Descrição de chapéu Natal réveillon

Natal de jovens com pais separados pode ser difícil, mas há como sofrer menos

Ter que escolher com quem passar as festas de fim de ano às vezes gera sofrimento, e especialistas dão dicas para abordar o tema com os adultos

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São Paulo

Peru, farofa, arroz com passas e… torta de climão. Pode ser esse o cardápio das próximas semanas se a questão do Natal e do Ano Novo dos pais separados estiver mal resolvida. E nem é preciso que a mãe e o pai tenham brigado feio no passado, basta apenas que eles não se entendam na divisão das datas.

Família reunida em festa de fim de ano - adobe stock

A família de Gabriel, de 17 anos, por exemplo, não tem um esquema fixo para as festas, mas nos últimos anos ele vem passando a noite e o almoço de Natal com a família da mãe, e o Réveillon com a família do pai, que mora em outra cidade.

"Eu moro com minha mãe e meu padrasto. Meus pais são separados há mais ou menos 15 anos", conta ele, que é de Pelotas (RS) e em 2013 se mudou para Porto Alegre. Esse ano, o arranjo mudou, e a noite de Natal vai ser com o pai, o almoço com a mãe, e o Ano Novo, com sua namorada.

"Eu não me incomodo muito nessa questão de trocar de casa e tal, porque eu me acostumei. Mas o que realmente é meio chato mesmo é a questão deles [os pais] não se falarem. Tipo, não é brigado nem nada, mas não tem nenhum contato e não tem essa troca entre as duas famílias", lamenta Gabriel.

Aimée tem 16 anos e é a namorada de Gabriel. "Meus pais se separaram quando eu tinha dois anos e logo já teve a guarda compartilhada. É bem aberto, eles sempre foram parceiros, trabalharam juntos. Então, é muito mais fácil poder conversar com eles, sem aquele tabu de quando os pais são brigados", diz.

"As datas comemorativas foram sempre um ano com um, e a outra data, com o outro. Mas esse ano vou passar o Natal com minha mãe e o Ano Novo com meu pai de novo, porque ele vai pra praia. Eu tenho essa escolha."

Clara, 17 anos, mora com o pai e a irmã em São Paulo há cerca de um ano. Antes disso, morava só com a mãe na Bahia desde a separação dos pais, 16 anos atrás. Ela conta que, como a mãe nunca se importou muito com as festas de fim de ano, era comum "passar batido por esses eventos". Ela ainda não sabe como será esse ano.

"Meu pai trabalha viajando e volta para o Natal, então eu gostaria de passar com ele. Também gostaria de ver a minha avó materna, que estará em outro lugar. Enfim, tenho duas opções e ambas em São Paulo, longe da minha mãe", diz.

Ela também lembra Natais que passou na casa de uma amiga. "Ela comemora com muito vigor e eu gosto de ir pra lá, porque sempre me recebem com muito carinho e me sinto, de certa forma, mais normal", afirma.

"É uma vida inteira tendo que tomar várias decisões que precisam levar em consideração o fato de os meus pais serem separados. É gostoso ter duas casas, poder buscar refúgio na outra quando uma delas não parecer confortável, mas às vezes é estranho por sempre existir um sentimento de que você não está 100% no seu lar. Sempre tem coisa sua faltando, sempre tem que decidir em qual ficar."

Se esta época do ano causa algum tipo de angústia por conta dessa divisão de casas, o melhor a fazer é não esconder o sentimento. "Eu diria para os jovens tentarem abrir o jogo com carinho e sinceridade, e tentar falar o que está em jogo. Porque geralmente, em vez de falar, o jovem fica batendo porta, virando o olho, fica às vezes até doente, mas o ideal é sentar e falar", diz Vera Iaconelli, doutora em psicologia pela USP, psicanalista e colunista da Folha.

Vera fala que, nessas horas, é preciso separar as coisas e entender que o amor pelos pais não muda se há a preferência por passar Natal e Ano Novo nesta ou naquela casa. "Às vezes os filhos também se sentem divididos, tendo que escolher entre pai e mãe, se preferem ficar numa casa podem melindrar a pessoa da outra casa. Acabam tendo que provar quem preferem, e não é justo que os adultos façam isso com eles."

Para Carolina Delboni, educadora e pesquisadora do comportamento adolescente, o ideal é se manifestar. "Deixe claro que, apesar de não ser um adulto e não ter feito parte dessa decisão que os pais tomaram, você é a consequência dessa decisão, é a pessoa que precisa ficar correndo de um lugar para o outro para satisfazer um desejo que é dos pais, e não seu", afirma.

Ela sugere algumas perguntas para fazer aos pais: "Será que eu já não posso decidir isso junto de vocês? Será que não podemos conversar sobre essa decisão juntos? Será que vocês conseguem entender que essa bagunça me faz mal, me deixa chateado, cansado?".

"Diga, fale, se expresse. Sem brigar, sem agressividade. Sei que é difícil, mas é preciso tentar estabelecer um canal de comunicação e compreensão. Dizer o que a gente está sentindo é sempre um recurso potente."

Por fim, mas não menos importante, Carolina mostra que, por mais que o que esteja em jogo neste momento não seja o quanto todo mundo se gosta, é importante levar em consideração o que os adultos também podem estar sentindo. Tipo quando a mãe ou o pai tem um novo parceiro ou parceira, e a festa vai ser com esta nova família.

"É preciso compreender que existe um adulto do outro lado tentando reconstruir a vida amorosa e ele precisa ser respeitado. Então talvez o filho tenha que ir a esta nova casa mesmo que não queira. Nem tudo será 100% agradável. Mas é preciso aprender a fazer coisas pelo outro também", afirma.

"E pense também no que você, adolescente, pode fazer por você mesmo, o que está a seu alcance. Será que tem algo no seu comportamento que você pode mudar? Será que você consegue ir para a festa com um leve sorriso no rosto? Tente pequenas mudanças para que, aos poucos, você supere a sensação de coisa chata e consiga viver o que de bom essa reunião familiar pode te proporcionar."

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