Lula pede para ministros serem os 'melhores gastadores' em obras

Declaração é dada em meio à rediscussão da meta; Haddad diz, em tom de brincadeira, que colegas precisam ajudá-lo

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Brasília

Em meio à discussão sobre revisão da meta fiscal de 2024, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta sexta-feira (3) que, para a Presidência, dinheiro bom não fica guardado no Tesouro Nacional, mas é transformado em obra.

O chefe do Executivo pediu aos ministros da área de infraestrutura —e na presença do chefe da equipe econômica, Fernando Haddad— que eles sejam os "melhores gastadores do dinheiro em obras de interesse do povo brasileiro".

"A gente não pode deixar sobrar dinheiro que está previsto ser investido nos ministérios. A gente precisa colocar, transformar. Eu sempre digo que, para quem está na Fazenda, dinheiro bom é dinheiro no Tesouro. Para quem está na Presidência, dinheiro bom é transformado em obras", disse.

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em reunião ministerial sobre infraestrutura no Palácio do Planalto - Pedro Ladeira/Folhapress

Para quem está na Fazenda, dinheiro bom é dinheiro no Tesouro. Para quem está na Presidência, dinheiro bom é dinheiro transformado em obras

Lula

em reunião com ministros

"Se os ministérios forem bem, o Brasil vai bem. O governo vai bem, eu e [o vice-presidente Geraldo] Alckmin vamos bem. Se vocês não fizerem direito, o Brasil vai mal, eu e Alckmin vamos mal", disse ainda.

"Então, queremos que vocês sejam os melhores ministros desse país, os melhores executores desse país, os melhores gastadores do dinheiro em obras de interesse do povo brasileiro. É para isso que estamos fazendo essa reunião", completou durante reunião ministerial no Palácio do Planalto.

Durante a reunião desta sexta, Haddad brincou com os colegas, afirmando que eles só queriam ajudar Rui Costa ao investir em obras, mas precisavam ajudá-lo também, em referência à necessidade de segurar os gastos.

Naquele momento, relatam participantes, a conversa já estava mais amena, mas ministros notaram um clima de distanciamento entre Costa e Haddad no começo da reunião. Os dois divergem sobre uma das principais bandeiras do chefe da Fazenda, que é a meta de déficit zero. Costa é crítico da meta e defende alterá-la.

Durante o encontro, Lula também pediu aos ministros que conversem com as respectivas bancadas no Congresso para pedir alinhamento em relação à destinação de emendas parlamentares. O governo constatou que o volume de emendas impositivas é bastante elevado e parecido ao montante de dinheiro destinado ao PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) para obras de infraestrutura.

Por essa razão, o presidente quer que haja um esforço para que os ministros convençam deputados e senadores a destinar as emendas a obras que são prioritárias para o Executivo federal. A ideia é dar uma ajuda aos gastos do governo e para que todos possam capitalizar politicamente com obras estruturantes.

Durante o encontro, evitou-se falar sobre o embate em torno da meta fiscal. O único que tocou no tema foi o ministro Renan Filho (Transportes), mas lateralmente.

Também participaram os ministros Silvio Costa (Portos e Aeroportos), Alexandre Silveira (Minas e Energia), Juscelino Filho (Comunicações), Waldez Góes (Desenvolvimento Regional), Jader Filho (Cidades) e Paulo Pimenta (Secom, Secretaria de Comunicação Social), além de Geraldo Alckmin, vice-presidente e ministro do Mdic (Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços).

Lula repetiu fala de março de que dinheiro bom é aquele gasto em obra. Na ocasião, afirmou que os ministros Haddad e Simone Tebet (Planejamento) iriam arrumar dinheiro para realizar os investimentos, apesar do apertado Orçamento federal.

A afirmação, contudo, ganhou novo significado depois que o ajuste fiscal voltou ao centro do debate e reforçou a preferência de Lula pelos gastos públicos e não pela eliminação do déficit.

