Bienal de São Paulo elege curador camaronês para liderar edição de 2025

Bonaventure Soh Bejeng Ndikung, diretor de museu em Berlim, foi escalado para organizar a próxima edição da mostra

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São Paulo

Bonaventure Soh Bejeng Ndikung, diretor do Haus der Kulturen der Welt, em Berlim, será o curador geral da 36ª Bienal de São Paulo, que deve acontecer no segundo semestre de 2025.

O curador da 36ª Bienal de São Paulo, Bonaventure Soh Bejeng Ndikung
O curador da 36ª Bienal de São Paulo, Bonaventure Soh Bejeng Ndikung - Divulgação

Em entrevista por videochama, Ndikung disse que a edição vai representar a multiplicidade do mundo e falar das urgências de se viver nos dias atuais, em diálogo com a última mostra que, no ano passado, fez história ao ser composta, majoritariamente, por artistas não brancos —que tentavam refletir, por meio de suas obras, sobre as possibilidades para uma realidade melhor.

"A maior parte das pessoas no mundo não é branca. Não deveria ser uma surpresa", afirma, sobre o elenco da última Bienal. A próxima edição, ele diz, não vai servir só a "discursos que estão em alta no momento", mas pensará "histórias mais longas".

À frente do museu referência para a arte contemporânea não europeia na capital alemã, Ndikung tem uma trajetória incomum. Nascido em Camarões, ele se mudou para Berlim em 1997, aos 20 anos, para estudar biotecnologia. A decisão de seguir carreira no mundo da arte veio depois.

"Sempre me interessei por ciência e arte. Ainda me interesso por física quântica, em como a matéria se acumula em buracos negros e como isso leva a transformação, a emanação de luz. Isso tem impacto na curadoria que eu faço", reflete. A representação de nuances e transformações da realidade através da arte são, ele diz, temas chave dos trabalhos que escolhe para ocuparem espaços expositivos.

A relação de Ndikung com o Brasil é de longa data e começou quando o curador se interessou pelo conceito de quilombismo criado por Abdias do Nascimento. "Os quilombos, criados pelos africanos, se tornaram um refúgio não só para eles, mas também para indígenas, judeus, árabes e outras pessoas às margens da sociedade. Foram a primeira estrutura democrática das Américas", diz.

O quilombismo foi tema da primeira exposição no Haus der Kulturen der Welt sob sua direção, no ano passado. "Um lugar chamado de ‘casa das culturas’ [tradução de Haus der Kulturen] deveria falar sobre esses espaços de liberação e de emancipação."

O anúncio do nome Ndikung para liderar a 36ª Bienal de São Paulo veio poucas antes semanas da abertura da Bienal de Veneza, que costuma dar as cartas no circuito mundial das artes visuais.

Se a última edição, em 2022, imaginou o fim da humanidade como a conhecemos frente ao domínio das máquinas, a mostra com abertura marcada para meados deste mês promete um viés parecido com o da Bienal de São Paulo. Eleito o curador da mostra de arte mais importante do mundo, o brasileiro Adriano Pedrosa disse que artistas estrangeiros e "outsiders" serão os protagonistas da exposição italiana.

Ndikung comemora que Veneza esteja aceitando a "multiplicidade do mundo", mas não gosta do termo "outsiders". "Quem são essas pessoas? E quem são os ‘insiders’? O mais interessante é ver práticas artísticas diferentes. Os velhos posicionamentos sobre quais são os centros do mundo não servem mais", afirma.

"Algumas das obras de arte mais interessantes estão sendo produzidas no Brasil, no Congo, na Coreia. Claro, coisas interessantes são produzidas nos Estados Unidos e na Europa, mas esses outros países têm mais urgência sobre coisas importantes que estão acontecendo", ele acrescenta.

A discussão, porém, deve ir além da onda decolonial, termo usado à exaustão em exposições de arte para categorizar obras de artistas originados de países do sul global —definição guarda-chuva popular em museus e galerias para designar nações emergentes. "A noção de decolonialidade foi banalizada", critica Ndikung. "É tudo e nada ao mesmo tempo, mas esse conceito deveria ser levado a sério."

Por isso, a possibilidade de retratar realidades pungentes de formas variadas e inovadoras será um dos focos da próxima Bienal de São Paulo, adianta Ndikung. "A poesia faz isso de forma sofisticada, usando poucas palavras para descrever o mundo. É isso que a arte deve fazer.

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