Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Descrição de chapéu Banco Central copom juros

BC dividido sobre juros vai causar bafafá político no governo e no mercado

Diretores nomeados pelo governo anterior votam por corte menor da Selic

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A decisão do Banco Central vai causar algum bafafá político e talvez certo tremelique financeiro. A direção do BC baixou a Selic de 10,75% para 10,5% ao ano, como era esperado na praça do mercado, em vez de 0,5 ponto percentual, toada em que vinha desde agosto do ano passado.

A redução do ritmo de corte da taxa básica de juros causaria os protestos estereotipados e os insultos de sempre —de empresários, PT, governo. O tremelique virá do fato de que a decisão de frear a queda da Selic foi por 5 votos a 4.

Justamente cinco votos dos diretores nomeados por Jair Bolsonaro ante quatro votos dos nomeados por Luiz Inácio Lula da Silva.

Sede do Banco Central - Gabriela Biló/Folhapress

Roberto Campos Neto, presidente do BC, "esse cidadão", segundo Lula, votou de um modo. Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária, cotado para suceder a Campos Neto, votou de outro. Paulo Picchetti, economista respeitado e especialista em inflação, nomeado por Lula, votou como Galípolo.

Sabe-se que Lula tem simpatia por Galípolo, que foi vice de Fernando Haddad no Ministério da Fazenda e ajudou o ministro a convencer o presidente da República de que era preciso adotar medidas de prudência no gasto do governo.

De qualquer modo, vai parecer divisão política, não interessam argumentos razoáveis. Vai parecer divisão política tanto para o governo quanto para os donos do dinheiro e seus operadores. Por ora, não tende a dar grande problema, mas a fofoca não ajuda.

Faz tempo, entre os povos dos mercados, se difundira a ideia de que os nomeados por Lula pegariam mais leve com a Selic. O PT e o governo quase inteiro, por sua vez, estavam convictos de que Campos Neto e turma conspiravam contra Lula 3.

Pode ser que a divisão do Copom (Comitê de Política Monetária) seja circunstancial e que os votos pelo corte maior ou menor tenham motivos razoáveis, "técnicos", como diz o clichê exagerado a respeito desse tipo de decisão.

Não quer dizer que tais definições não sejam ou não possam ser em alguma medida "políticas". Mais importante é que a "técnica", teoria e estatística, não é capaz de nos orientar decisivamente em tamanha minúcia (0,25 ponto em vez de 0,5 ponto).

Tudo isso posto, a divisão do BC na decisão desta quarta-feira (8) vai confirmar prognósticos ou preconceitos: diretores lulianos estariam dispostos a correr riscos com taxas de juros mais baixas e, no limite, seriam mais moles, "dovish", com a inflação. Até que se dissipe essa impressão, o que leva tempo, as taxas de juros de vários prazos podem ficar um tanto mais salgadas (tudo mais constante).

No atacadão do mercado de dinheiro, as taxas básicas de juros com prazo superior a um ano estão mais altas do que em agosto de 2023, quando o BC começou a talhar a Selic (a taxa em que o BC interfere diretamente, de curtíssimo prazo).

Além da política, não há novidade relevante no comunicado em que o Banco Central comentou sua decisão. Leitores de borras de café e outros hermeneutas da finança vão se ocupar das vírgulas. No que interessa para a vida real, não há nada digno de grande nota.

O mundo está mais perigoso, "adverso", diz o comunicado, pois a taxa de juros vai demorar mais a cair nos EUA. As taxas de juros americanas influenciam o nível do piso das taxas brasileiras: quanto maiores por lá, maiores tendem a ser por cá.

Com diferenças menores e mais duradouras entre taxas americanas e brasileiras, mais provável que o real permaneça desvalorizado (o que não é lá bom para a inflação).

Cereja desse bolo azedo (para o BC) é uma economia mais aquecida por aqui e o fato de que déficit e dívida do governo brasileiro não vão cair tão cedo. Por fim, no cenário de referência do BC, a previsão para o IPCA de 2025 aumento um tico, para 3,3% (a meta é de 3%).

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