São Paulo, Sexta-feira, 2 de Julho de 1999




AGRICULTURA

Irrigação pressiona as reservas

da Reportagem Local


Os cerca de 500 mil habitantes de Ribeirão Preto (319 km ao norte de São Paulo) são abastecidos com água de um dos principais mananciais da América do Sul, o aquífero Botucatu, mas um de seus pontos de afloramento, na cidade, corre o risco de contaminação por herbicidas, devido à cultura da cana.
O aquífero (reservatório de água subterrânea) se espalha por 1,2 milhão de km2 em sete Estados brasileiros e abrange ainda a Argentina, o Uruguai e o Paraguai.
Desde 1994, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) Meio Ambiente, de Jaguariúna (SP), analisa sua contaminação. Desde então, foi encontrado, em média, 0,03 ppb (partes por bilhão, ou seja, concentração de 1 litro por bilhão de litros) de herbicidas, índice considerado baixo, mas preocupante (o limite recomendado é de 0,1 ppb).
“Se continuar assim, em cinco anos será possível chegar a níveis críticos, colocando em risco o abastecimento”, diz o geólogo da Embrapa Marco Antonio Ferreira Gomes. Preocupada com o resultado, desde janeiro a empresa estuda os locais de recarga do aquífero Botucatu numa área de 100 mil km2 para analisar a contaminação causada pela agricultura em sete Estados (SP, PR, SC, RS, MT, MS e GO).
Os fertilizantes e agrotóxicos podem modificar drasticamente as características dos corpos d’água. No Brasil, praticamente todas as regiões agrícolas geram impactos em aquíferos, rios e mananciais.
Já se sabe, por exemplo, que sistemas de irrigação, como o por inundação, usado no cultivo de arroz no Rio Grande do Sul, pode provocar contaminações por herbicidas. Sua forma de aplicação, às vezes por pulverização aérea, pode levar o veneno para outras áreas.
Com a expansão da agricultura, o problema é compatibilizar os diferentes usos da água. Hoje, 70% da água retirada vai para a irrigação. E essa parcela tende a crescer. Estima-se que mais da metade dos alimentos do mundo são produzidos com irrigação, que, em média, dobra a produtividade das lavouras.
A agricultura não apenas prejudica a qualidade da água, mas consome mais desse recurso do que qualquer outro segmento em quase todos os países. Alguns exemplos: Índia (93%), Espanha (62%) e México (86%). No Brasil, responde por 59% de todo o consumo.
Em algumas regiões do Nordeste, onde a escassez é crônica, essa demanda afeta o consumo doméstico. E a população poderá sofrer ainda mais com a falta de água nos próximos cinco anos, devido à expansão agrícola. “Não se sabe ao certo quanto tempo irá durar a água retirada de poços para abastecer a agricultura”, diz Aderaldo de Souza Silva, especialista em irrigação da Embrapa.
Uma medida para enfrentar a escassez é a reutilização de águas com resíduos para a agricultura. Em países do Oriente Médio e da Europa, a água é separada do esgoto, tratada e reaplicada no campo e na indústria, medida que também está sendo adotada em São Paulo. Em média, essa água custa até 25% menos que a tratada para uso doméstico. (RO)



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