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Marília Miragaia

50 Best: O melhor restaurante da América Latina não é o melhor

Ranking é relevante para quem gosta de comer, mas ordem dos vencedores não é a razão para isso

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Rio de Janeiro

O peruano Maido, de Lima, que foi o primeiro colocado no ranking do 50 Best da América Latina, anunciado nesta terça (28), é mesmo o melhor da região? Ouso dizer que não.

Tenho mais de uma razão para defender isso, mas uma delas é que o gosto pela comida se constrói desde muito cedo. Diferente de apreciar rock ou MPB com 16 anos, é aos 2 que começamos, em geral, a fazer escolhas alimentares influenciadas pelo que nos é oferecido e pelo perfil de cada um —há crianças que não recebem bem texturas, por exemplo.

Prato servido no Maido, em Lima, eleito o melhor restaurante da América Latina pelo 50 Best
Prato servido no Maido, em Lima, eleito o melhor restaurante da América Latina pelo 50 Best - Divulgação

No caso desse prêmio, estamos falando da compilação do gosto de 300 jurados, com pouca ou nenhuma chance de acertar o seu. Mesmo assim, o prêmio vale sua atenção: ele é um termômetro do cenário e pode trazer informações relevantes para quem gosta de comer.

Para o setor, o ponto positivo do 50 Best é o movimento que gera para o turismo –a prefeitura do Rio de Janeiro investiu R$ 3 milhões para receber a cerimônia. Nesse quesito, todos os países da América Latina querem ser o Peru, que ´referência quando o assunto é atrair visitantes –e, hoje, sinônimo de boa gastronomia para a comunidade mundial.

Depois de quase duas décadas de envolvimento do estado para realizar feiras e promoção de chefs e ingredientes, o país andino lidera a lista do 50 Best na América Latina, já tendo sido o primeiro a furar a hegemonia americana e europeia no ranking mundial.

O peruano Micha, apelido de Mitsuharu Tsumura, do Maido, que ficou no primeiro lugar, afirma que mais da metade da ocupação de seu negócio, em Lima, vem dos turistas.

Isso faz cozinheiros de países como Bolívia aspirararem o mesmo. É o caso da chef Marsia Taha, do Gustu, que ficou em 23º lugar no ranking. "Temos muito potencial turístico e ganhar um prêmio é dar visibilidade ao meu país. Todos acreditam que a Bolívia é um país andino, mas queremos mostrar que temos muita amazônia e que nossa cultura de comunidades indígenas é muito preservada", disse ela à Folha, no Rio de Janeiro.

O discurso se repete na fala do panamenho Fulvio Miranda, do Cantina del Tigre, também presente no evento. "Quero levar a bandeira do meu país para o prêmio. Gostaria que as pessoas conhecessem as montanhas do Panamá e soubessem que, em pouco mais de uma hora, você sai do Pacífico e está no Caribe", diz ele.

Por isso, hospedar a cerimônia do 50 Best América Latina, que foi realizada nesta terça (28) no Rio, era uma demanda antiga do setor no Brasil —o evento de premiação, que já foi realizado no Peru, na Colômbia, no México e na Argentina, costuma receber uma comunidade de chefs, jornalistas e patrocinadores, que acabam contribuindo para o restaurante ganhar destaque.

Outra tendência interessante nos restaurantes eleitos é o esforço para mapear biomas e regiões produtoras cada vez mais específicas. É a marca do peruano Central, de Virgilio Martínez e Pía Léon, escolhido como o melhor restaurante no mundo pela lista principal do 50 Best.

Um parênteses. Por ter sido o vencedor do ranking mundial, o Central acabou se tornando inelegível na vertente regional, latino-americana. É uma regra do prêmio.

Mapear biomas também é o que faz a colombiana Leonor Espinosa, do Leo, em Bogotá, que apresenta em seu restaurante influências da amazônia colombiana, de florestas do Pacífico e de áreas com clima de montanhas e de deserto.

Prêmios gastronômicos, como em qualquer outro setor, carregam incongruências. No caso do 50 Best, chefs reclamam que é preciso gastar uma quantia de tempo e dinheiro considerável para fazer o networking que o ranking exige. Para alguns, é uma lista que dá espaço para quem sabe fazer relacionamento.

Com isso posto, é claro que o primeiro colocado entrega excelência na cozinha. Mas as posições servem mais quando são acompanhados de informações que justificam o destaque.

Para evitar frustração, use rankings e guias como um ponto de partida. Descubra as histórias, abordagens, técnicas e ingredientes que te despertem curiosidade e só então encontre um lugar que —na sua opinião— mereça uma reserva.

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