A LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), de maio de 2000, possui um mecanismo que permite suspender medidas de ajuste nas contas públicas, para que seja possível aumentar gastos, em caso de decretação de estado de calamidade pública, estado de defesa e estado de sítio, desde que reconhecido pelo Congresso Nacional.
Nesta terça-feira (17), o governo federal informou que solicitará ao Parlamento o reconhecimento do estado de calamidade pública, devido à “necessidade de elevação dos gastos públicos para proteger a saúde e os empregos dos brasileiros e da perspectiva de queda de arrecadação”. A medida tem o apoio dos presidentes da Câmara e do Senado.
No caso da União, o mecanismo dispensa o governo federal de obedecer o limite de déficit (diferença entre receita e despesa) previsto em lei para este ano, de R$ 124,1 bilhões.
Com isso, será possível manter ou até aumentar o nível de gastos, mesmo que haja queda nas receitas, como é esperado por conta da crise do coronavírus. Em uma situação de normalidade, a LRF obriga o governo a bloquear gastos em até 30 dias após o final de cada bimestre se houver expectativa de frustração de receita ou aumento de gastos.
No caso de estados e municípios, a decretação do estado de calamidade também permite suspender ajustes no endividamento e no gasto com pessoal quando esses estiverem acima do limite.
O aumento de despesas não contraria outra regra fiscal, o teto de gastos constitucional, desde que essa elevação seja feita por meio de mecanismo específico, como solicitação de crédito extraordinário junto ao Congresso.
A autorização para decretar estado de sítio ou defesa, também citados na LRF, só pode ser solicitada pelo presidente da República, ao Congresso Nacional. Nesses casos, são suspensas garantias constitucionais, como sigilo de comunicações, liberdade de imprensa e liberdade de reunião.
Fontes: Lei de Responsabilidade Fiscal e Agência Senado
Os estados e municípios também podem decretar estado de emergência, normalmente usado quando ocorre uma situação de desastre natural, ou calamidade, quando há comprometimento das funções do estado, como em casos de rebeliões em presídios ou greve de policiais militares.
Francisco Giardina, sócio do escritório Bichara Advogados, afirma que os estados de defesa ou de sítio se aplicam a situações extremas, de absoluta desestabilização do estado, algo que não se vê no cenário atual.
Ele afirma que o estado de calamidade e a legislação federal recente que permite restringir a circulação de pessoas são as que mais se aproximam do necessário no momento.
“A gente se viu diante de uma situação que não tem uma previsão legal muito nítida, muito clara para combater essa questão. Por isso, os governantes estão lançando mão dessas figuras, porque são as que mais se aproximam das que precisam ser adotadas para conter a propagação do vírus.”
Giardina afirma que há dúvidas jurídicas sobre normas estaduais que tratam do fechamento de estabelecimentos.
“Em tese, os estados podem adotar medidas excepcionais para conter o dano, ainda mais em caso de saúde pública e vigilância sanitária. Mas isso não pode ser um cheque em branco para que façam qualquer coisa que extrapole a sua função”, afirma.
“Eles podem declaram estado de calamidade pública ou emergência. O que a gente tem visto, contudo, é que há algumas situações que estão um pouco fugindo do escopo que justifica uma calamidade, por exemplo, hotéis proibidos de admitir novos hóspedes. As medidas que o estado pode adotar devem ser proporcionais para conter o dano.”
Estado de Sítio (artigos 137 a 141 da Constituição Federal)
Quem pode decretar: o presidente da República, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, mediante autorização do Congresso Nacional (maioria absoluta)
Em que situações:
- comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa e
- declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira
O que ele permite: O decreto do estado de sítio indicará sua duração e as garantias constitucionais que ficarão suspensas. Só poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas:
- obrigação de permanência em localidade determinada;
- detenção em edifício não destinado a acusados ou condenados por crimes comuns;
- restrições relativas à inviolabilidade da correspondência, ao sigilo das comunicações, à
- prestação de informações e à liberdade de imprensa, radiodifusão e televisão
- suspensão da liberdade de reunião;
- busca e apreensão em domicílio;
- intervenção nas empresas de serviços públicos;
- requisição de bens.
Prazo: 30 dias, prorrogáveis indefinitivamente, ou por todo o tempo que perdurar a guerra ou a agressão armada estrangeira.
O que acontece com o Congresso: Permanece em funcionamento até o término das medidas coercitivas. Uma comissão com cinco parlamentares da Mesa do Congresso deve acompanhar e fiscalizar a execução das medidas referentes ao estado de defesa e ao estado de sítio.
Estado de Defesa (art. 136 da Constituição Federal)
Quem pode decretar: Decretado o estado de defesa ou sua prorrogação, o presidente da República submete o ato ao Congresso Nacional, que decidirá por maioria absoluta
Objetivo: preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza.
O que ele permite: O decreto que instituir o estado de defesa determinará o tempo de sua duração, especificará as áreas a serem abrangidas e indicará as medidas coercitivas a vigorarem, dentre as seguintes:
- restrições aos direitos de reunião, ainda que exercida no seio das associações, sigilo de correspondência e sigilo de comunicação telegráfica e telefônica;
- ocupação e uso temporário de bens e serviços públicos, na hipótese de calamidade pública, respondendo a União pelos danos e custos decorrentes.
Prazo: O tempo de duração do estado de defesa não será superior a 30 dias, podendo ser prorrogado uma vez, por igual período.
O que acontece com o Congresso: Continua funcionando enquanto vigorar o estado de defesa.
Detenções: A prisão por crime contra o Estado será comunicada imediatamente ao juiz competente, que a relaxará, se não for legal. A prisão ou detenção de qualquer pessoa não poderá ser superior a dez dias, salvo quando autorizada pelo Poder Judiciário. É vedada a incomunicabilidade do preso.
Fontes: Constituição Federal, Lei de Responsabilidade Fiscal e Agência Senado
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