Bernardo Guimarães

Doutor em economia por Yale, foi professor da London School of Economics (2004-2010) e é professor titular da FGV EESP

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Punir bem pode requerer punir pouco

Decisões de juízes e tribunais afetam sua própria autoridade

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Eleições, leis, decisões do Executivo e do Judiciário só afetam o que acontece no mundo porque pessoas acreditam que elas afetam o que acontece no mundo.

À primeira vista, essa observação pode parecer estranha. Afinal, eleições determinam governantes e deputados. Medidas de estímulos direcionam bilhões de reais coletados das pessoas às empresas beneficiadas. Emendas parlamentares mandam recursos aos locais escolhidos pelos deputados. Decisões de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) levam forças policiais a apreenderem documentos e prenderem pessoas.

Tudo isso parece acontecer de forma quase automática. Em geral, não precisamos pensar como eleições e atos dos poderes estabelecidos se fazem valer.

Sessão solene de Reabertura do Ano Judiciário no STF (Supremo Tribunal Federal) - Pedro Ladeira -1º.fev.24/Folhapress

Mas por trás de qualquer medida, há alguém que escolhe executar. Não há forças extraterrestres garantindo o poder de eleições, leis e decisões judiciais. Tudo depende da ação de outras pessoas.

Por exemplo, policiais seguem as ordens de seus superiores por acreditarem que sofrerão consequências se não os obedecerem. Os chefes da polícia acreditam que devem acatar e executar as decisões dos tribunais, pois caso contrário, serão, de alguma forma, punidos. Assim, decisões de juízes e de ministros do STF viram atos.

Em sistemas que funcionam perfeitamente, essas observações parecem estranhas à primeira vista e são pouco relevantes na prática. Eleições e decisões dos poderes estabelecidos se fazem valer e nem passa pela nossa cabeça que poderia ser diferente.

Às vezes, essas questões passam a ter relevância.

Várias notícias recentes tocam nessa questão.

A primeira foi a suspensão das multas à Odebrecht pelo ministro do STF Dias Toffoli, que já havia tomado decisões parecidas antes.

Nos idos de 2016, a Operação Lava Jato mostrava seu poder com inúmeras delações e acordos de leniência, diversas prisões de políticos e grandes empresários e multas bilionárias.

Recentemente, condenações e multas foram anuladas. Por que isso demorou tanto? Analisar tecnicamente os casos requereria tanto tempo?

Pode ser. Mas parece que era mais custoso ir contra a Lava Jato em 2016.

Em parte, isso se dava porque a opinião pública afeta interesses de quem precisa de voto nas eleições, e a operação era extremamente popular antes de políticos como Lula serem presos (e de personagens centrais se tornarem ministro no governo Bolsonaro ou candidatos ao legislativo). E em parte, podemos presumir, porque quanto mais gente com poder se quer punir, menos gente sobra com interesse de executar a punição.

Portanto, é possível que paradoxalmente, se menos gente tivesse sido condenada, mais condenações existiriam hoje – independentemente do mérito jurídico das condenações. Apenas porque haveria mais interesse em manter as punições, ou menos força para anulá-las.

A segunda envolveu o Ministro Alexandre de Moraes, o ex-presidente Jair Bolsonaro e reuniões sobre golpe de Estado.

Há questões jurídicas sobre o que constitui crime e quem infringiu a lei.

Um argumento que ouço com frequência é que generais e deputados que sabiam das reuniões e não denunciaram ou agiram ativamente para expor o que acontecia têm culpa.

A meu ver, como no caso anterior, querer punir demais é caminho seguro para não haver punição.

Por fim, tem-se discutido porque um golpe não aconteceu. Uma explicação sugerida por muitos é que países estrangeiros reconheceriam como presidente quem fosse declarado vencedor pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O chefe é quem a gente acha que deve obedecer. Se o mundo exterior não acredita que você é presidente, você não é.

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