Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Mariliz Pereira Jorge
Descrição de chapéu maternidade

Avós também transam

Mulheres que foram mães talvez não queiram ser avós

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Você consultou sua mãe ou sua sogra quanto à disponibilidade delas – ou à vontade, para fazer parte de sua rede de apoio na criação de seus filhos? Parece uma questão válida num momento em que o etarismo é enfrentado e que as mulheres, em especial, estão descobrindo que há uma vida lá fora, depois dos filhos, da aposentadoria, da viuvez, do fim do colágeno. Participar ativamente do dia a dia dos netos ainda faz parte dos planos?

Avós podem querer outras vivências na maturidade e não necessariamente cuidar dos netos - Adobe Stock

"Avós também transam" é o recado que deveria ser disseminado juntamente com uma bandeira mais do que legítima, a de que "mães também transam". Se a sociedade está aprendendo na marra que o prazo de validade dos idosos esticou, o exercício de compreensão e de apoio deveria começar dentro do núcleo familiar. Entender o tamanho do papel ao qual nossos pais estão dispostos a ter em nossas vidas adultas e nas novas dinâmicas que assumimos não é apenas um sinal de civilidade, mas de amor.

Não é porque não tenho filhos que não sei que a criação deles parece cada vez mais depender de uma rede de apoio. É só preciso um pouco de empatia para entender que casais, mas principalmente mães solo, precisam se cercar de pessoas para ter uma estrutura mínima. Um provérbio, dito africano, ficou famoso por definir esse modelo de parentalidade: "é preciso uma aldeia inteira para criar uma criança." É justo. Mas é preciso que todas as partes estejam de acordo.

Assim como é necessário estar consciente sobre em quem recai muitas das responsabilidades: nas costas das avós. A avosidade compulsória jamais foi questionada num universo no qual os netos é que davam algum sentido à vida da maioria das pessoas que chegavam à meia-idade. É uma segunda maternidade, com obrigações, compromissos, horários. Mas é preciso perguntar: é o que as avós do século 21 querem?

Se nem os 50 são os mesmos 50, vale o mesmo para quem está nos 60 ou 70 anos. É um paradoxo levantar o coro contra o etarismo ao mesmo tempo em que se assume que uma futura vovó se responsabilizará por parte da carga de trabalho e passará a exercer o seu novo papel como uma profissão, muitas vezes em tempo integral. E, não menos importante, sem nenhum tipo de remuneração.

Certamente é o que muitas querem: depois de criar os filhos, ocupar o seu tempo com a vida dos netos. Tudo certo. Mas e quanto aquelas que gostariam de, nessa fase da vida, fazer cursos, viajar, namorar, maratonar séries, sem se preocupar se o Zezinho está no outro cômodo engolindo um parafuso? Avós têm assumido múltiplos turnos, com jornadas de sete dias por semana, movidas pelo amor e pela responsabilidade afetiva. Mas seria bom que pais e mães combinassem com os russos. Mulheres estão cansadas, mães estão exaustas. E as avós?

Escrevo isso, enquanto penso que minha mãe saiu cedinho de casa para viajar com mais 24 amigas para uma região de águas termais. Depois de aposentada, é uma rotina em sua vida. Quando me visita, no Rio, não raramente, se hospeda em algum Airbnb. Ela quer privacidade e fazer as coisas a seu tempo. Jamais me cobrou um neto, imagino porque nunca gostou de ser cobrada.

Da mesma forma que começamos a entender que muitas mulheres não querem ter filho, precisamos normalizar o fato de que há outro tanto de mulheres que foram mães, mas talvez não queiram ser avós. Ou ao menos não em tempo integral.

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