Descrição de chapéu cracolândia

Moradoras de conjunto popular em SP dizem estar cercadas pela cracolândia

Concentração de usuários de drogas voltou a preocupar na região da praça Júlio Prestes

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São Paulo

Um grupo de moradoras do Complexo Júlio Prestes, conjunto de prédios populares no centro de São Paulo, decidiu se mobilizar para reclamar de um problema crônico na região e que dá sinais de agravamento nos últimos dias: a presença de uma parte do fluxo da cracolândia nos arredores do residencial.

"Estamos pedindo ajuda porque a cracolândia está na porta do nosso prédio", diz a autônoma Danielle Barreto, moradora de prédio localizado na avenida Duque de Caxias. "Eles retornaram e vivemos com medo de sair de nossa própria casa, pois são agressivos", completa, referindo-se a usuários de crack acampados na calçada.

A imagem mostra um grupo de pessoas na rua em situação de uso de drogas
Moradora registrou concentração de usuários de drogas na região do Complexo Júlio Prestes - Reprodução

Esta semana, o secretário-executivo de Projetos Estratégicos do município, Alexis Vargas, admitiu que a concentração de usuários de drogas no centro de São Paulo está mais dinâmica e dispersa.

Não existem mais os grandes fluxos (como é chamada a concentração de usuários), mas moradores e comerciantes convivem com o tráfico e o consumo de drogas em pontos distintos da região central.

Outra moradora do residencial relata que houve uma melhora quando a concentração de usuários deixou o entorno da praça Júlio Prestes, em março deste ano, e mudou para a praça Princesa Isabel. No entanto, após uma grande operação policial, os usuários voltaram a se espalhar e semanas depois uma parte voltou ao antigo endereço.

"Temos observado o esforço deles em retornar ao lugar da origem", diz a moradora, com medo de divulgar o nome.

Ela vive no Complexo Júlio Prestes desde 2019 e diz ter ouvido a promessa de que a cracolândia sairia da região quando o residencial foi inaugurado, em 2018, após construção em regime de PPP (parceria pública privada).

As cinco torres ficam em um espaço planejado para abrigar também lojas e supermercado e fazem parte de proposta do governo estadual para revitalizar a área central e instalar moradores perto dos seus empregos.

"Pagamos imposto, condomínio e nossa prestação habitacional", ressalta a moradora. Segundo ela, é grande a insatisfação com a violência na região e não faltam relatos de agressões e roubos.

O namorado de outra moradora, por exemplo, sofreu uma tentativa de roubo quando caminhava em direção à Estação da Luz após ser cercado por um grupo de homens. Ele foi agredido, caiu e conseguiu passar pelo meio das pernas de um dos criminosos. Voltou para o prédio com a calça rasgada, sujo e o joelho sangrando.

"Quando os usuários de drogas caem para esse lado parece que ninguém se importa muito", acredita uma das primeiras mulheres a viver no complexo. "Pagamos um imposto altíssimo para passar todos os dias por fezes, urina e vômito".

A professora aposentada Dionísia Brito, que também mora no prédio da Duque de Caxias, conta que ia para o terminal Princesa Isabel por volta das 7h30 e foi atacada por dois homens que a seguiram, seguraram o seu braço direito e tentaram cortar a alça da bolsa.

"Gritei e corri. Consegui entrar no terminal, mas com a bolsa pendurada por um fio", relata.

Assustada, Dionísia está com medo de sair de casa. "Eu conheço o sofrimento das pessoas daqui que saem todos os dias para trabalhar", diz. Quando tem coragem de ir para a rua, ela prefere não levar o celular. Nos dias em que é necessário carregar o aparelho, deixa no modo avião para não tocar e chamar a atenção.

A professora aposentada mudou também o jeito de se vestir. Usa roupas e calçados que facilitam a locomoção para o caso de precisar correr.

"Temos essa moradia onde pagamos prestação alta, IPTU alto, condomínio salgado para não termos o direito de andar com segurança", reclama Sidneia Antônia Salles.

Há três anos na torre 3 do complexo residencial, a funcionária pública aposentada acredita que caiu em uma "roubada" ao comprar o apartamento financiado.

"O cheiro é horrível, há fezes, se deixar o carro na rua quando a gente volta encontra os vidros estourados", afirma.

Segundo ela, a situação piorou, pois há mais registros de tentativas de roubos e violência, sempre com grupos de três ou quatro pessoas entre os agressores.

Sônia Domingues, síndica de uma das torres do complexo, também se manifestou. Segundo ela, durante três anos e meio os moradores conviveram com a concentração de usuários de crack na região.

"Era cheiro de droga o dia inteiro, barulho, cenas de violência, música alta. Vários moradores colocaram vidros à prova de som, pessoas tiverem problemas de saúde, as janelas eram quebradas caso saíssemos para olhar, tivemos invasão de apartamento, marmitas eram jogadas", descreve. "Morávamos literalmente dentro da cracolândia".

A volta da concentração de usuários assusta a síndica. Ela afirma que acontecem roubos diariamente e há pessoas que mostram os órgãos sexuais para os moradores.

"Ir ao mercado se transformou em um pesadelo. Precisamos de socorro urgente. Dependentes precisam de saúde pública pois não respondem mais por eles. Isso não vai parar, em breve São Paulo inteira virará uma imensa cracolândia", opina.

Outra moradora do complexo conta que acreditou em melhorias para a região quando a cracolândia saiu do entorno da praça Júlio Prestes e, depois, foi retirada da praça Princesa Isabel.

"Foi um momento de respiro. Achamos que havíamos vencido a batalha", diz.

No entanto, um mês depois os usuários de drogas voltaram e, segundo ela, agora o cenário é pior.

Autônoma e sem horário fixo de trabalho, ela enfrenta dificuldades para se locomover na região. "Antes ficava um ou outro usuário na avenida Duque de Caxias. Agora ficam cerca de 100 durante o dia, na ciclofaixa, em frente ao portão do prédio".

Segundo a trabalhadora autônoma, durante a noite a quantidade dobra, com concentração em frente e na lateral do prédio. "Fiquei sem opção de ônibus e de trem para voltar para casa. Não dá para circular na rua. Não dá para fazer absolutamente nada".

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