Descrição de chapéu Folhainvest Selic juros

BC mantém taxa de juros em 13,75% e não sinaliza corte, apesar de pressão

Decisão veio em linha com a projeção consensual do mercado financeiro

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Brasília

O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central voltou a ignorar a pressão do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de empresários pela redução dos juros e manteve nesta quarta-feira (21) a taxa básica (Selic) em 13,75% ao ano, sem sinalizar um corte à frente. Em comunicado, a autoridade disse que o cenário demanda "cautela e parcimônia" e disse ser necessário "paciência e serenidade".

O colegiado do BC, porém, suavizou levemente o comunicado ao descartar a mensagem que falava sobre a possibilidade de voltar a elevar a Selic se o processo de desinflação não transcorresse como esperado. No encontro anterior, já havia baixado o tom nesse ponto ao afirmar que um eventual aperto monetário seria um cenário menos provável.

Sem falar em queda de juros, o BC disse que a conjuntura atual é caracterizada por um processo desinflacionário "que tende a ser mais lento" e por expectativas de inflação ainda preocupantes. Além disso, a autoridade monetária defendeu seu plano de voo ao dizer que "a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado tem se mostrado adequada para assegurar a convergência da inflação".

Fachada do Banco Central em Brasília (DF) - Gabriela Biló/Folhapress

Ao falar sobre os próximos movimentos, o Copom se limitou a dizer que as decisões dependem de diferentes variáveis.

"Os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária, em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica, das expectativas de inflação, em particular as de maior prazo, de suas projeções de inflação, do hiato do produto [margem que a atividade tem para crescer até atingir sua capacidade máxima] e do balanço de riscos."

A sustentação da Selic no atual patamar, em decisão unânime, veio em linha com a projeção consensual do mercado financeiro de que os juros ficariam estáveis pela sétima vez consecutiva –a quarta desde o início da gestão petista. Levantamento feito pela Bloomberg mostrou que essa era a expectativa unânime entre os analistas consultados.

Antes da reunião, o BC voltou a ser alvo de críticas. Além da pressão de Lula e de seus ministros, um grupo de 51 integrantes do Conselhão (Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável da Presidência da República), dentre eles a empresária Luiza Heleno Trajano, escreveu uma carta aberta pedindo corte de juros. Houve ainda um protesto em frente ao prédio do BC em São Paulo, na terça-feira (20), promovido por centrais sindicais.

A posição pró-corte de juros argumenta que o cenário econômico doméstico apresentou melhora desde o encontro anterior do Copom, em maio, com desaceleração da inflação e queda do dólar –influenciada pela revisão da perspectiva do Brasil para "positiva" pela agência de classificação de risco S&P Global Ratings.

Em maio, o IPCA (índice oficial de inflação do Brasil) desacelerou para 0,23%, segundo dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). No acumulado em 12 meses, ele recuou para 3,94% –a menor variação para o mês desde 2020.

No cenário de referência do Copom, as projeções de inflação para este ano melhoraram, caindo de 5,8% para 5% e, para 2024, recuaram de 3,6% para 3,4%.

Apesar de mencionar o recente arrefecimento da inflação ao consumidor e a perspectiva de desaceleração da economia nos próximos trimestres, o Copom antevê "uma elevação da inflação acumulada em 12 meses ao longo do segundo semestre".

Em seu balanço de riscos para a inflação, o BC continuou com a avaliação de que permanecem fatores em ambas as direções. Entre os motivos que puxariam os preços para cima, destacou "alguma incerteza residual sobre o desenho final do arcabouço fiscal" e os impactos da nova regra "sobre as expectativas para as trajetórias da dívida pública e da inflação, e sobre os ativos de risco".

O colegiado também incluiu uma maior persistência das pressões inflacionárias globais e uma deterioração maior, ou mais duradoura, das expectativas de inflação para prazos mais longos.

Na direção contrária, o BC mencionou novamente a queda dos preços das commodities, acrescentando que parte importante desse movimento já foi verificada. Falou também da possibilidade de uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada, puxada pelas condições adversas no sistema financeiro global, e uma perda maior de ritmo na concessão doméstica de crédito.

ANALISTAS VEEM CAUTELA EM DECISÃO DO BC

Para Fernando Fenolio, economista-chefe da WHG (Wealth High Governance), o BC mostrou uma visão mais conservadora da economia e adotou uma postura cautelosa.

