Luciana Coelho

Secretária-assistente de Redação, foi editora do Núcleo de Cidades, correspondente em Nova York, Genebra e Washington e editora de Mundo.

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Descrição de chapéu Maratona

O diabo veste terno e entrega só obviedades na série 'O Consultor'

Série de mistério do Amazon Prime Video promete muito, mas não passa de boa ideia mal executada

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A recorrente história do pacto com o demônio volta a dar as caras em "O Consultor", série do Amazon Prime Video que estreou em fevereiro e traz Christoph Waltz como o coisa-ruim em terno, gravata e dissimulação.

Diferentemente das versões dos escritores do século 19, que revestiam esses tratos satânicos com elementos de ciência ou de arte, os roteiristas de hoje preferem Satanás no comando de alguma megacorporação. Não raramente, de uma gigante de tecnologia, porque afinal a metáfora do roubo de almas é explícita demais para ser contornada.

Waltz, catapultado à fama justamente por encarnar o que a história equipara ao mal absoluto em "Bastardos Inglórios", compõe uma versão sofisticada, insidiosa e algo sarcástica do capeta, que às vezes lembra a de Kevin Spacey em "Os Suspeitos".

Não espere, entretanto, mais do que isso. Diante de outra produção recente que se embrenha pela mesma temática, "Ruptura", "O Consultor" não é mais do que uma boa ideia mal-ajambrada, e é a performance do protagonista, sozinha, que segura o espectador por seus oito episódios.

Apresentada como uma trama corporativa com um mistério de motor —o jovem fundador-presidente de uma empresa de games (Brian Yoon) morre de uma forma esdrúxula e deixa o comando da firma para um inescrupuloso consultor (Waltz)— logo avança para uma fábula surrealista de contorno religioso bem nítido, uma marca do roteirista-chefe Toby Basgallop, que assina também "Servant" (Apple TV+).

O problema é que a mão de Basgallop é pesada demais e, se na série anterior, sob a direção de M. Night Shyamalan, a verossimilhança se vale de personagens bem construídos e interpretações idem, aqui Waltz e seu Regus Patoff foram abandonados à própria sorte.

O restante do elenco, encabeçado por Brittany O'Grady (a amiga adolescente da primeira temporada de "White Lotus") e Nat Wolff (nada que valha destacar) é, com alguma boa vontade, insosso. Seus personagens carecem de motivações mais verdadeiras ou complexas, e do restante que está em cena não se vê mais do que um esboço.

Ora "O Consultor" apela à ladainha de executivos de sucesso assumindo o posto de veneração outrora ocupado por santos e deuses, ora quer oferecer um quebra-cabeças detetivesco, ora quer apenas sinalizar um virtuosismo estético que parece ter bebido em David Lynch, sem ter sucesso em nenhum desses aspectos.

O roteiro se beneficiaria de desenvolver melhor os personagens de O'Grady e Wolff, ela um "contato criativo" (título auto-outorgado, como é praxe hoje) pronta para ser corrompida, ele um programador desleixado que passa a ser atormentado por signos religiosos.

"Ruptura" triunfou porque seus personagens são coalhados de qualidades e defeitos e dores realistas, mas "O Consultor" nem tenta dar dimensão ao que os personagens vivem, tratando-os apenas como acessórios para desenhar o Grande Mistério por trás do consultor (e ainda contemplam o pobre diabo com um sotaque russo, para não haver dúvida do apreço da produção por obviedades).

No fim, esse rocambole de referências fragmentadas rende quatro horas de entretenimento mediano, caso o espectador já esteja no fim de sua lista de coisas a assistir. Contemplado o Mistério, porém, não resta do que se lembrar.

Os oito episódios de meia hora da primeira temporada de "O Consultor" estão disponíveis na Amazon Video

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