostrando a medalha do título do Brasileiro de 2023, no qual brilhou pelo Palmeiras, Endrick poderá dizer que esteve longe de fazer nada: "Marquei 11 gols, fui o artilheiro do time. Joguei muito". Jogou mesmo.

A medalha de Endrick no Real Madrid lembrou-me do judô brasileiro nas Olimpíada de Paris. A equipe nacional, na competição mista, obteve uma inédita medalha de bronze.

Formado por dez judocas, cinco homens e cinco mulheres, o time brasuca ganhou três confrontos (Cazaquistão, Sérvia e Itália) e perdeu um (Alemanha) no caminho do pódio.

Os judocas do país, nessa jornada, participaram, ao todo, de 25 combates. Oito atletas foram ao tatame e lutaram pelo menos uma vez. Dois, não. Só olharam.

Por decisão do comando técnico, Guilherme Schimidt e Larissa Pimenta não foram escalados para nenhum confronto. Mesmo assim, na entrega das medalhas, estiveram no pódio, sorridentes, recebendo o bronze.

Equipe mista de judô do Brasil, formada por dez atletas, sendo cinco homens e cinco mulheres, mostram as medalhas de bronze conquistadas nas Olimpíadas de Paris
Guilherme Schimidt e Larissa Pimenta (mais à direita, agachados) com as medalhas de bronze que ganharam sem pisar no tatame na disputa de equipes mistas nas Olimpíadas de Paris - Kim Kyung-Hoon - 3.ago.2024/Reuters

Que disparidade para Larissa. Ela, que é da categoria até 52 kg, seis dias antes obteve um bronze dificílimo, suado, chorado, indo ao tatame cinco vezes e ganhando quatro lutas. O segundo veio de mão beijada, sem esforço algum.

Será que as medalhas de bronze têm alguma distinção física entre elas, como a data da conquista? Se não, como Larissa fará para diferenciar uma da outra? Pois a diferença é enorme. A primeira veio no sufoco; a segunda, no mole.

Larissa poderá dizer que as duas têm o mesmo resplendor, já que do mesmo metal e ganhas nos mesmos Jogos Olímpicos, mas no íntimo sabe que uma é mais valorosa, pois tem muito mais história (cinco capítulos, com ela, Larissa, protagonista de todos) para contar.

A situação de Schimidt beira o nonsense. Longe do pódio na categoria até 81 kg (uma vitória, uma derrota), exibirá para si ou para outrem o seu bronze. E dirá, solene: "Sou medalhista olímpico". E emendará, reflexivo: "O que fiz para sê-lo?". E concluirá, resignado: "Absolutamente nada".

Schimidt tem o mesmo bronze de Paris-2024 que, por exemplo, Alison dos Santos, o Piu, "se matou" para conseguir nos 400 m com barreiras. O descompasso é gritante.

Enfim, fruto do muito ou fruto do nada, medalha é medalha. No entanto, no futebol ou no judô, que umas valem mais que outras, mesmo sendo da mesma cor, do mesmo peso, da mesma competição, ah, isso valem.

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