Segundo ele, o comitê não "telegrafou" o início do afrouxamento monetário em agosto e deu indícios de que seus passos futuros estão em aberto. "Pode acontecer corte se os indicadores vierem na direção benigna, mas também pode não acontecer", disse.

"Ele quis tirar um pouco da fervura do mercado na questão dos cortes, mostrando que vai ser conservador e que as condições econômicas parecem não abrir a porta para corte grande, pelo menos nesse início de ciclo", afirmou.

Fenolio também destaca a importância das definições relacionadas às metas de inflação para o comportamento futuro das expectativas, variável observada com atenção pela autoridade monetária.

"Se mantiver a meta em 3% e a banda em 1,5 ponto percentual, cair o ano-calendário, perseguindo inflação em um horizonte que o BC determina, se for essa decisão, é possível e provável que o mercado corte ainda mais as expectativas de inflação à frente", ponderou.

A decisão do colegiado do BC foi tomada uma semana antes da reunião do CMN (Conselho Monetário Nacional), agendada para o dia 29, quando os ministros da Fazenda (Fernando Haddad) e do Planejamento e Orçamento (Simone Tebet), além do presidente do BC (Roberto Campos Neto), devem debater as metas de inflação.

Lula sinalizou anteriormente o desejo de mudar os alvos da autoridade monetária, enquanto Haddad defendeu um ajuste no horizonte da meta de inflação. Atualmente, os objetivos perseguidos pelo BC são 3,25% neste ano e 3% em 2024 e 2025, com intervalos de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.

Para Caio Megale, economista-chefe da XP e ex-assessor especial no Ministério da Economia, o colegiado do BC não parece estar "super empolgado com os últimos dados de inflação" e condiciona a decisão da próxima reunião à evolução dos dados.

Na visão dele, mesmo que o BC tivesse mais convicção sobre seus passos na próxima reunião, não faria sentido já se comprometer.

Megale afirma que, embora o comitê tenha aberto um pouco a porta e sinalizado a possibilidade –ainda incerta– de corte de juros em agosto, a retórica do colegiado sinaliza que seu primeiro movimento não será agressivo, o que significa uma eventual redução de 0,25 ponto percentual.

"Ele falou: agora abro a possibilidade de poder cortar [os juros], mas não é certo, as expectativas têm de cair um pouco mais, a inflação tem de continuar indo na direção correta", disse.

"E reforçou a parcimônia, quando puder cortar, não vai sair cortando fortemente. Ele tentou sinalizar que se continuar nessa direção vai dar [para cortar os juros] e, se der, tem de ser devagar", acrescentou.

Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter, considera que o discurso do BC veio em um tom um pouco mais duro do que o esperado pelos agentes do mercado, mas vê uma evolução em relação ao comunicado divulgado em maio.

Ela espera que a ata da reunião, que será divulgada na próxima terça-feira (27), traga mais detalhes sobre a discussão dos membros do colegiado quanto aos próximos passos do BC.

Para a especialista, o principal gatilho para o início de corte de juros será a definição das metas de inflação. "Ele está preocupado ainda com as expectativas, que caíram bem timidamente. Foram as condições que melhoraram menos", disse.

Vitória observa que esse fator pode ter sido determinante para a manutenção do balanço de riscos simétrico (ou seja, apontando pressão sobre os preços nas duas direções). "É um ponto que discordo, houve melhora, inclusive as projeções de inflação do BC caíram", afirmou.

Segundo o boletim Focus, divulgado na segunda-feira (19), a projeção dos analistas para o IPCA deste ano foi revisada de 5,42% para 5,12%. Para o ano que vem, a expectativa caiu para 4%. Para 2025, a estimativa dos economistas está em 3,8% –acima do centro da meta.

Com 2024 na mira, o colegiado do BC volta a se reunir nos dias 1º e 2 de agosto para recalibrar o patamar da taxa básica.

O ciclo de alta de juros foi interrompido pelo Copom em setembro de 2022 depois de o BC promover o mais agressivo aperto da política monetária desde a adoção do sistema de metas para inflação, em 1999.

Foram 12 aumentos consecutivos entre março de 2021 e agosto do ano passado, com elevação de 11,75 pontos percentuais. A taxa básica saiu de seu piso histórico (2%) até atingir o nível atual de juros –o mais alto desde o fim de 2016.

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