Descrição de chapéu ameaça autoritária

Bolsa tem a maior queda desde anulação de condenação de Lula pelo STF

Mercado teme que acirramento de tensões entre Bolsonaro e STF crie obstáculos para gastos do governo em 2022

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São Paulo

As declarações do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) durante os atos de raiz golpista desta terça-feira (7) derrubaram a Bolsa brasileira nesta quarta (8).

O Ibovespa, principal índice da B3, caiu 3,78%, a 113.413 pontos, na esteira dos ataques do presidente ao STF (Supremo Tribunal Federal) proferidos nas manifestações de 7 de setembro. A queda se acentuou após o presidente do Supremo, Luiz Fux, responder a Bolsonaro.

Ao se referir à afirmação de Bolsonaro sobre descumprir decisões judiciais do ministro Alexandre de Moraes, Fux disse que, se confirmada, a ação configuraria crime de responsabilidade.

A queda desta quarta é a maior desde 8 de março, quando o Ibovespa recuou quase 4% após o STF anular as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Na ocasião Lula recuperou os direitos políticos –e hoje é o principal adversário de Bolsonaro para 2022.

O resultado da Bolsa nesta quarta representa uma perda de valor de mercado para as empresas de R$ 195,3 bilhões, segundo cálculos do economista Einar Rivero, da Economática.

Refletindo o clima tenso, o dólar subiu 2,87%, cotado a R$ 5,3250, a maior alta desde 24 de junho de 2020.

“O câmbio reflete as crises sanitária, ambiental e política, que não tiveram início no 7 de setembro, mas não dá para ignorar a importância do que ocorreu no feriado, que foi muito grande”, afirma Lívio Ribeiro, pesquisador associado do FGV-Ibre.

Para Cristiane Quartaroli, economista do Banco Ourinvest, a sensação de piora da crise institucional deve continuar aumentando a volatilidade e a aversão ao risco para investimentos no Brasil. "Consequentemente, provocando pressão na nossa moeda", diz.

O risco-país também aumentou. Medido pelo CDS de cinco anos, o indicador subiu 1,86%, a 179.674 pontos.

O CDS funciona como um termômetro informal da confiança dos investidores em relação às economias, especialmente as emergentes.

Se o indicador sobe, é um sinal de que os investidores temem o futuro financeiro do país. Se ele cai, o recado é o inverso: sinaliza aumento da confiança quanto à capacidade que o país tem de saldar suas dívidas.

"A piora do risco-país vem de uma incerteza política às vésperas de um ano eleitoral, o que para uma economia que está em recuperação tem impacto negativo", diz Fernanda Mansano, economista-chefe da plataforma para investidores TC.

De acordo com analistas, a principal preocupação do mercado é sobre o efeito da crise no acordo que o governo tenta costurar com o STF para que o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) module o volume de pagamentos de precatórios –dívidas judiciais do governo– para 2022.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem afirmado que o pagamento integral da dívida, de R$ 89 bilhões, cria obstáculos ao funcionamento da administração no próximo ano.

Caso o governo não consiga uma solução com a colaboração do Judiciário, dependerá da aprovação de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que permita o parcelamento dos precatórios, algo pouco provável de ocorrer devido ao constante enfraquecimento do apoio ao presidente no Congresso.

Para Vitor Carettoni, diretor da mesa de renda variável da Lifetime Investimentos, Bolsonaro mandou "para a lata de lixo" todas as negociações do Executivo sobre reformas, mas esse ainda é um problema menor se comparado à questão dos precatórios e, em último caso, ao início de um processo de impeachment do presidente.

"A principal preocupação é realmente em relação aos precatórios, que é a questão fiscal, e se escalar um pouco mais, para um possível processo de impeachment, isso é mais traumático e afugenta qualquer investidor", diz Carettoni.

Mais cedo, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criticou as declarações de Bolsonaro, mas sem citar o aumento da pressão pelo impeachment e dando sinais de tentativa de apaziguamento.

"É hora de dar um basta a essa escalada, em um infinito looping negativo", afirmou, dizendo também que "bravatas em redes sociais, vídeos e um eterno palanque deixaram de ser um elemento virtual e passaram a impactar o dia a dia do Brasil de verdade".

Imediatamente após a fala de Lira, a Bolsa chegou a oscilar positivamente, superando os 115 mil pontos, para logo depois retomar a queda.

A leitura feita pelo mercado sobre o posicionamento de Lira é de que, apesar da piora na relação com o Legislativo, ainda não há apoio suficiente para a abertura de um processo de impeachment contra Bolsonaro, segundo Rafael Ramos, da Valor Investimentos.

"Há consenso de que o governo tem uma base para barrar o impeachment, mas essa situação, que está longe de acabar, vai continuar no radar do mercado", diz Ramos.

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