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Nova direção autônoma da BMW pode liberar WhatsApp ao volante

Folha testa com exclusividade sistema mais avançado que deixa motorista com as mãos livres. Com estreia marcada na Europa, tecnologia enfrenta aprovação lenta no Brasil

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Ricardo Ribeiro
Sokolov (República Tcheca)

Apenas nos três primeiros meses deste ano, uma média de 677 motoristas foram flagrados por dia usando o celular enquanto dirigiam no Brasil, segundo o Ministério dos Transportes. O aumento de quase 30% na comparação com o mesmo período do ano passado é impulsionado pelo uso de aplicativos de mensagem como o WhatsApp.

O uso do celular ao volante já é a terceira maior causa de mortes no trânsito, segundo a Associação Brasileira de Medicina do Tráfego. O novo sistema de direção autônoma de nível três apresentado pela BMW nesta semana pode ajudar a melhorar este quadro.

Repórter Ricardo Ribeiro testa veículo autônomo nível 3, da BMW
Repórter Ricardo Ribeiro testa veículo autônomo nível 3 da BMW - Tom Kirk/BMW

A BMW utiliza a tecnologia LiDAR, conectando as informações de sensores frontais, laterais e traseiros com um radar de longa distância (até 300 metros), além de uma câmera na grade dianteira e outra na tampa traseira.

A combinação permite que o sistema capture com precisão o ambiente ao redor do carro, incluindo outros veículos e pedestres, e "leia" melhor as sinalizações no asfalto e em placas. A única exigência é que o condutor esteja sempre acordado e sentado na posição de guiar.

A Folha foi o único jornal do Brasil na apresentação oficial da direção autônoma nível três da BMW. A reportagem dirigiu um Série 7 equipado com o sistema dentro do novo centro de testes da marca alemã em Sokolov, na República Tcheca. Apesar de fechada ao trânsito da vida real, a área de 600 hectares conta com 25 quilômetros de réplicas fiéis de circuitos urbanos, rodovias expressas e interligações.

Basta acionar um botão no painel e o volante se retrai. O espaço extra já convida o motorista a ficar mais relaxado. Alertas sonoros e luminosos avisam que a inteligência artificial está no comando. O sistema controlou o carro com precisão e o manteve na faixa mesmo em curvas prolongadas.

O comando da aceleração e frenagem também foi afinado e ágil até quando outro veículo cortou a frente do carro do teste de forma repentina. Tratava-se de uma simulação organizada pelos pilotos da BMW, mas a dinâmica era idêntica ao encontrado no cotidiano de grandes cidades brasileiras.

Pode ser estranho sentir o carro acelerar e ver o volante mexer sozinho. É preciso resistir ao impulso de intervir com pés e mãos, o que faz o sistema desarmar. Mas bastam alguns minutos para perceber os benefícios.

Na metade do teste, a reportagem já havia respondido mensagens no WhatsApp, verificado e-mails e assistido o melhor da rodada do campeonato alemão em aplicativo disponível no console central.

A direção autônoma da BMW permaneceu no controle sem dificuldades, apesar das variações na condição de trânsito. Quando um obstáculo fixo surgiu no meio da pista, o sistema realizou uma frenagem total com segurança. Susto só para o repórter distraído com os gols da Bundesliga.

Uma câmera interna monitora os olhos do motorista. Se o sistema identificar sinais de cansaço, alertas sonoros e visuais (amarelo e, depois, vermelho) pedem que o condutor assuma o controle. Afinal, dormir ou passar para o banco de traseiro só é possível em carros de autonomia nível quatro.

Se o sistema não puder identificar as condições da estrada ou não souber como agir, o condutor também será reconvocado. Aplicativos de vídeo são automaticamente interrompidos, mas cabe ao motorista abandonar o celular (ou um livro, quem sabe). Os avisos oferecem um tempo razoável de preparação e a passagem é menos abrupta do que no Autopilot da Tesla.