Apesar disso, o ministro Rui Costa (Casa Civil) afirmou nesta sexta que não há possibilidade de aumento de gastos públicos, independentemente da decisão do governo sobre a meta fiscal.

"Independente da meta, o total de gasto com investimento mais custeio está dado. São duas travas que o arcabouço tem. Isso já está definido lá, que é o percentual de 70% da receita dos últimos 12 meses, contados do meio do ano", afirmou Costa.

O ministro também acrescentou que não há uma "dicotomia" dentro do governo, entre uma ala mais gastadora e outra mais adepta das medidas de responsabilidade fiscal.

"Vi alguns artigos [na imprensa] tentando fazer um contraponto entre uma parte do governo que é gastador e outra que é poupador. Não há esse debate, não há essa dicotomia, porque não há nenhuma possibilidade de aumentar o gasto, porque o arcabouço não permite", acrescentou o chefe da Casa Civil.

No dia 27 de outubro, o próprio Lula afirmou que o governo federal "dificilmente" cumpriria o alvo de déficit zero em 2024. Lula ainda acrescentou que a meta não precisava ser zero, contrariando frontalmente o que vinha sendo defendido pelo ministro da Fazenda.

"Deixa eu dizer para vocês uma coisa. Tudo o que a gente puder fazer para cumprir a meta fiscal, a gente vai cumprir. O que eu posso te dizer é que ela não precisa ser zero. A gente não precisa disso. Eu não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue a começar o ano fazendo corte de bilhões nas obras que são prioritárias nesse país", disse o presidente, em resposta a questionamento da Folha, durante café da manhã com a imprensa.

A fala de Lula causou reação negativa no mercado financeiro. A Bolsa brasileira despencou e o dólar subiu após as declarações. Taxas de contratos futuros de juros também avançaram.

Após a fala, ministros precisaram sair em defesa da responsabilidade fiscal do governo, embora evitando comentar publicamente se haveria uma revisão. Argumentavam que a prioridade do governo seria aprovar medidas que aumentassem a arrecadação.

Como mostrou a Folha, integrantes do governo passaram a discutir o envio ao Congresso Nacional de mensagem com a revisão da meta de déficit zero das contas públicas. Ainda segundo integrantes do Palácio, a meta em debate seria de 0,5% para 2024. Mas pode ser reavaliada.

Na segunda-feira (30), Haddad evitou cravar a manutenção do alvo de zerar e disse que poderia antecipar medidas de arrecadação de receitas previstas para o próximo ano para perseguir o ajuste fiscal.

Questionado diversas vezes por jornalistas sobre a manutenção ou não do alvo de déficit zero, o titular da Fazenda não foi assertivo. "A minha meta [está] estabelecida. Vou buscar o equilíbrio fiscal de todas as formas justas e necessárias para que tenhamos um país melhor", disse.

Na ocasião, Haddad negou descompromisso do presidente com a situação fiscal do país e disse que Lula não está sabotando a meta de zerar o déficit em 2024, mas constatando dificuldades por problemas de arrecadação herdados de governos anteriores.

ENCONTRO COM PACHECO

No fim da tarde, Lula recebeu o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para uma reunião no Palácio do Planalto. Interlocutores apontam que os dois trataram da agenda econômica, da mesma forma como o mandatário havia feito encontro com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dois dias antes.

Pacheco se dispôs a ajudar o governo com o avanço da agenda de Fernando Haddad. Na próxima terça-feira (7), está prevista a votação da reforma tributária na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, primeiro passo antes da votação no plenário -- prevista para o dia seguinte.

Lula ainda teria pedido apoio para a votação da proposta que trata da taxação das offshores, além da medida provisória que trata da subvenção do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).

Esse foi o primeiro encontro dos dois, após a derrota imposta pelo Senado ao governo, com a derrubada da indicação de Igor Roque para a Defensoria Pública da União. Desde então, Lula tem dito que iria buscar estreitar novamente a relação com o presidente do Senado.

Logo após o encontro com Pacheco, Lula retornou ao Palácio da Alvorada, a residência oficial, para um novo encontro com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

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