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Árvores são inimigas das cidades? Saiba quem cuida delas e como dá para ajudar

Vistas como culpadas pelo caos em dias de chuva, elas precisam ser monitoradas pela prefeitura, mas cidadãos podem colaborar

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São Paulo

Quando era pequeno, o biólogo Sérgio Marques de Souza ouvia de sua mãe que as árvores às vezes atrapalham as coisas, tipo sujando o quintal com suas folhas. Esse era um jeito de se pensar muito comum antigamente, mas que resiste ainda hoje mesmo com o conhecimento que as pessoas têm da ecologia. Há quem pense que estas grandes estruturas da natureza causam mais problemas do que soluções.

São Paulo (SP), 04/11/2023-Árvore que caiu durante temporal que atingiu a cidade de São Paulo na sexta (3) - Edi Sousa/Ato Press/Agência O Globo

"As pessoas só percebem a falta que as árvores fazem infelizmente quando se veem sem árvores. Quando estão num espaço onde só tem prédio, ou mesmo quando vão parar o carro num estacionamento que não tem nenhuma árvore e está um calor do caramba. Infelizmente, acho que as pessoas só percebem quando acaba", diz Sérgio, mestre em ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e doutor em zoologia.

Para ele, essa distância que os moradores das cidades criaram da natureza quebra a ecologia de um jeito ruim. E tudo, então, vira um ciclo que faz com que alguns cidadãos ainda achem que as árvores são inimigas do progresso —afinal, em dias de chuvas como a do último fim de semana, são elas que caem em cima dos fios elétricos ou no meio da rua.

Acontece que as árvores caem mesmo, diz o biólogo. "Faz parte do ciclo natural delas, que são seres vivos e nascem, crescem, envelhecem e morrem. Às vezes elas morrem de pé, e a madeira vai apodrecendo, vai dando fungo, cupim, e aí elas acabam caindo", explica.

"Também existem diferenças entre as várias espécies de árvores, que têm a densidade da madeira diferente. Algumas aguentam mais tempestades e outras aguentam menos. Outra questão é o terreno: árvores em um terreno inclinado são mais propensas a cair. Quando tem uma chuva muito forte, a força da água vai lavando o solo e a árvore cai junto com ele."

Isso não significa, no entanto, que todo mundo deva assistir de braços cruzados às questões com as árvores. As prefeituras das cidades são responsáveis pelos cuidados com a vegetação local, e podem ser avisadas pelos moradores de que há um problema iminente, caso já não tenham feito esse mapeamento e monitoramento. Sérgio diz que, muitas vezes, também faltam funcionários especializados, e que também podem faltar recursos [dinheiro].

Uma árvore de pé é muito valiosa. "Ela tem importância fundamental na regulação do microclima da cidade. Existe um fenômeno chamado ‘ilhas de calor’, que se formam por causa do excesso de concreto e de poluição, e as árvores conseguem amenizar isso. As árvores também captam gás carbônico e liberam oxigênio. Imagine a importância disso para quem vive numa cidade superpoluída", afirma Sérgio.

As árvores, ele explica, são o último reduto de uma cadeia ecológica urbana. Isso significa que existem vários animais como gambás e sabiás que dependem delas para, por exemplo, comer as frutinhas que nascem ali ou para fazer naqueles galhos os seus ninhos.

Ele relembra a importância de não podar ou cortar árvores sem a autorização da prefeitura da cidade. Primeiro, porque isso é considerado um crime ambiental. Segundo, porque é uma ação que envolve riscos, sendo o principal deles relacionado à altura das árvores, que acabam passando perto dos fios de eletricidade —é preciso chamar uma equipe treinada nisso.

"Outra questão é que as árvores são um bem comum e público, e como todo bem público ela tem que ser cuidada porque presta um papel para todos os cidadãos. É preciso pedir uma autorização ambiental antes de tudo. Além disso, uma poda malfeita pode até matar uma árvore, e a gente não quer que isso aconteça", alerta o biólogo.

Pode mesmo ser difícil olhar para as árvores como amigas quando elas atrapalham o trânsito ou interrompem a transmissão de energia e fica todo mundo sem luz no quarteirão por muitas horas, como aconteceu na última sexta (3).

Mas é importante lembrar, diz Sérgio, que todas as relações têm seus conflitos, e que com as árvores não seria diferente. Especialmente porque, ele afirma, esses momentos de estresse "não chegam nem aos pés dos benefícios" que as árvores oferecem.

"As árvores prestam serviços ambientais fantásticos pra gente. Fazendo bem pra nossa vista, pra nossa respiração, para o nosso lazer, para a nossa saúde mental, para o clima, pra tudo, né? A gente tem que tornar as pessoas da cidade íntimas da natureza e das árvores", acredita.

Uma boa educação ambiental começaria, por exemplo, por conhecer mais sobre as espécies que existem na rua de casa e na rua da escola, e entender suas particularidades. "Tem árvores que são centenárias em bairros que um monte de gente conhece. São verdadeiras anciãs. Tinha uma árvore dessas onde eu morava, lá no Butantã, mas que infelizmente foi cortada. Era um ipê gigante que servia de ponto de encontro das pessoas", lembra.

"Quando eu era pequeno, descobri que São Paulo, antes de ser uma cidade, era uma floresta. Aquilo me chocou muito. Só que hoje a gente ainda vê resquícios, coisas que sobraram daquela época. Precisamos estimular as pessoas a se interessarem por todas as árvores."

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