Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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Descrição de chapéu guerra israel-hamas Itamaraty

'Único diálogo com o Hamas é por tiros', diz embaixador de Israel sobre resgate de brasileiros em Gaza

Daniel Zohar Zonshine afirma esperar que todos saiam sãos e salvos, mas que não vê como negociar corredor humanitário com grupo terrorista

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Brasília

Embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zohar Zonshine afirma que seu país não tem "nada contra" a possibilidade de cidadãos brasileiros saírem da Faixa de Gaza, mas que não acredita na possibilidade de um corredor humanitário ser negociado junto ao grupo terrorista Hamas.

"Honestamente, o único diálogo com o Hamas é por tiros", afirma. O embaixador ainda diz achar "um pouco estranho" o modo como o governo brasileiro tem se manifestado sobre a guerra deflagrada entre israelenses e palestinos.

O embaixador de Israel no Brasil, Daniel Zohar Zonshine, na residência oficial da embaixada, em Brasília - Sérgio Lima - 12.fev.2022/Folhapress

No sábado (7), quando o Hamas deu início à maior ofensiva já sofrida por Israel em 50 anos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse ter ficado "chocado" com os "ataques terroristas" contra civis do país comandado por Binyamin Netanyahu.

Na quarta (11), no quinto dia de conflito, o mandatário brasileiro fez sua primeira menção à organização terrorista. Lula apelou para que o Hamas liberte as crianças israelenses que foram sequestradas —e que, do outro lado, Israel cesse os bombardeios para que crianças palestinas e suas mães deixem a conflagrada Faixa de Gaza.

Nenhuma das manifestações, porém, satisfez as expectativas da representação israelense no Brasil. "Não sei se é falta de sensibilidade, mas, ao nosso ver, as coisas são bem claras: um ataque bárbaro e cruel sobre cidadãos israelenses não tem outro nome que não terror", afirma Zonshine à coluna.

O embaixador diz que imagens recebidas dos massacres remetem a população israelense ao Holocausto. Fotos e vídeos foram mostrados à coluna por um diplomata da embaixada, antes desta entrevista, por meio de slides organizados em um arquivo PowerPoint. Corpos incinerados, execuções à queima-roupa, mulheres despidas e violadas e gravações de decapitações são alguns dos arquivos reunidos.

A estratégia de sensibilização por meio da exibição ao público de imagens violentas tem sido reproduzida pelo Ministério das Relações Exteriores de Israel, como mostrou a Folha. Na Embaixada do país em Brasília, algumas dessas fotos estão expostas em um cartaz fixado em um dos muros da propriedade.

Zonshine rechaça a possibilidade de a guerra ter sido motivada pelo cerco a palestinos comandado por Israel nos últimos anos —tese que foi defendida pelo embaixador da Palestina no Brasil, Ibrahim Alzeben, em entrevista à coluna na terça-feira (10).

"O Oriente Médio não é um lugar onde se pode mostrar fraqueza, onde se pode dizer 'ok, me receberam com 4.500 foguetes, mas vou esperar que eles vão parar'", diz o embaixador israelense.

Esse conflito que está em curso se compara a qual outro já enfrentado por Israel?
Não há nenhum precedente. Na história de Israel, a única vez em que o povo israelense, dentro do território israelense, foi envolvido dessa maneira foi 75 anos atrás, na guerra da independência de Israel.
Todos os outros conflitos com países árabes que envolveram o Exército e as Forças Armadas, nunca [se deram] dessa maneira, desse tamanho, com essa dureza.

Algumas das coisas que você viu lá, na memória coletiva israelense, remetem ao Holocausto. Corpos queimados... Isso está gravado na cabeça israelense de uma maneira que traz imagens de lá [da Segunda Guerra Mundial].

Como tem sido a interlocução da embaixada com o governo brasileiro? Vi que o senhor se queixou, durante uma reunião na Câmara dos Deputados, sobre a falta de sensibilidade do governo.
Não sei se é falta de sensibilidade, mas, ao nosso ver, as coisas são bem claras: um ataque bárbaro e cruel sobre cidadãos israelenses não tem outro nome que não terror. E a falta da palavra "terror" [por parte do governo brasileiro, ao se referir ao] Hamas, para nós, foi um pouco estranho.

O presidente Lula já tinha classificado os ataques como terroristas, no fim de semana, e depois citou o Hamas nominalmente, pedindo que eles libertem as crianças. Isso não é suficiente? Seria preciso uma declaração mais contundente do governo?
Ele falava sobre as crianças reféns, sequestradas pelo Hamas, para não atingir e causar danos às crianças.

