Itamar Vieira Junior

Geógrafo e escritor, autor de "Torto Arado"

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Itamar Vieira Junior
Descrição de chapéu guerra israel-hamas

Guerras na Palestina mostram que direito ao território é fundamental

Gaza está se tornando cemitério a céu aberto, e palestinos vivem em campo vigiado sem chances de seu Estado prosperar

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Em 1979, ano em que nasci, israelenses e palestinos se recuperavam dos traumas das guerras que se sucederam à criação do Estado de Israel. Em particular, da Guerra do Yom Kippur, da qual participaram Egito e Síria, e que findou com uma promessa de autonomia para os palestinos na "linha verde", fronteira entre Israel e os territórios da Cisjordânia e de Gaza.

Sobre as frações de um possível território palestino pairava a promessa de um acordo que cumpriria o Plano de Partilha de 1947, criando, além do Estado de Israel, o Estado Palestino.

Criança no telhado de prédio na cidade de Jenin, na Cisjordânia ocupada por Israel, observa fumaça em campo de refugiados palestinos - Zain Jaafar - 9.nov.23/AFP

Nesses dias, me vieram à memória as notícias dos telejornais do ano de 1993 sobre o tão esperado acordo de paz, depois de décadas de guerras sangrentas e uma Intifada (1987). Lembro-me de Bill Clinton mediando um aperto de mão entre Yasser Arafat e Yitzhak Rabin nos jardins da Casa Branca, uma imagem que hoje me parece ainda mais improvável.

Os Acordos de Paz de Oslo criaram a Autoridade Palestina, mas os termos para sua concretização jamais foram cumpridos por nenhum dos lados. Rabin foi assassinado por um extremista israelense dois anos depois. Arafat morreria em 2004, em circunstâncias nunca desvendadas.

Aos 13 anos, eu já compreendia minimamente a importância da paz e de como a guerra era um evento indesejado. Apenas dois anos antes, os mesmos telejornais transmitiram em tempo real para o mundo a Guerra do Golfo.

Imagino que, à minha volta, alguns homens se comoviam com a destruição das petrolíferas, outros com as construções bombardeadas. Os mortos eram apenas números, e àquela altura eu já achava o mundo dos adultos tirano e cruel demais.

Foram as imagens das aves agonizando no mar tomado pelo petróleo, fortes, injustas, que chamaram a minha atenção para o que acontecia muito longe. Na minha ingenuidade, eu compreendia que não haviam sido as aves a iniciarem a guerra, mas tinham se tornado vítimas, com o corpo coberto de petróleo, sem poder voar, até a morte. Foi com as imagens dos animais agonizando que a criança que eu fui teve uma dimensão limitada do horror que pode ser uma guerra.

Anos depois, o conhecimento e as leituras foram me contando pouco a pouco a extensão desse conflito, mas ainda assim não me sinto capaz para escrever ou dizer algo relevante. O que tenho a escrever são as minhas impressões gerais, a partir de uma experiência pessoal, íntima, que de nada contribui para pacificar os ânimos dos que gritam por manifestações.

Se Edward Said me ensinou sobre a questão palestina, Amós Oz me ensinou sobre o sonho dos judeus na diáspora com o seu "De Amor e Trevas". Cada um à sua maneira foi moldando a minha percepção sobre o que estava em jogo e confirmando a minha impotência para imaginar uma solução que não fosse a da coexistência entre dois Estados.

Talvez seja o direito ao território o mais elementar de qualquer ser vivente em qualquer fração da Terra (incluindo no nosso país). O direito ao território é um direito inalienável à vida humana. Não é possível viver sem um chão para pisar, sem terra para erguer uma casa ou cultivar, sem ruas para trafegar e caminhar.

Talvez o direito ao território se antecipe até mesmo ao direito de se alimentar, porque até para cair morto é preciso que haja um chão. E milhões, quiçá bilhões de seres humanos, vivem se deslocando de um lugar para outro, impedidos de existirem onde se encontram. Esse, sim, é um ponto que merece reflexão e talvez cada um possa contribuir para mitigar.

Dos territórios que eram promessas de uma Palestina no início desse texto —Cisjordânia e Gaza—, apenas Gaza resiste como uma possibilidade, embora não saibamos até quando. Desde 2007, Gaza sofre bloqueio aéreo e marítimo, e os palestinos vivem em um campo vigiado com inúmeras restrições de circulação, com baixos índices de desenvolvimento humano e sem qualquer chance de ver prosperar seu Estado.

As imagens da guerra me fazem pensar que Gaza está se tornando um cemitério a céu aberto. Israel precisa parar o massacre e o Hamas, libertar todos os civis sequestrados.

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