Equipe econômica teme que tensão com o Congresso afete as reformas

Contágio no PIB com a chegada do coronavírus ao país também preocupa time de Paulo Guedes

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Brasília

A equipe econômica teme que as tensões entre o presidente Jair Bolsonaro e o Congresso Nacional possam afetar o ritmo de avanço das reformas. Apesar disso, a visão é que as pautas da área, por ora, estão blindadas.

O receio é manifestado no momento em que o coronavírus chega ao Brasil. A nova doença eleva as preocupações sobre possíveis impactos na economia do país.

O mais recente episódio de embate ocorreu nesta semana no WhatsApp do presidente. Bolsonaro encaminhou a amigos vídeo que estimula a população a ir às ruas defendê-lo. 

Presidente Jair Bolsonaro e o ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno
Presidente Jair Bolsonaro e o ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno - Adriano Machado/Reuters

A iniciativa, tomada enquanto ativistas preparam manifestações em apoio ao atual governo e com críticas ao Congresso, gerou reação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

A visão na equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) é que atritos como esse têm potencial para atrasar o ritmo de reformas. As propostas dependem do empenho dos congressistas. 

Guedes tem uma série de medidas de interesse na lista. Entre elas as PECs (propostas de emenda à Constituição) de ajuste fiscal, as mudanças de regras no serviço público, as alterações no sistema tributário, a agenda de privatizações e a abertura do mercado de saneamento.

O compartilhamento do vídeo por Bolsonaro teve como ponto central um assunto envolvendo economia. A pauta de manifestações é pró-governo e contra o Congresso.

A briga entre Executivo e Legislativo foi causada pelo embate sobre R$ 30 bilhões do chamado Orçamento impositivo. Congressistas querem ter controle sobre esse montante de recursos.

Na semana passada, o ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno, foi flagrado dizendo que o governo estava sendo chantageado pelo Congresso

Tanto Maia como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), repudiaram a fala de Heleno. Nesta quarta (26), o senador não comentou o compartilhamento de vídeo por Bolsonaro.

A imagem de Heleno passou a ser usada em mensagens de convocação para os atos do dia 15 de março. 
Após o vazamento do áudio em que Heleno diz “foda-se” ao tratar do Congresso, Guedes classificou a disputa como natural. Ele, porém, também acabou fazendo críticas a deputados e senadores. 

“É normal que o Congresso queira entrar no Orçamento, mas espera aí. Não precisa pisar no nosso pé”, disse, na quinta-feira (20), ao lado de Bolsonaro e ministros em evento no Palácio do Planalto.

A solução apresentada pelo ministro para a disputa orçamentária foi justamente avançar com as reformas. Ele defendeu a PEC do Pacto Federativo, que ajusta gastos obrigatórios e abre espaço para outras despesas. 

Sob pressão no governo para apresentar crescimento, o ministro pediu que o país persista na agenda das reformas para que a economia possa avançar 2% neste ano. 

“Por isso que as reformas têm de seguir. As reformas estão nos dando essa folga, esse horizonte”, disse o titular da área econômica na ocasião.

Além da PEC do Pacto Federativo citada por Guedes, uma das prioridades é a PEC Emergencial. Ela vai aciona medidas de ajuste de despesas em caso de situação fiscal crítica. 

Estão incluídos no texto itens como a suspensão de reajustes para servidores e a permissão para reduzir em 25% a jornada dos funcionários públicos com redução proporcional dos vencimentos, além da suspensão de concursos.

Interlocutores de Bolsonaro tentam costurar acordo com líderes partidários para que uma parte dos recursos volte para as mãos de ministros, em vez de ficar sob controle de congressistas.

Parte da equipe da Economia afirma que essas brigas têm causado muito ruído. Até agora, contudo, não chegam a interferir em assuntos da agenda de Guedes. 

As medidas estariam blindadas principalmente pelo perfil do Congresso e especificamente de Maia, visto como reformista. Guedes vem ressaltando que tem apoio de boa parte do Congresso.

Há, porém, entre congressistas a visão de que a beligerância entre os Poderes pode atrasar a agenda econômica. A avaliação é que o ritmo das reformas é, neste governo, dado pelo próprio Congresso.

Deputados não esperam que Bolsonaro se retrate abertamente. No entanto, a expectativa é que o governo adote uma posição de apaziguar o embate para que a tensão entre os Poderes não atrapalhe a agenda econômica, cujo principal fiador é Maia.

“Não é a primeira vez que tem uma crítica desse nível do presidente. Isso pode colocar em jogo pautas necessárias para que o Brasil avance”, afirmou o líder do PTB, Pedro Lucas Fernandes (MA).

“Qual será a reação do Congresso para receber uma proposta do governo com esse clima? Devemos esperar passar a semana para que a gente consiga retomar a agenda para o Brasil”, disse o líder do DEM, Efraim Filho (PB).

O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), minimizou o episódio do vídeo.
“Na próxima semana retomaremos as agendas, e acredito que não teremos problemas entre o Executivo e o Legislativo para aprovar a reforma tributária, análise de PECs e até da reforma administrativa.”

Ciente das dificuldades, a equipe de Guedes já havia implementado no começo deste mês um esforço extra para negociar com congressistas a flexibilização de alguns pontos das já propostas enviadas.

O movimento ocorre também porque o calendário legislativo neste ano é mais apertado em razão das eleições municipais. Além disso, o governo não tem uma base fiel no Congresso.

As avaliações da equipe com a agenda no Congresso ainda se somam aos temores com o novo coronavírus. Procurado, o time de Guedes afirmou que está monitorando o noticiário sobre o tema e a reação dos mercados. 

Há cerca de 20 dias, o secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, afirmou que o governo poderia reduzir as projeções para o PIB por causa do vírus caso a situação em relação ao contágio permanecesse ou avançasse. 

“Hoje, agora, não tem mudança. É 2,40% e fica do jeito que está. O que acontece é que, se essa situação se expandir, não só o alcance, mas a duração, aí tem de ser revisto”, disse à Folha no dia 6.

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