Descrição de chapéu The New York Times

Como Blackpink desafia os limites do K-pop sem tirar o olho do mercado americano

Em paralelo, outros grupos como NewJeans e Girls Generation apostam em onda retrô e apontam para nova era no gênero

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Jon Caramanica
The New York Times

Ao mesmo tempo em que ampliava suas ambições globais no final dos anos 2000 e no início da década seguinte, o K-pop também aumentava seu apetite, tanto que virou o cenário de música pop mais faminto do planeta.

Ele devorava especialmente o pop, hip-hop, R&B e música dance americanos, transmutando tudo em uma fantasia maximalista e criando uma estética de excesso absurdista que, por algum tempo, virou a abordagem mais progressista e mais popular do mundo.

Retrato do grupo de k-pop Blackpink
Foto do grupo de k-pop Blackpink - Divulgação

Bandas como o girl group 2NE1, da YG Entertainment, ganharam espaço crescente nesse ambiente —ao lado da boy band compatriota BigBang, também da YG— e ajudaram a preparar o cenário para o gênero conquistar o mundo. Era uma música —em grande parte idealizada pelo produtor Teddy Park— curiosa, caótica e cheia de autoconfiança. Outros cenários pop viravam fumaça na esteira dela.

Com o sucesso inicial de singles como "Whistle", "Ddu-Du Ddu-Du" e "How You Like That", o Blackpink, o girl group da geração seguinte da YG que estreou em 2016, parecia estar preparado para carregar essa tocha adiante.

Mas em 2020, quando lançou seu primeiro álbum completo, "The Album", sua música já se tornara de alguma maneira ao mesmo tempo mais bombástica e mais frágil que a de suas predecessoras, e o modelo já estava deixando entrever seus pontos fracos.

"Born Pink", o segundo álbum completo do Blackpink, é na teoria uma oportunidade para inovar, tanto para a banda quanto para o próprio gênero. Aqui encontramos o grupo formado por Jennie, Jisoo, Lisa e Rosé numa encruzilhada, tendo que decidir se continua no caminho de sua colisão sônica de alta energia, se abraça plenamente o mercado de língua inglesa ou se desmonta sua própria casa.

O primeiro single, "Pink Venom", é Blackpink clássico —ou seja, pandemônio costurado com tanta perfeição que alcança sua própria lógica interna, cafeinada e cansativa. O canto de Jisoo é tão intenso e austero quanto sempre, e o rap de Jennie é flexível e pontilhado de pequenas ornamentações inteligentes.

"Pink Venom" soa como uma canção temática, mais um jingle de divulgação do grupo que uma declaração musical pura. E é um alívio, em certa medida, descobrir que o álbum não exagera nessa abordagem, que já virou padrão para o gênero.

"Born Pink" é às vezes eletrizante e às vezes repetitivo. Nos momentos em que o grupo adentra território novo —ou, para ser mais exato, se desprende do terreno já familiar—, não provoca grande impacto. "The Happiest Girl" é uma balada com piano, um melodrama frágil, e "Yeah Yeah Yeah" é um simulacro alegre do pop dos anos 1980 que também traz referências ao Weeknd e Daft Punk.

Quatro das canções são inteiramente em inglês, incluindo "Hard to Love", cantada por Rosé. O Blackpink é muito mais convincente nesse idioma que o BTS. E há palavrões —não é algo inteiramente novo para o grupo, mas não deixa de ser um gesto forte.

A produção densa ainda é um elemento central da missão e do posicionamento do grupo, especialmente nas canções nas quais Park trabalhou. E em todo o álbum há camadas sônicas intensas, com toques de gangsta funk, samples de música clássica de cordas e referências tão escondidas que é como se não estivessem presentes. "Still Tippin’" em "Typa Girl"? "Mighty D-Block (2 Guns Up)" em "Pink Venom"? "My Baby Takes the Morning Train" em "Yeah Yeah Yeah"? Quem sabe?

A variedade que compõe o Blackpink, ou o 2NE1 antes dele, foi pelo menos em parte uma reação a uma onda anterior de girl groups que ajudaram a definir as ambições e a escala do K-pop, mas cujos flertes com influências ocidentais foram mais passageiros.

Em agosto do ano passado, um dos grupos mais importantes daquela era, Girls’ Generation, lançou um álbum novo, "Forever 1", 15 anos após sua estreia. Mais de uma década atrás o Girls’ Generation foi um dos primeiros grupos de K-pop, senão o primeiro, a lançar um álbum por um grande selo americano. Mas suas ambições não são tão incansáveis quanto as do Blackpink.

"Forever 1" é um retorno agradável a uma fase menos agitada nesse gênero. A produção é melíflua e alegre, o canto é doce e descomplicado. O álbum recende à era em que o K-pop ainda estava definindo sua própria gramática, antes de devorar a de todos os outros. Há relances leves de hip-hop e new jack swing, como em "Seventeen" e "You Better Run".

Mas é principalmente música classicista —o puro brilho do piano em "Closer", a leve ousadia de "Summer Night". Ela postula a música não como assassina do mundo, mas como uma pausa para descansar e como sonho.

Por mais que "Forever 1" seja convincente, não parece algo pontual, e sim mais como uma lembrança do passado reencontrada. Isso fica especialmente claro quando ela é contextualizada não apenas ao lado do Blackpink, mas também da onda interessante de girl groups que chegou na esteira do grupo, identificando os contornos de seu sucesso e partindo deles para ir mais além.

A girl band Aespa, que tem quatro integrantes humanas e quatro avatares virtuais
A girl band Aespa, que tem quatro integrantes humanas e quatro avatares virtuais - SM ENTERTAINMENT VIA BBC

Entre esses grupos, o mais cheio de vitalidade nos últimos anos tem sido o Aespa, e seu EP recente, "Girls", é um dos lançamentos do K-pop mais impressionantes do ano, precisamente por sua maestria de dois registros —o complexo e o elegante.

Isso é capturado em seu trecho final —"Black Mamba", um stomp (ritmo de jazz) que encarna o pop bombástico do início dos anos 2000, a balada reminiscente "Forever" e depois "Dreams Come True", que parece remeter aos primeiros encontros do

K-pop com o R&B

Contrastando com isso, o Itzy se destaca por ser decididamente peculiar. Seu EP recente "Checkmate" continua no registro do caos alegre do grupo, com vocais intensamente alertas e jubilosos e uma produção que parece estar borbulhando em tempo real. "365" lembra a música industrial ou de clubes de vanguarda, e "Racer" soa como uma música de parque da Disney que passou por uma fábrica de glitter.

Finalmente há o grupo que talvez seja o mais promissor: NewJeans, que também lançou EP de estreia autointitulado em agosto, que é absolutamente cool e sofisticado. A produção é sensual e controlada, e o canto é ao mesmo tempo lustroso e calmo.

À primeira vista, o NewJeans parece remeter a um momento anterior, não frenético, pré-2NE1 do K-pop. Mas suas referências submersas são profundamente modernas, especialmente o desvio para música de clubes de Nova Jersey em "Cookie".

Mas o NewJeans usa seus pontos de referência contemporâneos a serviço de uma ideia retrô. Ou, talvez seja esse o caso, o grupo já aprendeu todas as lições que o mundo tem a ensinar e as está levando de volta para casa.

Tradução Clara Allain

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