Coordenador de Doria, Meirelles quer teto original de volta e vender Petrobras

Ex-ministro da Fazenda vê chance na terceira via e que, desta vez, eleitor buscará bons gestores

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São Paulo

Principal coordenador do plano de governo do pré-candidato à Presidência João Doria (PSDB-SP), o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles afirma que o reestabelecimento do teto de gastos original será prioridade caso o tucano seja eleito.

Reformas administrativa e tributária e a privatização da Petrobras em blocos também serão perseguidas.
Meirelles, 76, acredita que a economia voltará a crescer rapidamente se o teto original for reestabelecido e a confiança, recuperada.

Henrique Meirelles durante seminário Oportunidades no Mercado de Combustíveis no Brasil, organizado pela Folha - Reinaldo Canato - 16.abr.2019/Folhapress

"Olha o exemplo de 2016. O Brasil tinha caído 5,2% de junho de 2015 a maio de 2016. Aprovamos o teto e, no ano seguinte, crescemos entre o último trimestre de 2016 e o último de 2017 2,2%. Isso foi efeito do teto. A reação é imediata", afirma.

"No momento em que começou a se discutir essas violações do teto, a economia piorou imediatamente."
Antes da aprovação da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios, a correção do teto ocorria em julho, já que, em agosto, o governo tem de enviar a previsão orçamentária do ano seguinte. Agora, com a correção em dezembro, o Orçamento é fechado com dúvidas sobre quanto se pode gastar no ano seguinte.

A PEC também limitou o pagamento de precatórios, empurrando para frente valores bilionários em dívidas judiciais que um dia terão de ser pagas, o que cria insegurança.

Quais seriam os pontos fundamentais na busca de uma consolidação fiscal a partir de 2023? Haveria ajuste no funcionalismo, corte nos subsídios fiscais de mais de R$ 300 bilhões a setores e empresas? Qual o plano? Primeiro, é preciso reestabelecer, em sua integralidade, o teto de gastos. Com outra proposta de emenda constitucional cancelando essa PEC [dos Precatórios], que só cria distorções.

Com o reestabelecimento do teto, começa-se a definir prioridades, que foi exatamente a finalidade principal do teto de gastos: incentivar a definição de prioridades. Senão, qualquer despesa é prioridade, que é a situação que o Brasil vivia antes do teto.

Quando foi estabelecido, em 2016, o teto levou a um aumento da confiança e do crescimento.
Isso mostra exatamente seu impacto positivo. A partir daí, temos que trabalhar na consolidação fiscal.

Nós temos uma vantagem muito grande porque podemos falar muito além da teoria e dos planos. Temos isso aplicado em São Paulo. Fizemos uma reforma administrativa e outra previdenciária, muito mais forte que outros estados.

Assim, temos aqui uma geração de receita adicional neste ano de R$ 50 bilhões, que serão empregados em projetos sociais e de infraestrutura. Existem 8.000 obras que começam a ser executadas.

Em primeiro lugar, é preciso uma reestruturação do Estado para torná-lo mais eficiente e diminuir custos.
Em segundo, a área de incentivos fiscais. Isso foi feito em São Paulo. Fechamos cinco empresas estatais que não tinham mais razão de existir, cortamos benefícios e privilégios, racionalizamos o custo e a estrutura do estado.

Todos os benefícios fiscais concedidos foram diminuídos em 20%. O estado gerou recursos para investir e ficou mais eficiente. É algo que dá para fazer e certamente constará do plano.

Na área tributária, seria necessário algum novo imposto para elevar a arrecadação para complementar o ajuste fiscal? Não. A carga tributaria no Brasil já equivale à dos países do norte da Europa, sem ter o serviço público que eles oferecem. Não há espaço mais no Brasil para aumento da carga tributária. Mas [há espaço] para aumentar a eficiência do Estado, da disponibilidade de recursos para investimentos através da reforma administrativa.

Depois, outras medidas, [como] privatização e concessão de infraestrutura para o setor privado. Temos o exemplo da estrada Piracicaba-Panorama, de 1.273 km, com investimentos privados previstos de quase R$ 14 bilhões. E ainda gerou R$ 1 bilhão para o estado em outorga paga pelo consórcio vencedor.

Temos a concessão [em andamento] de parques às estradas litorâneas, as balsas, 22 aeroportos regionais. Tudo isso melhora a qualidade do serviço à população e arrecada para o estado.

Na área tributária, qual seria o plano? O sr. tem simpatia pela proposta de Bernard Appy [do Centro de Cidadania Fiscal e um dos idealizadores da reforma tributária contida na PEC 45]? Trabalhei conjuntamente com os demais estados e chegamos a um acordo unânime pela primeira vez em 30 anos entre os 27 estados. Baseados na proposta da PEC 45, apresentamos ali um substitutivo aperfeiçoando um pouco a questão de como compensar os estados produtores nos primeiros anos pela mudança da tributação no destino, em vez de na origem.

Esse substitutivo à PEC 45 já foi apresentado no Congresso Nacional com apoio unânime dos estados. Isso é fundamental. Além disso, essa proposta viabiliza uma grande racionalização no pagamento de impostos e aumenta a produtividade no país.

Lucros e dividendos, voltaria a proposta de tributação? Vai ser algo a ser discutido no âmbito do grupo econômico. Não vou me adiantar agora.

