Descrição de chapéu Festival Fartura

Chef Henrique Gilberto busca simplicidade e a redução de desperdício

Cozinheiro mineiro que estará no Fartura aproveita ingredientes ao máximo

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Belo Horizonte

Entre os causos que se contam na família de Henrique Gilberto, 32, um é clássico. A vez em que sua bisavó saiu carregada por garçons de um restaurante após discutir, insatisfeita com o fato de o molho pardo do frango ter sido engrossado com amido de milho. 

“Virou uma brincadeira. Frango com molho pardo, você não mexe, se não dona Efigênia vem puxar seu pé”, conta Henrique, à frente do restaurante Cozinha Tupis.

Histórias são ingrediente obrigatório nos pratos de sua casa, inaugurada em outubro do ano passado no Mercado Novo, zona central de Belo Horizonte. 

Um dos principais nomes da cozinha mineira contemporânea, Henrique encabeçou, com um grupo de amigos, a ideia de ocupar o prédio desse mercado. 

O espaço, que antes era tomado por fabriquetas, gráficas pequenas e lojas de velas, começou a receber também restaurantes, cafés e empórios que funcionam como uma rede —em um bar, por exemplo, você pode comer o quitute do box vizinho.

Deu tão certo que esse novo pedaço do mercado fica lotado de quinta a domingo. 

Henrique herdou o gosto pela cozinha do avô, Aníbal, pai de seu pai. Médico e professor de biologia, o avô ia aos livros de culinária e testava os pratos para aprender mais sobre diferentes culturas, como a japonesa. 

Os filhos cresceram gostando de cozinhar, mas nenhum seguiu essa atividade como profissão. Só o neto.

Aos 15, Henrique começou a trabalhar limpando a cozinha do Xapuri, tradicional restaurante de comida mineira. Depois, mudou-se para o Rio e foi trabalhar no Carême, da chef Flávia Quaresma.

Três anos mais tarde, foi convidado para o Super Chef, quadro do programa de Ana Maria Braga, na TV Globo. 

Ele venceu a competição, um dos primeiros realities de gastronomia do país. O prêmio de R$ 50 mil foi separado para uma viagem de aprendizado na Europa. Antes, Henrique ainda colocou no currículo o D.O.M., de Alex Atala. 

Depois de passar por França e Espanha, trabalhou por oito meses no restaurante de um dos chefs mais estrelados do mundo: a Osteria Francescana, do italiano Massimo Bottura, em Modena. 

Lá, aprendeu mais sobre a importância da preciosidade técnica, dos rituais de concentração na cozinha e também das relações humanas.

“A coisa que mais me impressionou quando comecei a trabalhar aqui no Cozinha Tupis foi a forma com que Henrique trata o alimento. Ele se empolga com o método, com o ingrediente e transmite isso para a gente”, depõe Ana Clara Ribeiro Valadares, 23, cozinheira. “Em outras casas, você pega e faz, não é lugar de criação.”

A inventividade no Cozinha Tupis é regra. O cardápio do lugar muda toda semana, pautado pelos ingredientes disponíveis na época. Se for a semente de abóbora que está barata, por exemplo, a equipe quebra a cabeça para usá-la em receitas.

“A gente sabe que em um cardápio fixo a tendência é o cozinheiro fazer 10 quilos de purê e guardar na geladeira. Aqui é o antipadrão. A gente muda para estar sempre cozinhando”, afirma Henrique. 

Os testes e as melhorias são anotados. Desde que o restaurante abriu, há nove meses, já foram oito cadernos. Há, ali, pratos que fazem porque gostam, e outros que fazem porque são sucesso de público. 

Nessa última categoria está o frango (coxa e sobrecoxa) com requeijão e milho, que Henrique irá levar ao Espaço Chefs e Restaurantes do Fartura. O milho está presente no creme e na broa, servida em formato de biscoito.

O modelo de negócio do Cozinha Tupis virou filosofia de trabalho segundo a qual a relação com os fornecedores e com o local é prioridade. 

Henrique trabalha com três fazendas agroflorestais na região da capital mineira, com alguns frigoríficos pequenos, nos quais é possível pedir o corte de carne a seu gosto, e também com os feirantes do próprio mercado. 

“Tinha essa intenção meio utópica, e ainda temos, de construir um lugar que cause um impacto positivo na sociedade como um todo”, diz Rafael Quick, um dos sócios da cervejaria Viela, que virou âncora do espaço gastronômico do Mercado Novo. 

Além da relação com fornecedores, a responsabilidade sobre a produção de lixo influencia muito a maneira como Henrique pensa a comida. No seu restaurante só se usa guardanapo de pano e copo de vidro. E nada de embalagens para viagem. 

Alimentos que começam a passar do ponto são submetidos a um processo de fermentação para serem conservados e, além disso, também podem virar vinagre. 

Sobras de caldo são desidratadas e voltam às receitas como tempero. E alimentos e restos que não puderem ser reaproveitados são encaminhados para compostagem. 

Entre 2013 e 2014, Henrique comandou a dinâmica de um restaurante grande, o Belo Comidaria, em Belo Horizonte, onde a comida, produzida em grande quantidade, sobrava.

Hoje, a realidade é diferente, e ele parece ter encontrado sua identidade: pensa na cadeia alimentar toda, do fornecedor até o lixo. 

“Nosso papel é tentar mudar o cenário do mercado, para ele ter portas mais abertas a fornecedores de orgânicos”, diz Henrique. “Quando a gente busca simplicidade, vê que basta aceitar o ambiente que nos cerca. A identidade da Cozinha Tupis beira isso.”

Festival Fartura – Comidas do Brasil São Paulo
Sábado (3), das 12h às 22h, e domingo (4), das 12h às 20h, no Jockey Club São Paulo (av. Lineu de Paula Machado, 1.263, Cidade Jardim). R$ 25 (inteira) e R$ 12 (meia), no primeiro lote. Informações e venda de ingressos: farturabrasil.com.br/blog-festivais/fartura-sao-paulo

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