É questionável que precatórios levem ao colapso da máquina pública, diz consultoria da Câmara

Consultoria diz que governo previu o pagamento dessas despesas e mesmo assim elevou o volume dos gastos não obrigatórios

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Marcela Ayres
Brasília | Reuters

O argumento de que a pesada conta de precatórios para 2022 causaria o colapso da máquina pública é questionável, avaliou a Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, justificando que a proposta orçamentária para o próximo ano previu o pagamento dessas despesas na íntegra e mesmo assim elevou o volume dos gastos discricionários (não obrigatórios).

Em nota técnica publicada nesta terça-feira (21), a consultoria reforçou que o projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para o ano que vem foi encaminhado ao Congresso com previsão de pagamento de R$ 89,1 bilhões em precatórios e um volume de discricionárias de R$ 98,6 bilhões, sem considerar a reserva das emendas impositivas de bancadas de R$ 16,2 bilhões.

"No PLOA 2021, os gastos discricionários haviam sido orçados em R$ 96,1 bilhões, sem que se argumentasse que tal patamar implicaria o colapso da máquina pública", afirmou a consultoria.

"Depreende-se, portanto, que o parcelamento proposto não é uma fatalidade em si mesma, mesmo considerando que tal assunto é grave e onera o Tesouro Nacional e requer discussão das medidas para evitar seu crescimento exponencial. No entanto, não pode ser um expediente orientado à abertura de espaço orçamentário para a agregação de novas despesas", acrescentou.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem se referido aos precatórios como um meteoro para as contas públicas, defendendo que a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do governo para diferir a quitação de parte dessas obrigações é crucial não só para a expansão do novo Bolsa Família, mas para acomodação de uma série de despesas públicas.

Em sua nota técnica, a consultoria ponderou que a PEC pode ser considerada um "mecanismo questionável", já que a regra do teto de gastos foi concebida para que eventuais aumentos de despesas fossem atrelados à redução de outros gastos.

A consultoria também afirmou que adiar o pagamento não diminui efetivamente a despesa pública, já que há na verdade o acúmulo de passivos da União. Também avaliou que a postergação traz o risco de elevação das despesas com juros a partir da percepção de agentes de mercado de que a PEC poderia significar menor comprometimento com a gestão fiscal.

"Não há, em suma, qualquer ganho econômico efetivo com o parcelamento de precatórios, a menos que o montante diferido fosse direcionado a investimento público com elevada taxa de retorno —o que não parece o caso", disse a consultoria.

"O que há, reitere-se, é a abertura de espaço orçamentário para acomodar um volume maior de despesas anuais, predominantemente correntes —mesmo que meritórias no cenário de pós pandemia. A acomodação de despesa deve seguir o caminho da adequação orçamentária e da sustentabilidade fiscal", completou.

A PEC do governo divide em dez parcelas o pagamento dos precatórios de mais de R$ 66 milhões e impõe uma limitação provisória dos pagamentos anuais de precatórios a 2,6% da receita corrente líquida, o que também sujeitará precatórios entre R$ 66 mil e R$ 66 milhões a eventual parcelamento. Pelo texto, os precatórios de até R$ 66 mil serão integralmente quitados.

Se aprovada, a PEC abriria um espaço de R$ 32,35 bilhões no Orçamento do ano que vem, calculou a consultoria, e de R$ 504,89 bilhões até 2029.

A consultoria também estimou que, considerando a dinâmica de parcelamento proposta no texto, o estoque da dívida com precatórios poderia alcançar R$ 1,88 trilhão em 2036, volume equivalente a 92% da receita corrente líquida, "sugerindo a exaustão dos recursos do Orçamento e a insolvência".

"Enquanto a taxa de crescimento dos precatórios for maior que a taxa de crescimento da receita corrente líquida, qualquer proposta de parcelamento acabará gerando um estoque inadministrável no futuro, dado o grande acúmulo de passivos", pontuou.

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