Qual a avaliação da situação de desarrumação das contas públicas? O sr. acha que, restabelecendo o teto e um pouco da confiança, a economia reage rápido? Não tenha dúvida. Olha o exemplo de 2016. O Brasil tinha caído 5,2% de junho de 2015 a maio de 2016. Aprovamos o teto e, no ano seguinte, crescemos, entre o último trimestre de 2016 e o último de 2017, 2,2%. Isso foi um efeito do teto. A reação é imediata. Foi um efeito do teto.

No momento em que se começou a discutir essas violações do teto, a economia piorou imediatamente. Pois o maior problema do Brasil nos últimos anos tem sido a expansão fiscal insustentável. Atacando isso, a economia volta rapidamente. Além disso, [temos de fazer] reforma administrativa, tributária etc. A resposta é muito rápida.

Os governos Temer e Bolsonaro tocaram algumas mudanças infraconstitucionais ou que passaram por alteração na Constituição, como novos marcos regulatórios do gás e saneamento, autonomia do Banco Central. O que mais dá para fazer nessa linha? Há uma série de medidas nessa direção que visam o melhor funcionamento da economia e da produtividade. Normalmente, naquilo que gosto de chamar de "facilidade de produção", existem diversas medidas. Como tempo de abertura de empresas, algo que fizemos em São Paulo.

No Brasil, em 2016, gastava-se em média 101 dias para se abrir uma empresa. Hoje, em São Paulo, já se abre empresa em uma hora. Esse tipo de coisa pode ser levado ao Brasil inteiro.

Outra coisa é a digitalização tributária, diferente da reforma tributária. Digitalização de procedimentos, simplificação de normas e coisas que estamos fazendo em São Paulo, e que aumentam a produtividade.

Mas não há dúvida de que, para o início disso tudo, temos de falar de reforma administrativa, tributária e investimento em infraestrutura. Depois, a melhora do ambiente de negócios, e uma parte muito importante de curto e médio prazo, que é a questão da educação e treinamento. Existe um campo enorme para se conseguir aumento da produtividade com treinamento da força de trabalho.

Sempre gosto de citar o ditado de que o longo prazo demora, mas chega. Nesse ponto, há a melhora do ensino. De novo, isso está sendo feito com sucesso em São Paulo, que tinha a sétima posição na classificação geral e agora está em primeiro lugar.

Na Petrobras, haveria mudança na política de preços ou plano de privatização? Não sei o que será decidido pelo nosso grupo. Em minha opinião pessoal, o que precisará ser feito é a privatização da Petrobras, com a divisão da empresa em mais de uma, passando a prevalecer a competição para que os preços [dos combustíveis] caiam. E não com interferência do governo.

Fazer algo como foi feito na telefonia dos Estados Unidos ou no monopólio da Standard Oil [norte-americana] há um século.

Com o atual ciclo de aumento dos juros no combate à inflação, é esperado um crescimento menor em 2022, o que deve agravar o quadro social. O governo Bolsonaro recauchutou o Bolsa Família e aumentou o valor para R$ 400, em média, com prazo para acabar, nesse montante, no fim de 2022. O que vai ser feito nessa área? Isso vai ser parte do trabalho de nosso grupo. Mas o melhor programa social que existe é a geração de empregos. Neste ano, já criamos em São Paulo mais de 800 mil empregos e devemos chegar perto de 1 milhão. São Paulo tem 22% da população e está criando 40% do total de novos empregos no país. Isso é o maior e melhor programa social que existe.

Há, certamente, outros programas, que estamos aplicando em São Paulo, como o Almoço Grátis e a Bolsa do Povo.

Pesquisas eleitorais mostram uma cristalização do favoritismo de Lula e Bolsonaro em 2022 [47% e 21% das intenções de votos no primeiro turno, respectivamente, segundo o Datafolha]. Quais as chances da terceira via? Pesquisa um ano antes da eleição reflete um reconhecimento de nomes. Um é o atual presidente da República e o outro, o ex-presidente. O eleitor neste momento está pensando no problema econômico, na inflação, nos preços da carne, do pão. Ele vai começar a pensar em eleição a partir de maio.

Nesse momento a terceira via terá condições de decolar. Principalmente o João Doria. Em 2018, a eleição foi muito baseada em rejeição à classe política, que acabou se transformando em rejeição a qualquer experiência administrativa. Deu no que deu. O efeito é ruim e a população está sentindo isso agora.

Minha avaliação é que, na próxima eleição, a população vai olhar muito mais a gestão. O que a pessoa já realizou e o que pode realizar. João Doria tem o que mostrar em São Paulo. Não vai falar em teoria. Em 2018 bastou chegar lá e ficar gritando. Agora, vai ter de mostrar trabalho concreto e realizado.

Num eventual governo Lula, o sr. voltaria a trabalhar com ele? Isso é prematuro. O fato é que estou trabalhando com o Doria, que está concorrendo com o Lula.


Raio-X - Henrique Meirelles, 76

Atual secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo. Foi presidente internacional do BankBoston, presidente do Banco Central em todo o governo Lula (2003-2010) e ministro da Fazenda no governo Michel Temer (2016-2018). Foi candidato à Presidência pelo MDB em 2018 e pretende disputar o Senado por Goiás pelo PSD.

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