Nós mandamos avisos para a população palestina em Gaza. "Olha, fica fora dessas zonas, porque lá tem instalações do Hamas e, provavelmente, vamos atingir. Quem está lá, está em uma zona de perigo".

A ideia de Israel não é matar crianças ou fazer alguma coisa nesse sentido. Um dos problemas é que o Hamas está lançando os foguetes por dentro, e esse lançamento é perto de uma escola, perto de uma clínica, dentro de um bairro populoso.

Não podemos dizer que nós não vamos fazer nada. A ideia é avisar as pessoas e bombardear onde tem lançamentos, onde tem instalações militares do Hamas na Faixa de Gaza. Infelizmente, por estar dentro de áreas populosas, há também vítimas não envolvidas [com o grupo terrorista], o que nós lamentamos muito.

Não é uma guerra que nós começamos, não é uma guerra nós pedimos, não é uma guerra que nós queremos. Mas também não podemos dizer que o Hamas está imune a qualquer ato israelense por conta disso.

Em entrevista à coluna, o embaixador da Palestina não quis classificar como terroristas os ataques iniciados pelo Hamas e afirmou que eles são uma resposta ao tensionamento provocado pelos governos israelenses contra a população palestina. Como o senhor vê essa análise?
O que você acha? Você viu as imagens lá. Isso é uma maneira de melhorar a vida dos palestinos? Isso é uma maneira de melhorar a posição dos palestinos em qualquer diálogo com Israel? É terrorismo puro.

Ele sabe que é mentira. Qualquer pessoa que disser que não é terrorismo, é mentira, porque não tem outra definição a não ser terrorismo para [o ato de] tirar a cabeça de crianças e sequestrá-las. Ele pode dizer o que ele quiser, mas é bem claro que é bobagem [a informação de que 40 bebês foram decapitados pelo Hamas foi divulgada por um canal de TV israelense, mas não foi confirmada pelo Exército; contudo, famílias inteiras, inclusive crianças, foram mortas durante os ataques].

Aqueles que defendem que o governo Lula ainda não deve classificar o Hamas como terrorista apontam que a ONU não reconhece o grupo dessa forma.
Mas tem países "pequenos e insignificantes" como os Estados Unidos, Grã-Bretanha, União Europeia, Canadá e outros países que definiram o Hamas como grupo terrorista.

A ONU é um órgão muito complicado e difícil. Quando olhamos para alguns países, nós temos a mesma opinião. A definição, acho, deve ser de que é uma organização terrorista.

O senhor comentou que Israel faz avisos para que a população saia das áreas que podem ser alvejadas. O governo brasileiro tenta tirar de Gaza cerca de 30 brasileiros que se encontram lá, mas as condições são muito difíceis, está tudo cercado. Se eventualmente o governo conseguir um acordo com o Hamas para fazer um corredor humanitário e retirar esses brasileiros, o governo de Israel aceitaria essa rota?
Honestamente, o único diálogo com o Hamas é por tiros. Não tem diálogo com o Hamas, ele não tem diálogo conosco.

Nós não temos nada contra a possibilidade de cidadãos brasileiros saírem da Faixa de Gaza. Ela tem também uma fronteira com o Egito, é uma coisa que pode funcionar nesse sentido. Mas espero que todos tenham a possibilidade de sair de lá sãos e salvos.

A guerra entre Israel e Hamas gera civis mortos de lado a lado. Até que ponto vale seguir com esse confronto, considerando os custos em vidas de mulheres, crianças e de todos os que morrem?
Essa é uma pergunta que é difícil de responder.

O Oriente Médio não é um lugar onde se pode mostrar fraqueza, onde se pode dizer "ok, me receberam com 4.500 foguetes, mas vou esperar que eles vão parar". Tem o Hizbullah no Líbano, organização terrorista apoiada pelo Irã, e que também apoia o Hamas e ajudou a planejar tudo o que aconteceu.

Isso é uma certeza para Israel? Israel tem como certo o envolvimento do Irã?
Sim, sabemos sobre encontros previstos entre líderes iranianos com pessoas que planejaram [o ataque]. Apoio financeiro, de munição.

Quem pensa que essa coisa vai ficar só no Oriente Médio, está errado. Se o Hamas sair vencedor dessa guerra, sem uma resposta israelense dura, isso vai ter implicações no mundo todo. Outras organizações [terroristas] vão ver que podem implementar o terrorismo e ter, além de atenção, ganhos políticos.

Israel não vai parar amanhã só para contar os seus mortos, mas vai lutar contra o Hamas para vencer e para mostrar a ele que isso não pode se repetir. Não só para o Hamas, mas para outros também.

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