MAM carioca reabre na pandemia com maior mostra de esculturas de sua história

Mostra revisita criticamente acervo de 16 mil obras do museu para promover diálogos entre elas

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Rio de Janeiro

No fim de março, o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, o MAM do Rio, inaugurava num mesmo dia duas exposições retrospectivas. Mas o agravamento da pandemia na capital fluminense foi implacável —forçou a instituição a fechar as portas só dois dias depois da abertura.

Agora, passados quase 50 dias, o museu reabre, tirando do estado de hibernação as mostras individuais de Fayga Ostrower e de Marcos Chaves, mas também inaugurando uma terceira exposição, ainda maior. “Estado Bruto” traz 126 esculturas e objetos do acervo do MAM, de 106 artistas de épocas e países variados, formando a maior mostra do gênero já abrigada ali.

Organizada por Beatriz Lemos e com direção artística de Keyna Eleison e Pablo Lafuente, trio que desde o fim de 2020 marca uma nova gestão no museu, a exposição é o resultado de um trabalho de redescoberta crítica do acervo do museu carioca, que abarca quase 16 mil obras.

“Temos uma proposta de percepção do que há no acervo e do que podemos fazer com ele. A ideia é promover exposições que não durem muito tempo, para haver uma dinâmica de troca das obras e que o público saiba o que o museu tem”, diz Eleison.

Com 24 esculturas nunca exibidas antes, a mostra propõe refletir sobre temas correlatos às reservas técnicas dos museus, incluindo o acúmulo patrimonial e o colecionismo. “A gente tem pensado em como trabalhar um acervo institucional de modo a não recair sempre em uma narrativa estagnada, com os mesmos nomes. E também em refletir sobre o esquecimento de algumas obras”, afirma Lemos.

Nesse contexto reflexivo, estabelecer interlocuções inesperadas entre determinadas peças surge como um ponto central do conceito da exposição.

“A ideia não é só dizer ‘olhem, a gente tem de tudo’. Existe um histórico forte de exposições de trabalhos de escultores homens. Então a gente procurou obras de muitas mulheres para conversar com as deles. Um diálogo entre esculturas que não foram pensadas para conversar entre si”, diz Eleison.

Entre as obras femininas à mostra, a diretora artística não esconde certa afeição especial por “Mó”, de 1984, de Celeida Tostes, que faz praticamente sua estreia em exposições –só havia sido exposta uma única outra vez–, e “Mamãe”, de 1997, de Cristina Salgado, peça com uma enigmática estrutura no topo que, dependendo do ângulo por onde se observa, pode revelar uma figura indecifrável de forma oval ou a imagem de um seio.

“A gente está ainda se relacionando com o acervo, conhecendo mais, criando conexões com essas esculturas. São pensadas como corpos feminilizados, inclusive de muitos artistas que não são do Sudeste. Toda a relação hegemônica que a gente já sabe que existe, já consagrada, a gente colocou para conversar com uma não hegemônica”, afirma Eleison.

No elenco mais canônico, há mestres da escultura mundial, como o francês Auguste Rodin, o suíço Alberto Giacometti e o romeno Constantin Brancusi, além de expoentes brasileiros, como Amilcar de Castro, Nuno Ramos e Cildo Meireles.

As etiquetas com o título das obras trazem uma curiosidade —o número de vezes que já foram expostas naquele espaço. “Isso fala muito sobre as escolhas curatoriais anteriores”, comenta Lemos.

Paralelamente, há também um diálogo das obras com a própria fisicalidade do museu e seus jardins. “A questão da luz é estrutural no MAM. É um prédio que exige que a gente trabalhe com as mudanças da luz, tanto ao longo do ano quanto ao longo do dia”, conta Eleison, explicitando uma das mais notáveis características do edifício projetado por Affonso Eduardo Reidy, em pleno Aterro do Flamengo –sua lateral devassada, que permite a entrada de luz natural.

A amplitude espacial do museu, aliás, é vantajosa no contexto da pandemia. Para além do obediência aos protocolos sanitários anti-Covid, a exposição se vale ainda da fisicalidade do prédio para garantir certa tranquilidade ao visitante. “Temos os espaços amplos. Em termos de recebimento de público, trabalhamos com essa confiança de que aqui pode ser um lugar seguro”, diz a curadora.

Estado Bruto

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