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União Europeia fecha cerco tributário a multinacionais

Bruxelas celebra aprovação de regras como grande avanço na repressão à evasão de impostos empresariais

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Mehreen Khan
Bruxelas | Financial Times

Negociadores da União Europeia chegaram a um acordo sobre regras que forçarão companhias multinacionais a revelar publicamente as jurisdições em que declaram lucros e pagam impostos, dentro do bloco, como parte da campanha europeia para combater a evasão de impostos corporativa.

Depois de anos de impasse nas negociações, governos da União Europeia e integrantes do Parlamento Europeu chegaram a um acordo sobre a chamada declaração de impostos país a país, que se aplicará a grandes companhias que operem no mercado unificado e em jurisdições de fora da União Europeia incluídas na lista de paraísos fiscais compilada por Bruxelas.

A medida foi celebrada como um grande avanço em termos de transparência fiscal e surge no momento em que as autoridades internacionais estão reforçando suas demandas por uma reforma nas regras de tributação de empresas. O G7, grupo que reúne países ricos, deve chegar a um acordo político ainda esta semana sobre a elevação da alíquota mínima de imposto empresarial a 15%.

“Estou certa de que esse acordo sobre declarações públicas de impostos em base de país a país será apenas o começo, para o avanço da justiça tributária e da transparência financeira na Europa”, disse Evelyn Regner, parlamentar europeia de centro-esquerda que foi uma das líderes das negociações no Parlamento Europeu.

Bandeira da União Europeia; bloco fecha acordo que forçará multinacionais a revelar lucros e impostos - 9.set.20/Folhapress

Sob as regras da União Europeia para declarações país a país, companhias com receitas mundiais de mais de 750 milhões de euros (R$ 4,6 bilhões) por dois anos consecutivos deverão revelar publicamente o quanto pagam de imposto em cada um dos 27 países membros da união, e em outras 19 jurisdições classificadas pela União Europeia como autoridades tributárias “não cooperativas”.

Elas incluem jurisdições que estão na lista de banidas, como Guam e as Ilhas Virgens Americanas, e paraísos fiscais da chamada “lista cinzenta”, entre os quais Panamá, Fiji e Samoa.

As grandes empresas já têm a obrigação de revelar seus lucros às autoridades tributárias internas da União Europeia, mas essa informação não ficava disponível para o público.

Políticos e ativistas tributários celebraram o acordo como primeiro passo para medir a escala da evasão de impostos praticada na União Europeia. Bruxelas estima que os governos da União Europeia percam entre 50 bilhões de euros (R$ 312 bilhões) e 70 bilhões de euros (R$ 437,1 bilhões) ao ano em arrecadação devido a manobras empresariais de evasão fiscal.

O acordo põe fim a uma batalha prolongada sobre regras inicialmente propostas por Bruxelas em 2013, mas dificultada pela oposição de diversos governos da União Europeia. As regras para as grandes multinacionais espelharão os requisitos de transparência impostos pela União Europeia aos bancos, em um acordo assinado como consequência da crise financeira.

Mas os detalhes do acordo de terça-feira (1º) foram recebidos negativamente por ativistas da justiça tributária e por parlamentares europeus de esquerda, por limitarem o escopo das declarações à União Europeia, sem abarcar outros territórios.

“O acordo deixa de fora mais de 80% dos países do planeta, entre os quais notórios paraísos fiscais como as Bahamas, Suíça e Ilhas Cayman, sobre os quais as companhias não terão de divulgar quaisquer informações”, disse Manon Aubry, parlamentar europeia e uma das líderes da bancada da Esquerda Europeia no Parlamento.

Tove Ryding, da organização ativista European Network on Debt and Development, disse que o acordo representava uma “oportunidade perdida” de forçar as grandes empresas a revelar todos os países nos quais elas tenham atividades tributáveis.

“Precisamos de dados separados sobre cada país onde uma companhia multinacional esteja presente; de outra forma as empresas poderão ocultar seus lucros em jurisdições onde não existam normas de transparência”, disse Ryding.

Sven Giegold, membro alemão do Parlamento Europeu pelo Partido Verde, disse que embora preferisse que tivessem sido criadas regras mundiais de transparência, o acordo de terça-feira ainda assim representava “um grande passo na direção da transparência completa”. Ele argumentou que mais e mais países poderiam adotar leis semelhantes, o que terminaria por criar um quadro completo.

Sob o acordo final, empresas podem evitar a divulgação de informações classificadas como “sensíveis” por até cinco anos. Os negociadores também decidiram que as regras seriam revisadas a cada quatro anos, a pedido de alguns países membros.

Gabriel Zucman, economista e presidente do European Tax Observatory, organização de pesquisa que conta com o apoio da União Europeia e monitorará a evasão fiscal da parte das empresas, disse que o acordo era “um grande passo na direção de maior transparência, na União Europeia e em termos mundiais”.

“Informações públicas sobre os lucros contabilizados e impostos pagos por companhias multinacionais de país a país são essenciais para monitorar a evasão fiscal e para refletirmos melhor sobre nossas políticas tributárias”, disse Zucman.

O acordo ainda precisa ser aprovado por maioria simples no Parlamento Europeu e entre os países membros da União Europeia, o que deve acontecer no quarto trimestre.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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