O que acontece se o motorista não assumir o volante após o alerta vermelho? A reportagem resolveu desafiar o sistema, que não deixou por menos. O BMW se moveu sozinho para o acostamento e desligou. O mau comportamento também pode ser "punido" com um período de castigo em que o modo autônomo fica indisponível.

O sistema, porém, ainda virá com limitações impostas pelas autoridades de transporte. Como em outras marcas, o nível três da BMW só vai operar abaixo de 60 km/h e com carros à frente. Segundo a marca, o sistema tem capacidade para funcionar em altas velocidades, mas o trânsito carregado é o que os motoristas mais querem evitar e a condição ideal para que todos se acostumem com a tecnologia.

Recursos de nível dois, como o controle de velocidade adaptativo, continuarão disponíveis para altas velocidades e estradas livres, mas sempre com a exigência da mão no volante.

A BMW acaba de homologar o sistema de nível três na Alemanha e vai equipar modelos selecionados nos principais mercados europeus a partir do início do ano que vem. A marca corre atrás da rival Mercedes, que já oferece o nível três na Europa como opcional (a partir de 5.000 euros) e recebeu sinal verde na Califórnia.

"Demora porque cada fabricante precisa oferecer evidência de que o seu sistema é seguro para a autoridade de cada país. É uma bateria de testes", explica Thorsten Schmitt, que integra o time de desenvolvimento da BMW.

A BMW não tem uma data para o nível 3 no Brasil. Basta lembrar que o assistente de troca de faixa, considerado um "dois plus", ainda não está disponível no país. A Folha apurou com executivos de cinco fabricantes que entraves na legislação e diálogo difícil com agentes públicos atrasam a introdução da tecnologia, mais do que eventuais vias sem as condições ideais.

Permitir o uso de celular no modo autônomo dependerá de alterações no Código de Trânsito. A reportagem realizou o teste em circuito fechado. No Brasil, o uso do telefone ao volante é infração gravíssima punida com multa de R$ 293,47 e sete pontos na carteira.

Carro vai procurar vaga sozinho no shopping a partir de 2025

A discussão sobre tecnologias de direção autônoma quase sempre é centrada em situações de condução em centros urbanos ou na estrada. Mas e se fosse possível eliminar a chatice de passar 40 minutos procurando uma vaga no shopping? É o que a BMW pretende com o Automated Valet Parking. Ainda em fase de testes, a tecnologia vai permitir que o motorista desça na entrada do estacionamento. O sistema autônomo então assume o controle do carro, procura uma vaga e estaciona sozinho. O motorista também poderá solicitar o retorno autônomo do veículo a um ponto de embarque e desembarque por meio de um comando no celular.

Segundo Thorsten Schmitt, responsável pelo desenvolvimento do BMW Automated Valet Parking, existem três formas de implementação da tecnologia. A primeira é baseada na estrutura. Áreas do estacionamento recebem sensores e sinalizações que guiam o sistema de direção autônoma do carro. A capacidade de manobra, porém, é limitada e a iniciativa requer cooperação entre os diferentes fabricantes. Dois estacionamentos em Stuttgart, na Alemanha, já operam com uma área para autônomos – o do aeroporto e do museu da Mercedes. A marca prevê que o sistema esteja em 20 estacionamentos do país nos próximos meses.

A outra opção é baseada no veículo. Além do conjunto de sensores necessários, é preciso "ensinar" o sistema de direção autônoma a controlar o carro em diferentes tipos de estacionamentos e situações de manobra. "Neste caso, estamos falando de níveis quatro e cinco. Então, ainda há um caminho considerável a ser percorrido em termos de teste e aprovação pelas autoridades. Mas está mais perto do que se imagina", explica Schmitt. "É difícil prever, mas possivelmente em 2025 o Automated Valet já estará em alguns países", completa.

