Descrição de chapéu Congresso Nacional Eletrobras

Pacheco articula federalização da Cemig para abater dívida de Minas com União

Codemig e Copasa também integrariam plano; medida daria ao governo federal nova estatal de energia

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Brasília

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), articula uma proposta de federalização das empresas estatais de Minas Gerais, incluindo a Cemig (energia), como forma de abater a dívida do governo estadual com a União, que já beira os R$ 160 bilhões.

O plano também inclui a transferência da Codemig (mineração de nióbio) e da Copasa (saneamento) para as mãos do governo federal.

O tema já foi discutido em duas reuniões com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, ex-senador pelo estado, também participa das negociações.

O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), articula plano para federalizar estatais de Minas Gerais - Edilson Rodrigues - 14.set.2023/Agência Senado

Segundo interlocutores de Pacheco, o presidente do Senado deve apresentar em breve uma minuta com a formalização da proposta para Lula.

Integrantes do alto escalão do governo consideram a situação financeira de Minas extremamente delicada. Por isso, o Executivo tem demonstrado disposição em sentar à mesa para discutir o tema.

A proposta de federalização das empresas —inclusive da Cemig, considerada uma espécie de joia da coroa entre os ativos do estado— iria ao encontro de interesses tanto de Pacheco quanto de Lula.

O presidente do Senado é apontado nos bastidores como um possível nome para concorrer ao governo do estado em 2026. Uma articulação bem-sucedida para resolver a situação financeira de Minas Gerais, sem a necessidade de espremer salários de servidores ou gastos locais, seria um trunfo para Pacheco em eventual campanha.

Lula, por sua vez, voltaria a ter sob seu comando uma estatal de peso no setor de energia elétrica.

O petista já criticou diversas vezes a privatização da Eletrobras, demonstrou interesse em reverter a operação e tenta ampliar o poder de influência da União sobre a companhia privada em uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal).

A Cemig é uma empresa criada e controlada pelo governo de Minas Gerais (que detém 50,97% das ações com direito a voto), mas possui investimentos de alcance nacional.

Ela é responsável pela operação de usinas em seis estados (Ceará, Espírito Santo, Goiás, Rio de Janeiro, Santa Catarina, além de Minas Gerais) e atua em diferentes elos da cadeia (incluindo geração, transmissão e distribuição). A companhia ainda tem participação na Norte Energia, dona de Belo Monte.

Procurado, o Ministério da Fazenda disse que "o processo que trata do assunto está em análise pelo Tesouro Nacional".

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), propôs a privatização das empresas como forma de credenciar o estado a aderir ao socorro federal no âmbito do RRF (Regime de Recuperação Fiscal), mas enfrenta resistência da oposição na Assembleia Legislativa.

Em outubro, o governo estadual adaptou sua estratégia e encaminhou um ofício ao Ministério da Fazenda propondo a federalização da Codemig. Ainda não houve retorno do governo federal, com quem Zema tem mantido relação protocolar. O governador apoiou a candidatura de Jair Bolsonaro (PL) à reeleição.

Nesse contexto, Pacheco tem buscado maior protagonismo nas negociações. O estado precisa de uma solução rápida. A liminar judicial que garantiu a adesão ao RRF e suspendeu a cobrança das dívidas expira no próximo dia 20 de dezembro.

Sem a proteção do regime, o serviço da dívida de Minas Gerais programado para 2024 sairia de R$ 4,4 bilhões para R$ 18,4 bilhões, valor considerado inconciliável com a demanda por políticas públicas e o pagamento de salários.

Na quinta-feira (16), Pacheco recebeu o ministro Alexandre Silveira e parlamentares de Minas Gerais. Em pronunciamento após a reunião, ele defendeu a cessão de ativos como forma de reduzir a dívida do estado.

"Minas tem os ativos empresariais, inclusive da Codemig, sobretudo o nióbio e a exploração dele em Araxá, que é um ativo muito considerável, que deve ser valorado dentro do que realmente ele vale, sem uma subvalorização. E essa é uma pretensão que nós devemos ter nessa negociação junto à União", disse Pacheco.

