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6
bilhões de pessoas.
Será demais?
Teóricos crêem que a Terra está próxima
do máximo de habitantes que pode alimentar, mas não há
consenso; na agricultura, uso de água supera taxa de reposição
MARCELO LEITE
especial para a Folha
Supondo que você leia este texto até o fim e que isso leve
três minutos, haverá umas 450 pessoas a mais sobre a Terra
quando terminar. Nesse ritmo de mais de duas pessoas por segundo, em 12
de outubro o planeta contará com 6 bilhões de habitantes.
O cálculo parte da agência de população da
Organização das Nações Unidas. A contagem
regressiva oficial para o Dia dos 6 Bilhões começa daqui
a 2,16 milhões de pessoas, no Dia da População Mundial
(11 de julho). É tanta gente que a ONU arranjou logo duas datas
para marcar a ultrapassagem de mais
um bilhão.
Evolução da
População Mundial |
População |
Ano |
Tempo decorrido entre
uma marca e outra |
1 bilhão |
1804 |
--- |
2 bilhão |
1927 |
123 anos |
3 bilhão |
1960 |
33 anos |
4 bilhão |
1974 |
14 anos |
5 bilhão |
1987 |
13 anos |
Estimativa
de Crescimento da População Mundial |
População |
Ano |
Tempo provável entre
uma marca e outra |
6 bilhões |
1999 |
12 anos |
7 bilhões |
2013 |
14 anos |
8 bilhões |
2028 |
15 anos |
9 bilhões |
2054 |
26 anos |
Fonte:
Divisão de População da ONU, Prospectos sobre População Mundial:
Revisão de 1998 |
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O crescimento populacional
de hoje não tem precedentes. Se a humanidade tivesse procriado
sempre com tamanho afinco (1,33% ao ano), ela teria surgido apenas seis
séculos antes de Cristo, calcula Joel Cohen, do Laboratório
de Populações das universidades Rockefeller e Columbia (EUA).
Thomas Robert Malthus (1766-1834) deve estar dando voltas na tumba. Há
201 anos, escreveu Um Ensaio sobre o Princípio da População.
O livro abriu um dos debates mais perenes de todos os tempos: há
limites, afinal, para a população que a Terra pode alimentar?
Malthus não tinha dúvida de que a fronteira existia e seria
ultrapassada, pois a população tende a crescer mais rápido
que a produção de comida: O poder da população
é indefinidamente maior que o poder da terra de produzir subsistência
para o homem.
Como a paixão entre os sexos é necessária,
segundo Malthus a população teria de ser corrigida de tempos
em tempos por meio de fome, miséria e guerra. Como um vírus,
a idéia foi capaz de sobreviver até o mundo de hoje, em
que as taxas de fertilidade caem e cresce a produção de
alimentos.
A partir de 1965-70, a taxa de crescimento populacional deixou de subir.
A população continua a aumentar, porém mais devagar.
Só na última revisão (dezembro de 1998), a ONU retirou
meio bilhão de pessoas do que era projetado para 2050 (agora, 8,9
bilhões).
Há, no entanto, cerca de 1 bilhão de pessoas na idade de
procriar. Isso garante um impulso que demógrafos chamam de momentum,
tomando da física o conceito de quantidade de movimento.
CAPACIDADE DE SUPORTE
Para intuir a atualidade de Malthus, basta substituir comida
por recursos naturais, a partir dos anos 60. Até mesmo
um termo tão recente quanto capacidade de suporte (de
populações por ecossistemas), gêmeo do desenvolvimento
sustentável dos anos 90, soa obviamente malthusiano.
Também malthusiano, o biólogo Paul Ehrlich escreveu A
Bomba da População, em 1968. Essa bíblia do
alarmismo vendeu 9 milhões de cópias.
Pessimista provou-se, ainda, Os Limites para o Crescimento,
estudo feito em 1972 por Dennis e Donella Meadows para o Clube de Roma.
Seus modelos matemáticos em computador, grande inovação
na época, regurgitaram profecias catastróficas para o próximo
século. A explosão populacional levaria necessariamente
a um colapso de recursos naturais.
Tão ou mais velho que o pessimismo é seu contrário.
O próprio Malthus escreveu para polemizar com os otimistas de seu
tempo, como Marie-Jean-Antoine-Nicolas Caritat, o marquês de Condorcet
(1743-1794).
