O que acontece se não houver acordo entre Americanas e credores?

Sem negociação, crescem as chances de a varejista ir à falência, dizem especialistas

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São Paulo

Para que o seu plano de recuperação judicial seja apresentado à Justiça até 22 de março, a Americanas precisa entrar em acordo com os grandes credores, que se mostram extremamente insatisfeitos com as soluções "paliativas" que o trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, principais acionistas da varejista, têm apresentado.

Uma delas é o financiamento DIP (do inglês debtor-in-possesion financing, ou "financiamento do devedor em posse"), aprovado pela Justiça no último dia 9, no valor de até R$ 2 bilhões. Nesta quinta-feira (16), a proposta do trio de injetar R$ 7 bilhões, já descontado o aporte de R$ 1 bilhão feito na semana passada, também foi considerada irrelevante, diante das dívidas da Americanas, da ordem de R$ 43 bilhões.

"Chama a atenção o fato de o DIP da Americanas não apresentar garantias, foi feita uma emissão de debêntures", diz o advogado especialista em recuperação judicial Filipe Denki, da Lara Martins Advogados. "Em caso de falência, os principais acionistas se tornam credores e recebem antes de qualquer outro credor.'

Lojas Americanas na rua Direita, região central de São Paulo; varejista pediu recuperação judicial em janeiro de 2023 - Bruno Santos-17.jan.23/Folhapress

Se não houver acordo prévio com os credores, a Americanas pode apresentar o plano de recuperação judicial ao seu modo à Justiça. Especialistas dizem que a primeira versão do plano costuma ser considerada uma "peça de ficção", feita apenas para cumprir a lei. Em geral, essas propostas trazem os mesmos parâmetros, como deságio de 80% nas dívidas e prazo de 15 anos para pagar.

Mas os credores terão até 30 dias para apresentar objeções ao plano. Se houver uma objeção ou mais, será convocada uma assembleia geral de credores, que votará pela aprovação, rejeição ou modificação do plano.

"Em caso de rejeição, o administrador judicial pergunta aos credores se eles querem apresentar um plano alternativo. Se eles se negarem, é convolação em falência", afirma Filipe Denki.

Se eles optarem por um plano alternativo, a proposta terá 30 dias para ser apresentada e então colocada em votação na assembleia geral de credores.

"Em caso de aprovação, segue a recuperação judicial. Se for rejeitado, porém, pela maioria dos credores, também ocorre a falência", afirma Denki, que considera "pouco provável" a disposição dos credores em apresentar um plano alternativo.

"Em geral, para apresentar um plano de recuperação judicial, é preciso ter acesso a muitos detalhes da operação da empresa, coisa que os credores não têm", diz Denki.

Busca por interessados em 'comprar o passivo'

Ou seja, sem acordo, o caminho que resta à varejista é fechar as portas –uma solução que não é boa para ninguém, incluindo as instituições financeiras.

A maior dívida da Americanas está nas mãos dos bancos privados. Os débitos com as instituições financeiras somam R$ 19,5 bilhões, sendo o Bradesco o maior credor (R$ 5,1 bilhões), seguido por Santander (R$ 3,6 bilhões), BTG (R$ 3,5 bilhões), Itaú Unibanco (R$ 2,7 bilhões) e Safra (R$ 2,5 bilhões). Também estão na lista os bancos públicos Banco do Brasil (R$ 1,6 bilhão) e Caixa (R$ 500 milhões).


Daí a relevância desse estágio de negociação entre credores e varejista.

É nesse intervalo entre o deferimento do pedido de recuperação judicial e a apresentação da primeira versão do plano de pagamento que os credores mostram aos acionistas o que esperam que eles façam, diz o advogado Fernando Bilotti, sócio do Santos Neto Advogados.

"Os majoritários têm muito dinheiro. Isso não quer dizer que eles tenham que integralizar todo o prejuízo", afirma Bilotti. "Mas é muito difícil deixar um prejuízo enorme só para os credores." A negociação ocorrida nesta quinta, na avaliação dele, deverá ser apenas a primeira de muitas.

Assim como no plano de recuperação, essas tentativas de um acordo costumam ter muitas idas e vindas.

Bancos como o BTG, Safra e Votorantim já foram à Justiça para tentar executar pagamentos que, no entendimento de suas defesas, não deveriam ser afetados pelo pedido de recuperação judicial. Nesse sentido, a Americanas não pode descartar a possibilidade de que muitos desses credores consigam, de fato, compensar esses créditos fora do processo de recuperação.

"São negociações primeiro para tentar pacificar os credores, tentar tolher esses movimentos e já falar em formas de cumprir esses créditos", diz o advogado Daniel Báril, da área de insolvência e reestruturação do Silveiro Advogados.

Na avaliação dele, a Americanas não está necessariamente negociando o passivo neste momento, mas o quanto será injetado no negócio. É possível que, a partir de agora, a varejista comece também a trazer para a negociação interessados em comprar o passivo, algo comum em processos de recuperação judicial.

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