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Ricardo de Menezes Barboza

Alta do dólar e crescimento medíocre é combinação perigosa para o Brasil

Valorização da moeda americana tem efeito negativo sobre consumo e investimento

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Ricardo de Menezes Barboza

Sempre que algum conhecido vai para o exterior, a pergunta se repete: “devo comprar dólar agora ou esperar”? Nessas horas, juro que não gosto de ser economista. Nas poucas vezes que arrisquei uma previsão, me dei mal.

Mesmo envergonhado, confesso que não é isso que tira meu sono. O que realmente me intriga são as consequências das desvalorizações cambiais para o PIB do Brasil.  É disso que vamos tratar nesse artigo.

Como se sabe, a taxa de câmbio desvalorizou a beça em 2020. O preço do dólar saiu de R$ 4 para R$ 4,63 em um intervalo de pouco mais de dois meses, totalizando 16% de depreciação.

A maioria dos economistas diria que desvalorizações cambiais têm efeitos expansionistas no PIB, afinal as exportações líquidas tendem a se elevar. Mas é preciso qualificar esse ponto de vista.

Retrato de duas mãos de madeira; uma segura uma nota de dólar, outra de real
Valorização da moeda americana tem efeito negativo sobre consumo e investimento - Gabriel Cabral/Folhapress

Primeiro, porque o Brasil é o segundo país mais fechado do mundo, perdendo apenas para o Sudão, de modo que as exportações líquidas têm um peso relativamente pequeno no nosso PIB.

Segundo, porque há evidências de que nossas exportações líquidas reagem pouco às mudanças cambiais. No jargão, diz-se que a elasticidade-câmbio é baixa.

Terceiro, porque outros componentes da demanda agregada, como investimento e consumo, que têm um peso enorme no PIB, reagem negativamente às desvalorizações cambiais.

Quarto, porque há empresas endividadas em dólar e a depreciação cambial afeta negativamente seus balanços e sua capacidade de tomar crédito e produzir.

Quinto, porque muitas vezes a política monetária e as taxas longas de juros reagem aos efeitos da depreciação cambial, comprimindo ainda mais o investimento e o consumo.

Em suma, não é óbvio que depreciações cambiais sejam boas para o PIB, pelo menos no curto prazo (no longo prazo, o assunto é um pouco mais complicado).

Há boas razões para acreditar que depreciações cambiais sejam contracionistas no Brasil. Há evidência empírica amparando essa percepção.

A dificuldade de ser categórico decorre do fato de que é muito difícil identificar choques cambiais. Geralmente os movimentos do câmbio derivam de outros fatores. Além disso, cada episódio tem as suas particularidades.

O fato é que a economia brasileira tem se destacado por um desempenho econômico medíocre e, nesse contexto, uma baita depreciação cambial acaba de bater em nossa porta.

Se algum gestor da política econômica se preocupa com o PIB do Brasil (ou mesmo com um tal de “PIB privado”), esse assunto deveria ser muito bem mapeado.

Corre o risco de ninguém ir para a Disney. Não por falta de vontade ou por medo do coronavírus —tampouco porque o dólar está caro. Mas porque pode faltar renda mesmo.

Ricardo de Menezes Barboza

É mestre em macroeconomia pela PUC-RJ, professor colaborador do Instituto Coppead ( Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração) e economista do Grupo de Conjuntura Econômica da UFRJ

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