Certa vez um jornalista foi entrevistar Harry Craddock no American Bar do Hotel Savoy de Londres. Ao longo da conversa, o bartender, tido como o mais importante do século 20, criou três coquetéis. Era algo que fazia com a leveza de um Fred Astaire.
Inventou cerca de 240 coquetéis na sua longa carreira, que começou nos Estados Unidos, para onde se mudou ainda jovem. Lá, trabalhou em Cleveland, Chicago e Nova York, na famosa Hoffmann House. Diz a lenda que preparou o último drinque antes do apagar das luzes da Lei Seca, que durou de 1920 a 1933, deixando os sobrinhos de Tio Sam órfãos de martinis e manhattans.
Craddock não quis esperar pelo sucesso dos speakeasies, bares clandestinos e portanto mais rentáveis, para os quais afluíam jornalistas, escritores e músicos. Nunca se bebeu tanto nos EUA como nesse período, mas ele preferiu voltar para sua terra natal, onde as libações eram livres.
Tranquilo, sem ter de se preocupar com batidas policiais, foi galgando posições até se tornar o barman chefe do Savoy. Foi lá que juntou mais de duas mil receitas de misturas alcoólicas. Uma seleção delas compôs o livro de drinques do hotel, que se tornou uma referência mundial, sendo consultado até hoje.
Lançado em 1930, o "Savoy Cocktail Book" vinha com design art déco, receitas refinadas e algumas frases espirituosas. Uma delas refere-se à arte de usar a coqueteleira: "É importante bater com vigor —você quer acordar a bebida, não botá-la para dormir!".
Outro conselho diz: "Beba assim que possível, enquanto o coquetel está sorrindo para você". Um terceiro, mais curioso: "Se sua garota não gostar do drinque, não beba! Jogue-o fora no primeiro vaso de flores que encontrar".
Craddock ficou conhecido também pelo white lady. O clássico da mixologia foi emparedado no American Bar, dentro de um shaker —um gesto à Edgar Allan Poe, mas com sinal trocado. O Savoy, a propósito, faz 132 anos nesta sexta-feira (6). O drinque continua lá, esperando ser bebido por um arqueólogo do futuro.
Antes de Craddock, a dona do pedaço era Ada Coleman, barwomam carismática que passou quase 25 anos encantando a clientela do hotel. Numa noite podiam aparecer Charlie Chaplin, Mark Twain ou Ava Gardner.
Segundo o historiador da coquetelaria Ted Hughes, Coleman, criadora do ótimo hanky panky, era "não apenas uma pioneira num meio masculino, mas a responsável pela fama do American Bar do Savoy".
Com as décadas, as mulheres conquistaram espaço atrás dos balcões. Mas ainda sofrem com o machismo. Para Thatta Kimura, 36, bartender com passagem pelo Fel, um dos melhores bares de São Paulo, "aumentou o número de mulheres bartenders de dez anos para cá, porém a remuneração continua menor do que a dos homens. Além disso, precisamos trabalhar mais, para convencer o cliente e o empregador. Sem contar o assédio, ainda muito frequente".
Kimura é uma das fundadoras do Coletivo Ada Coleman (@coletivoadacoleman), que, entre outras atividades, arrecada dinheiro para colegas do Brasil inteiro em situação de vulnerabilidade. As cinco parceiras querem agora criar uma escola para profissionais do ramo.
Fazem pensar na valentia das atletas brasileiras que iluminaram as Olimpíadas. Por isso, vamos de Olympic, coquetel que está nas páginas do livro do prestigioso Savoy.
E que venham as Paralimpíadas!
OLYMPIC
- 30 ml de conhaque
- 30 ml de licor de laranja
- 30 ml de suco de laranja
Passo a passo
Bata os ingredientes com gelo e coe para uma taça coupe previamente gelada. Decore com uma casca de laranja.
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