A terceira possibilidade explorada pela BMW é o estacionamento tele operado, desenvolvido em parceria com a Valeo. O carro é controlado pelo manobrista sem que ele saia do escritório através de um equipamento que mais parece um vídeo game. O princípio é o mesmo dos drones militares, que jogam bombas na Síria, mas são controlados por pilotos da Força Área americana a partir de uma sala no Estado de Nevada.

A Folha também testou o estacionamento tele operado. Manobristas acostumados com games recentes de carros vão tirar de letra. A reportagem patinou um pouco porque há um atraso entre os comandos e a aceleração real – ou talvez seja apenas a idade do repórter. São três telas que usam os sensores e câmeras do carro para oferecer visões área, frontal e traseira, o que facilita bem as manobras. O sistema também desenha linhas para indicar distâncias e a trajetória prevista conforme o esterço do volante.

Ainda não há previsão de implantação, o que é uma pena. Por segurança, o estacionamento tele operado não permite acelerar além de 10 km/h, um limitador que seria bem recebido em praticamente todos os serviços de valet do Brasil.

O carro que dirige sozinho

A direção autônoma é dividida pelos fabricantes de veículos em cinco níveis:

Nível 1 – Assistência ao condutor

Já disponíveis em diversos modelos no Brasil, os sistemas de nível controlam de forma limitada a aceleração ou a frenagem, mas não o mesmo tempo. Os principais exemplos são o controle de velocidade de cruzeiro (mantém uma velocidade programada), o limitador de velocidade (impede que o motorista acelere acima de uma velocidade específica), o assistente de manutenção de faixa (alertas sonoros e vibratórios nas escapadas) e sistemas que identificam obstáculos e realizam uma frenagem de emergência. Aqui o motorista está no comando o tempo todo e os sistema não interfere na direção.

Nível 2 – Automação parcial

Os sistemas de nível dois podem controlar simultaneamente aceleração, frenagem e direção. O controle de velocidade adaptativo mantém velocidade e distância do carro à frente conforme programado pelo motorista e um assistente de rodagem mais avançado corrige a trajetória para manter o carro na faixa. Ambos estão disponíveis no Brasil em modelos de preço médio e alto. Alguns fabricantes já oferecem o chamado nível dois plus, em que o carro muda de faixa sozinho quando o motorista aciona a seta, automatizando a ultrapassagem. Este recurso só está aprovado na Europa, EUA e Canadá. No nível dois, o motorista precisa estar com as mãos no volante e pronto para retomar o controle porque a automação é interrompida quando os sensores não identificam adequadamente o caminho.

Nível 3 – Mão livres

No nível três, o sistema assume o controle completo do veículo, mas em condições determinadas, como trânsito intenso e velocidade média para baixa. A condução é mais precisa e alertas para que o motorista retome o comando são menos frequentes e repentinos. As mãos no volante não são mais necessárias e é possível ler um livro ou assistir televisão. No entanto, o condutor precisa estar de olhos abertos e no seu banco (veja mais na reportagem).

Nível 4 – Tire um cochilo

Aqui o controle é total. O motorista apenas escolhe a rota no sistema de navegação e o carro realiza todo o percurso sozinho, se adaptando a qualquer condição de trânsito. O motorista pode dormir, sentar-se de costas para a estrada ou até mudar de banco. Em caso de emergência, o sistema adota protocolos de segurança que não necessitam intervenção humana e o veículo é estacionado.

Nível 5 – Black Mirror

O nível cinco parece saído de um episódio da série de TV "Black Mirror". Veículos vão funcionar sem o motorista mesmo em longa distâncias. Será possível desembarcar no destino e enviar o carro para uma estação de recarga ou fazer uma entrega do outro lado da cidade. Um comando no celular e o veículo retorna para buscar o motorista. O nível cinco requer comunicação e troca de dados entre os carros e dos carros com a infraestrutura das cidades e rodovias.

Fonte: BMW.

O jornalista viajou a convite da BMW.

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