Corrida pelo hambúrguer vegetal usa biotecnologia em busca da imitação perfeita

Com lançamento de ações e financiamento de fundos, empresas disputam público interessado em comida sustentável

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São Paulo

Com um público cada vez mais ávido por comida sustentável, motivado pela crescente discussão do impacto ambiental da produção de carne, um mercado multimilionário toma corpo entre as startups de tecnologia, com a bênção dos fundos de investimento: o hambúrguer vegetal.

O “plant-based”, termo mais moderno e empreendedor para a comida vegetariana, tem demanda certa. Segundo a consultoria Euromonitor, o mercado de comida industrializada saudável cresce a uma taxa de 1,8% globalmente, ante 1,5% da regular.

De acordo com o mesmo estudo, o crescimento anual de produtos rotulados como “livres de” foi de 5% na América Latina, entre 2013 e 2018. No norte do continente, a taxa chega aos 10%.

Mas o novo público, de onívoros preocupados, exige mais do que os vegetarianos por opção: precisa de uma troca justa, sem perder o prazer do sabor e textura da carne, e aí entra em cena a tecnologia.

Operários manipulam embalagens com hambúrgueres vermelhos, sobre esteira com diversas outras embalagens
Linha de produção da fábrica de hambúrguer vegetal da Impossible Foods, em Oakland, nos EUA - Divulgação/Impossible Foods

Para desenvolver seu hambúrguer, a Impossible Foods, avaliada em US$ 2 bilhões (R$ 8 bilhões), lançou mão de um time de cientistas que desenvolveu uma substância similar à hemoglobina presente no sangue dos animais, que, segundo a empresa, é responsável pelo sabor e textura da carne.

O processo usa engenharia genética para inserir DNA da raiz da soja em uma levedura transgênica que gera a chamada leghemoglobina. O produto tem tido boa recepção nos EUA. Foi de 3.000 para 40 mil restaurantes em um ano, incluindo em Hong Kong e Macau.

Com três rodadas de investimento, captou US$ 750 milhões de empresas como Google e UBS e até de Bill Gates, cofundador da Microsoft.

Sua principal concorrente nos EUA é a Beyond Meat. Com uma técnica parecida, a empresa também produz linguiças e carne moída e foi mais ousada no mercado.

Após captar US$ 120 milhões em sete rodadas de investimentos —contando com a participação até da Tyson Food, maior produtora de carne dos EUA—, a empresa fez a oferta pública de suas ações em maio.

Tornou um unicórnio logo no primeiro dia, sendo avaliada em mais de US$ 3 bilhões. As ações, negociadas a US$ 65 na abertura, já chegaram a atingir US$ 234.

No Brasil, a Fazenda Futuro, empreitada dos fundadores da marca de sucos Do Bem, tem conseguido escalar sua operação com hambúrgueres que simulam carne animal e até sangram —na verdade, é suco de beterraba.

O Futuro Burguer 1.0, lançado em maio, é feito à base de proteína de grão de bico, soja e ervilha de forma mais natural, sem envolver modificação genética.

A empresa produz 150 toneladas de carne vegetal por mês. Segundo o fundador, Marcos Leta, a produção duplica mensalmente. O produto já pode ser encontrado em 3.000 hamburguerias e em redes de supermercados como Carrefour e Pão de Açúcar. 

“Nosso público é todo o mundo, mas, pela textura e sabor, o produto tem agradado mais aos onívoros. O vegano já está mais distante dessa experiência com carne.”

A versão 2.0 do Futuro Burguer deve ser lançada até o fim de setembro, com a receita aprimorada após feedback do consumidor.

A americana Impossible Foods tem como missão tornar a carne animal obsoleta até 2035. Leta é mais conservador: “Um dia, provavelmente, vamos chegar a um ponto em que não vai ser possível distinguir uma carne da outra”.

A indústria da carne brasileira também já fez seus movimentos nesse mercado. 

A Marfrig anunciou, no dia 6, o lançamento de um hambúrguer vegetal, que deve chegar ao mercado até o fim do ano. O produto será vendido inicialmente no Burger King.

A JBS, maior produtora de proteína animal do mundo, lançou em maio, pela subsidiária Seara, o Incrível Burger, feito à base de soja e beterraba.

Após conquista da carne, ovo sintético é novo horizonte

Em paralelo à corrida dos búrguers, a busca pelo ovo sintético, o não ovo, começa a despontar no planeta.

Um dos destaques é a chilena NotCo. A startup já passou por duas rodadas de investimentos, captando US$ 33 milhões no total, com a participação do fundo de investimento de Jeff Bezos, fundador da Amazon, e do fundo Kaszek, que já financiou empreitadas como Mercado Livre e Nubank.

Para desenvolver seus produtos, a empresa investe em biotecnologia e big data. 

Um grupo de cientistas faz uma análise laboratorial de uma série de vegetais e coloca os dados num algoritmo, apelidado de Giuseppe, que é capaz de indicar quais são os ingredientes corretos para atingir determinada textura ou sabor.

O carro-chefe é a maionese Not Mayo —o Chile é o terceiro maior consumidor de maionese per capita do mundo—, feita com grão de bico e temperos. No Brasil, é vendida na rede do Grupo Pão de Açúcar.

“Nosso foco era encontrar uma receita que o consumidor não conseguiria distinguir de uma receita convencional. 

Existem várias opções vegetais no mercado, mas o sabor era bem diferente”, afirma Luísa Marchiori, diretora de marketing para América Latina.

A NotCo acaba de lançar no Chile um leite vegetal à base de repolho e abacaxi e uma linha de sorvetes à base de ervilha. Os produtos devem chegar ao Brasil até o fim do ano.

Concorrente no mercado americano, a Just aposta no ovo líquido. O Just Egg é um análogo de ovos mexidos, feito à base de feijão moyashi e cúrcuma. A marca também conta com uma não maionese à base de ervilha amarela.

No Brasil, a Mantiqueira, maior produtora de ovos do país, lançou recentemente o N.Ovo, substituto de ovo em pó, à base de ervilha e linhaça.

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