Embora não tenha mencionado diretamente a Cemig e a Copasa, interlocutores afirmam que as duas companhias também entrariam no plano de federalização.

Segundo pessoas que acompanham as discussões, a intenção de Pacheco é viabilizar um acordo em que a União pague o "preço justo" pelas companhias.

Para essa ala, privatizá-las derrubaria seu valor de mercado e renderia ganhos menores ao estado. O grupo também tem a expectativa de que o governo federal estime os valores levando em consideração o "caráter de ajuda" ao estado.

Avaliações preliminares do estado indicam que a Codemig valeria de R$ 25 bilhões a R$ 30 bilhões, mas técnicos do governo federal se mostram mais céticos quanto a esses valores. A Cemig tem um valor de mercado próximo a R$ 30 bilhões.

Na minuta a ser entregue por Pacheco a Lula, deve constar ainda uma cláusula de preferência para que o estado de Minas Gerais possa recomprar os ativos, caso a União decida se desfazer das ações no futuro.

Silveira, do MME, disse em nota à Folha que as soluções apresentadas até agora por Zema são muito mais voltadas a "criar espaço de governabilidade" do que para resolver o problema das finanças estaduais e defendeu Pacheco como "grande figura para protagonizar" a relação entre Minas Gerais e o governo federal.

"O presidente Lula destacou para mim e para o presidente Rodrigo, sexta-feira passada, que está completamente aberto a resolver o problema de Minas Gerais, desde que seja uma solução definitiva para o estado, para mineiras e mineiros se livrarem desse grande preço que a dívida pública do Estado", disse o ministro.

"A proposta de manter empresas públicas e estratégicas, em especial do setor elétrico, em regime de empresa pública é essencial. A maioria das concessões dos estados foram feitas com contratos frouxos e que infelizmente colocaram o setor estratégico, como o elétrico, muito fragilizado."

Eventual federalização de estatais mineiras dependerá da aprovação de projetos de lei no Congresso Nacional e também na Assembleia Legislativa.

Procurado, o governo de Minas Gerais encaminhou um vídeo gravado nesta quinta (16) pelo governador em exercício, Professor Mateus (Novo), no qual ele indica maior flexibilidade do estado para discutir o tema.

"Recebi a notícia de que foram discutidas as federalizações das nossas estatais", disse. "São todas ideias que são muito bem recebidas pelo governo de Minas, e eu, como governador em exercício, fico feliz de ver que tantos se somam a esse nosso esforço."

A proposta de federalização, porém, não é unânime. O deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), por exemplo, defende a permanência das estatais sob controle dos mineiros. "Elas geram mais de R$ 2 bilhões de dividendos ao estado, além de serem estratégicas", diz. Ainda assim, ele apoia a tentativa de trazer algum alívio às finanças do estado.

Procuradas, Cemig e Copasa afirmaram apenas que o tema está sendo conduzido pelo acionista controlador (governo estadual). A Codemig não respondeu até a publicação.

O presidente do Senado também negocia a possibilidade de Minas entregar à União créditos de valores a receber das indenizações de mineradoras pelos desastres ambientais de Mariana e Brumadinho. O governo federal arrecadaria os valores (abatendo da dívida mineira), sob o compromisso de fazer investimentos na região.

Pacheco ainda pleiteia uma espécie de desconto da União nas dívidas, traçando um paralelo com as renegociações de dívidas tributárias autorizadas pelo Congresso Nacional.

"Assim como há muita boa vontade do Estado brasileiro em resolver problemas de contribuintes privados, como há com o Refis, como há com as transações tributárias, como há agora recentemente com o projeto do Carf, que prevê desconto de juros e multas para pagamento da dívida, há disposição da União também de um programa que possa favorecer os estados da federação? Não só Minas Gerais, [como] Rio de Janeiro, Goiás, São Paulo, Rio Grande do Sul, que passam pelo mesmo problema", argumentou Pacheco.

"Essa também é uma proposta que eu considero absolutamente justa, honesta, para prever que, após a dação e o pagamento em ativos e créditos possa esse saldo ser objeto de uma redução para pagamento num prazo de dez anos", afirmou.

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