Daniel E. de Castro

Jornalista especializado na cobertura de esportes olímpicos. Foi repórter e editor de Esporte da Folha e cobriu os Jogos de Tóquio

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Daniel E. de Castro
Descrição de chapéu Olimpíadas 2024

Choro de atletas nos Jogos Olímpicos comove e mostra que evoluímos

Imprensa tem papel importante na compreensão sobre aspecto emocional do esporte

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Aconteceu com Guilherme Costa, depois de terminar em quinto lugar os 400 m nado livre. Com Arthur Nory, ao não se classificar para a final na ginástica artística. Com a judoca Mayra Aguiar, eliminada na primeira luta. E com tantos outros atletas nas Olimpíadas de Paris.

Ir às lágrimas depois de uma derrota não é novidade. Os Jogos Olímpicos são a competição mais importante para 99% dos atletas que ali estão, então é esperado que as emoções aflorem. Mas essa edição tem mostrado que mudou para melhor a forma como o mundo esportivo —incluindo nós, jornalistas que atuamos nessa área— trata os aspectos mentais do esporte.

Nadador com as mãos na cabeça e cabisbaixo sentado ao lado do bloco de partida à beira da piscina
O nadador Guilherme Costa abatido depois da final dos 400 m livre - Miriam Jeske/Divulgação/COB

Muitas derrotas que envolvem fatores emocionais já foram retratadas com deboche pela imprensa. A seleção feminina de vôlei carregou a fama de "amarelona" por anos até levar o ouro nos Jogos de Pequim-2008 e Londres-2012. Essa história, marcada também pelo preconceito de gênero, está muito bem contada no documentário "Bicampeãs", disponível no Globoplay.

Com o tema da saúde mental constantemente na pauta esportiva, o tom desdenhoso perdeu espaço no jornalismo. Os rótulos pejorativos, porém, ainda aparecem bastante nas conversas e análises de ocasião das redes sociais.

Joanna Maranhão, que disputou quatro Olimpíadas e hoje comenta natação na Globo, falou sobre isso numa entrevista ao podcast Café da Manhã.

"Ninguém sobe no bloco, ninguém entra em um tatame ou em uma quadra para competir mal intencionalmente. Isso acontece porque é da vida. A gente tem que naturalizar. O próprio atleta já é cruel consigo mesmo o tempo inteiro, o público não precisa fazer isso. A gente não está falando de passar a mão na cabeça do atleta que vai mal. Trata-se de uma profissão, essas pessoas recebem para isso. Mas estou falando de não jogar pedra em atletas que eventualmente não atinjam a expectativa que a gente criou, porque essa expectativa é a gente, enquanto público, que cria. Esses atletas não têm obrigação de responder a isso."

Joanna e Fabi Alvim, uma das bicampeãs olímpicas do vôlei, são exemplos de quem já sofreu com a desumanização do atleta. Hoje, elas ocupam espaço na transmissão dos Jogos e ajudam a educar o público nessa seara.

Não se trata de não fazer críticas, até porque isso afrontaria a essência do jornalismo, mas de como fazê-las.

Talvez mais à vontade para se expor e demonstrar vulnerabilidade atualmente, atletas brasileiros têm saído do raso em falas que despertam reflexão. Tanto em vitórias, como vimos com os medalhistas Caio Bonfim e Jade Barbosa, quanto nas derrotas mais dolorosas.

Mayra Aguiar, três vezes medalhista olímpica e tricampeã mundial, passou os últimos meses recusando entrevistas e evitando competições. Dado o histórico dela de lesões e cirurgias, quase ninguém sabia das condições em que a judoca chegaria a Paris.

Nesta quinta (1º), depois de perder para a líder do ranking na estreia, não havia mais como evitar as câmeras. A primeira reação foi chorar e pedir para dar um abraço no repórter da Globo Marcelo Courrege, que também não conteve a emoção. Depois, Mayra deu um depoimento sincero, lúcido e corajoso.

"Eu já passei do meu limite. Já tem um tempo que eu venho mentindo até para o meu corpo, mentindo que está tudo bem. (...) É um preço que a gente paga, né? Chega uma idade em que, por mais que eu esteja mentindo, que faça minhas meditações, meu fortalecimento, por mais que finja que está tudo bem, é difícil. Não dá para brigar tanto com o nosso corpo."

No tatame, Mayra perdeu. Mas ao deixar de esconder o que sentia, ela sairá de Paris ainda mais admirada.

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