Breaking corre contra o tempo em preparação para Olimpíadas de Paris

Entidade que gere o esporte no Brasil tenta organizar calendário e seleção em meio a contestações

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A dois anos e meio das Olimpíadas de Paris-2024, o COB (Comitê Olímpico do Brasil) e o CNDD (Conselho Nacional de Dança Desportiva) ainda estão no início de uma corrida contra o tempo para organizar a prática do breaking no país do ponto de vista esportivo.

Um dos elementos da cultura hip-hop, nascida em Nova York na década de 1970, a dança se viu pela primeira vez na história inserida no arcabouço do esporte tradicional. Com isso passou a seguir regulações do COI (Comitê Olímpico Internacional), da federação internacional reconhecida pelo comitê, a WDSF (World DanceSport Federation), e de uma série de entidades nacionais criadas nos países que desejam ter representantes em 2024.

Em 2019, a organização dos Jogos de Paris propôs a entrada do breaking no seu programa olímpico, como uma modalidade da dança desportiva —há várias outras no guarda-chuva da WDSF, por exemplo salsa e rock'n roll acrobático.

Luan durante apresentação, apoiado com uma mão no chão e as pernas para o alto
O b-boy brasileiro Luan San, quarto colocado no Campeonato Mundial de Paris em dezembro - Gao Jing - 5.dez.21/Xinhua

O COI, que já havia feito um teste bem avaliado com o breaking nos Jogos da Juventude de 2018, aprovou a ideia oficialmente em dezembro do ano passado, por entender que ela ajudará a rejuvenescer a audiência do megaevento. Apesar disso, não há garantias de que permanecerá para as edições seguintes.

"Ninguém havia feito breaking enquanto dança desportiva antes disso. Não existia padronização nacional ou internacional, federações, confederações, circuito, sistema de ranking, nada disso. Somente a partir de 2021 o breaking passou a existir enquanto esporte. Tudo o que acontecia até então era o cenário cultural", afirma José Bispo de Assis, diretor técnico de breaking do CNDD.

Criada em 2013, a entidade foi reconhecida pela WDSF no ano seguinte como representante da dança desportiva no Brasil. Foi isso que a habilitou a ser tratada pelo COB como a responsável por gerenciar o breaking no país em nível olímpico, mesmo sem nunca ter organizado nenhum evento específico da modalidade.

O departamento de breaking foi criado pelo CNDD em janeiro de 2021, com pessoas que já eram ligadas historicamente à prática. Ele tem como obrigação, por exemplo, criar um calendário de competições, um ranking e formar a seleção brasileira.

Outros nomes relevantes da cena, porém, contestam a diretoria comandada por Bispo. Um deles é Rooneyoyo, presidente da Confederação Brasileira de Breaking (CBRB) e membro da Federação Paulista de Breaking —a maior do país.

"Nós já temos um planejamento até 2032", diz ele, que vê como desperdício de dinheiro a criação de um novo calendário, uma vez que a CBRB e a federação já organizam campeonatos.

Segundo Rooneyoyo, ele procurou o CNDD e chegou a propor nomes para compor uma possível diretoria, mas sua entidade foi excluída do diálogo. "Tentamos nos emparelhar. Não acho justo a confederação tomar de assalto o rolê. Estou disposto, se qualquer um me ligar agora, nós fechamos negócio já. Não tenho raiva, mas estão fazendo coisa errada", diz.

Para Bispo, o processo de formação da diretoria foi democrático e as contestações se devem a interesses por cargos e poder. A entidade receberá um repasse de cerca de R$ 2,5 milhões do COB em 2022, como distribuição dos recursos das loterias federais.

"O CNDD só vai trabalhar o esporte. Todo o lado cultural e social, que vai se beneficiar indiretamente [das Olimpíadas], continuará acontecendo sem ingerência nenhuma", ele declara.

Em meio aos conflitos internos na cena, a primeira reunião presencial entre o COB e o CNDD ocorreu em novembro deste ano, após as Olimpíadas de Tóquio.

Nove pessoas posam para foto em frente a banner do comitê olímpico
Dirigentes do CNDD e do COB após reunião para discutir o breaking em Paris-2024 - Rafael Bello - 11.nov.21/COB

Lucimar Cardoso, vice-diretora técnica de breaking, relata que tem contado com a ajuda da Comissão de Atletas do COB, especialmente do ex-lutador de taekwondo Diogo Silva, para definir os mecanismos de participação dos dançarinos, agora atletas, nos eventos.

Mas as dúvidas não são exclusividade dos brasileiros. O primeiro Campeonato Mundial com chancela olímpica foi realizado pela WDSF no começo deste mês, em Paris. Teve 108 b-boys e 90 b-girls de 60 países, que competiram em batalhas individuais. Houve uma fase de grupos antes dos mata-matas, que começaram nas oitavas de final e foram até a decisão do título.

A regulamentação internacional de arbitragem que será adotada na preparação para Paris e nas Olimpíadas, chamada de Trivium, ainda não foi lançada oficialmente. No Mundial, usou-se o mesmo sistema dos Jogos da Juventude, com pequenas adaptações.

Em linhas gerais, os atletas são avaliados por um corpo de júris, que decidem o melhor dançarino da batalha a partir de critérios como técnica, performance e criatividade.

Na época da indicação dos representantes para o Mundial, o Brasil tinha apenas sete filiados ao CNDD, e a WDSF estipulou a filiação à entidade nacional como regra para a participação. O COB também enviou um representante para acompanhar o evento.

Sem ter como organizar um torneio classificatório, o conselho selecionou os b-boys Luan San e Rato e as b-girls It'sa e Nathana. Luan San foi o principal destaque, na quarta posição. It'sa, que se define como pessoa não binária e compete na categoria feminina, e Rato ficaram entre os 32 mais bem colocados.

O CNDD espera em breve divulgar seu planejamento para 2022, com cronograma de eventos e a indicação de como funcionará o sistema de ranking e de acesso às vagas olímpicas, além dos critérios para a formação de uma seleção brasileira. Também não há definição de um calendário internacional, mas já se sabe que 16 b-boys e 16 b-girls estarão presentes em Paris-2024.

"Estabelecemos um projeto, submetemos ao COB e estamos aguardando aprovação. Posso adiantar que a gente pretende fazer um Brasileiro que vai ser o grande evento de ranqueamento no segundo semestre. Também vamos ter acesso a espaços do COB, como centros de treinamento e o laboratório olímpico", diz Bispo.

​Rooneyoyo entende que o comitê comete um erro ao dialogar com o CNDD, não com a CBRB, como responsável pelo breaking no Brasil. Mesmo sem a chancela, diz que pretende tentar angariar recursos públicos para a modalidade e que sua confederação seguirá com o próprio calendário.

"Agora, estamos no meio das competições de 2021, que resolvemos fazer de forma semipresencial. Estamos no meio das edições regionais, em todas as cinco regiões do Brasil, e depois acontecerá a final, que a princípio será virtual, mas pode ser presencial caso consigamos um patrocinador para o evento", afirmou.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.