Paralisia do Congresso na análise do Orçamento põe em risco verba para educação

Sem votação e com amarras fiscais, governo não pode pedir autorização para liberar 73% da complementação do Fundeb

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Brasília

A volta das amarras fiscais neste ano e a falta de aprovação do Orçamento já colocam em risco repasses do governo federal para a educação.

Estados e municípios podem ficar sem receber a complementação do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) nos próximos meses.

A iminência de esgotamento dos recursos é mais crítica em algumas áreas do governo. Como mostrou a Folha nesta quarta-feira (27), o problema também pode deixar militares das Forças Armadas sem salário a partir de abril.

O caso do Fundeb é um dos mais delicados. Ao apresentar o Orçamento de 2021, em agosto do ano passado, o governo condicionou 73,4% da verba de complementação do fundo a uma autorização posterior do Congresso.

Sem esse aval, os recursos acabam entre abril e maio e os estados podem ficar sem os repasses.

Governos regionais com arrecadação insuficiente para garantir o valor mínimo nacional por aluno recebem mensalmente uma complementação de recursos da União. A verba é aplicada no ensino básico.

O problema deste ano está na chamada regra de ouro, norma que impede o governo de se endividar para pagar despesas correntes, como salários, Previdência e benefícios assistenciais.

Para não descumprir a regra, o governo precisa pedir autorização ao Congresso para emitir mais dívida do que o estipulado na lei e, assim, conseguir executar todo o seu Orçamento.

Neste ano, a equipe econômica estima que precisará emitir títulos da dívida pública no valor de R$ 453,7 bilhões acima do limite da regra de ouro.

O valor, quase um terço de todos os gastos previstos para 2021, apenas poderá ser liberado após autorização dos congressistas.

No entanto, não há previsão para votação das contas deste ano no Legislativo. O PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) tem rito complexo de tramitação, exige análise mais aprofundada e é alvo de disputa entre congressistas porque estabelece exatamente para onde serão direcionados os recursos do governo.

O conflito entre grupos políticos que brigam pelo comando da Câmara fez com que esse processo não avançasse no ano passado. A CMO (Comissão Mista de Orçamento), responsável por debater e formatar a proposta, nem sequer foi instalada.

Sem Orçamento aprovado, as contas operam em uma espécie de piloto automático: para cada mês, o governo pode gastar o equivalente a um doze avos do valor previsto para o ano em despesas não obrigatórias.

Ainda assim, se os recursos dentro da regra de ouro acabarem em alguma área, o governo não poderá seguir com os gastos.

O Tesouro Nacional confirmou o entrave legal gerado pela não aprovação do Orçamento. Segundo o órgão, será necessário aguardar toda a tramitação do PLOA para depois, já com a lei aprovada, fazer a solicitação de autorização para descumprir a regra de ouro.

"O pedido será feito por meio de Projeto de Lei de Crédito Suplementar a ser enviado ao Congresso Nacional após a publicação da LOA-2021", afirmou.

Portanto, não basta a Câmara e o Senado retomarem as atividades, o que está previsto para 3 de fevereiro. É preciso que deputados e senadores destravem e aprovem o projeto de Orçamento para, depois disso, o governo pedir o crédito, que também precisa passar por votações no Congresso.

De acordo com o Tesouro, não há prazo máximo ou determinação legal para que o Congresso analise a solicitação.

Para o Fundeb, estão liberados R$ 5,2 bilhões neste ano. Do total, R$ 3,35 bilhões já estão comprometidos até março.

Depois disso, o valor deverá subir e pressionar ainda mais as contas do governo. Isso porque o Congresso aprovou no ano passado um aumento dos repasses mensais para o Fundeb. O valor reajustado está previsto para ser liberado já a partir de março.

Outros R$ 14,4 bilhões já estão previstos para o fundo, mas só poderão ser transferidos após aprovação do Orçamento e aval do Legislativo para liberação de crédito extra.

Sem a autorização do Congresso, o governo não poderá se endividar para bancar inclusive parte das aposentadorias no ano.

O gasto estimado com benefícios previdenciários, o que inclui também auxílios em caso de doença, por exemplo, é de R$ 704,4 bilhões neste ano.

Desse total, R$ 272,1 bilhões —quase 40% do total— são dependentes do aval dos congressistas para que o governo busque recursos em títulos públicos.

No entanto, a margem para que a Previdência passe a usar o dinheiro do crédito extra é mais ampla que para o Fundeb e para os militares das Forças Armadas.

Sem o dinheiro suplementar, também haverá falta de recursos para o Censo (de R$ 2 bilhões, apenas R$ 200 mil já foram autorizados) além de contribuições para a ONU (Organização das Nações Unidas) e ações de proteção e defesa civil, cuja verba programada para o ano é mais de 80% dependente do aval ao descumprimento da regra de ouro.

Demais despesas com pessoal, Bolsa Família e subsídios também estão condicionadas à aprovação do Congresso, mas com verba suficiente pelo menos até o meio do ano.

Se o país estivesse sob as regras da calamidade pública, como em 2020, o governo teria liberdade para fazer todos esses gastos sem descumprir a legislação.

No entanto, com o objetivo de evitar uma nova explosão de gastos, o governo optou por não renovar a calamidade em 2021. Desse modo, passou a ser obrigado a obedecer todos os limites impostos pelas normas fiscais, inclusive a regra de ouro.

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