O economista Julian Simon propôs uma aposta a Paul Ehrlich em 1980:
uma cesta com cinco metais da escolha de Ehrlich, no valor de US$ 1 mil,
estaria custando menos em dez anos (sinal de que a escassez prevista não
ocorreria). Quem errasse pagaria o valor da variação nos
preços. Eles caíram e Ehrlich fez um cheque de US$ 567,07.
Simon morreu no final do ano passado, muito menos famoso do que Ehrlich.
Seus mais destacados seguidores seriam hoje os que apontam a biotecnologia
como a nova Revolução Verde.
Não é preciso ser malthusiano para perceber que transgênicos
são solução para um problema inexistente. A fome
já chegou, mas está restrita a focos de pobreza crônica,
como a África. É problema de distribuição,
não de volume.
A engenharia genética também não tem o poder de aumentar
o estoque físico de água doce do planeta, principal limitação
da agricultura. A irrigação consome 70% da água usada
pelo homem, que retira dos aquíferos (lençóis profundos)
mais do que a natureza repõe. Na Índia, por exemplo, isso
pode reduzir em até 25% a produção de grãos
nas próximas décadas, segundo a organização
Worldwatch Institute (EUA).
Outro problema que a tecnologia terá dificuldade para resolver
é o do efeito estufa (aquecimento global), potencializado pelo
gás carbônico (CO2) produzido com a queima de combustíveis
fósseis, sobretudo petróleo e carvão. Mesmo que ocorra
uma transição sem sobressaltos para uma matriz energética
baseada no gás natural, em 50 anos, ou para o trinômio sol/ventos/hidrogênio,
em 100, o CO2 já emitido vai continuar afetando o clima por muitas
décadas.
CONFLITO NORTE-SUL
Escala planetária e complexidade são as marcas características
dos debates internacionais sobre a relação entre desenvolvimento
econômico, crescimento populacional e recursos naturais.
Nos anos 90, proliferaram agências e conferências da ONU,
assim como ONGs especializadas em ambiente. Toda essa superestrutura burocrática
não foi capaz, ainda, de gerar muitos resultados concretos. O processo
de negociação tem emperrado no abismo entre padrões
de consumo do Norte (países ricos) e do Sul
(pobres).
A China, por exemplo, logo estará emitindo tanto CO2 quanto os
EUA, mas na conta per capita a distância é maior que entre
Pequim e Washington. Por isso não progride o Protocolo de Kyoto,
assinado há um ano e meio, que estipula redução de
gases-estufa.
Segundo Joel Cohen, 55, que lançou em 1995 o livro How Many
People Can the Earth Support? (Quantas Pessoas a Terra Pode
Sustentar?, W.W.Norton, US$ 14,95), a questão da equidade
é central para definir o máximo sustentável de população.
No histórico que traçou das estimativas desde 1679 (13,4
bilhões de pessoas), encontrou números disparatados, até
mesmo 1 trilhão (1978). Os valores mais frequentes ficam entre
4 bilhões e 16 bilhões.
Para Cohen, a questão é cultural e política. Envolve
valores e não cifras: Não posso adivinhar se os filhos
de meus filhos vão querer dirigir um automóvel, ou ter iate,
afirmou à Folha.
Se todos tiverem uma dieta norte-americana, só se consegue
alimentar um terço da população atual, disse
Paul Ehrlich, 67, em entrevista por telefone. Para ele, o melhor para
a Terra seria entre 1 bilhão e 2 bilhões de habitantes.
Cohen lembra que há cem anos se dizia que os EUA não poderiam
ter 200 milhões de habitantes, pois as ruas seriam cobertas com
esterco de cavalos. A tecnologia evoluiu para carros, mas o problema agora
é o esterco dos carros no ar.
Ele recusa definir-se como otimista ou pessimista: Quando eu atravesso
a Quinta Avenida, não sou nem otimista nem pessimista. Se fosse
otimista, fecharia os olhos e atravessaria _seria morto. Se pessimista,
ficaria com medo até de tentar atravessar. O que faço é
olhar para o trânsito, para o semáforo, em todas as direções,
e, com muito cuidado, tento chegar do outro lado da rua.
No livro, ele indica uma cidade para ser olhada com muito cuidado: São
Paulo.
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