Doença, solidão, luto, fracasso, injustiça e absurdidade. Definitivamente, a vida é dura. As seis primeiras palavras são os títulos dos seis primeiros capítulos de "A Vida É Dura", do filósofo Kieran Setiya (MIT). O sétimo capítulo se chama "esperança", mas, paradoxalmente, não destoa tanto dos anteriores.
Cada um deles é um microcosmo no qual o autor vai lançando ideias filosóficas que nos fazem pensar sobre os temas. Há um toque de autoajuda, já que Setiya se esforça para não nos empurrar nem para o desespero nem para o ilusionismo. O foco principal é a reflexão. É Sócrates quem disse que uma vida não examinada não merece ser vivida.
Como aperitivo, parafraseio ideias do autor acerca do fracasso. Um clichê popular é o de que a vida deve ser concebida e avaliada como uma narrativa, uma história que contamos para nós mesmos e em que figuramos como heróis. É uma ideia tão prevalente quanto errada. Não há razão objetiva para valorar a vida nesses termos. Basta lembrar que algumas das atividades mais prazerosas, como passar tempo com amigos, são atélicas, isto é, não têm um objetivo concluível.
O problema é que damos tanto valor ao eu autobiográfico que consideramos fracasso tudo o que escape às narrativas heroicas. Alguns grupos sociais, como o de americanos brancos que não fizeram curso superior, são especialmente vulneráveis. Para eles, não ter o sucesso descrito em filmes é prova de fracasso pessoal. Outros grupos, até mais pobres, como o de negros sem faculdade, atribuem suas dificuldades não tanto a um fracasso individual, mas a barreiras sociais, como o racismo estrutural. Para o autor, essa hiperpessoalização é o que explica fenômenos como as mortes por overdose e alcoolismo, que afetam desproporcionalmente os brancos pobres. E, embora Setiya não vá tão longe, isso também pode ajudar a explicar a guinada de certos grupos para a extrema direita em vários países.
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