Descrição de chapéu Energia Limpa

Entenda por que não só de matriz energética suja é feito um país poluidor

Desmatamento e agricultura, principalmente no Brasil, também causam aquecimento global

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São Paulo

Nem só de uma matriz energética suja é feito um país poluidor. Os saldos de emissões de gases de efeito estufa (GEE) incluem também os gases liberados por animais, solos e árvores –principalmente aquelas destruídas.

O Brasil é um bom exemplo disso: a maior parte das emissões de GEE do país vem do desmatamento, inserido em relatórios técnicos no setor "uso da terra, mudança do uso da terra e florestas".

Ilustração

Explica-se. As árvores em crescimento, por meio da fotossíntese, absorvem mais CO₂ do que emitem, e essa quantidade de carbono fica estocada na biomassa. Mas esse CO₂ volta para a atmosfera quando as árvores apodrecem, seja de forma natural ou por efeito de queimadas, que também geram CO₂. Além disso, a mudança do uso da terra (novo sistema que será implantado após o desmate, como um pasto) também pode emitir CO₂.

O volume de gases liberados nesse processo é tão grande que 38% do total de gases emitidos pelo Brasil em 2020 vieram dele. São 637 milhões de toneladas de CO2 equivalente, medida que engloba em um só número, e proporcionalmente, as emissões de todos os gases de efeito estufa –o valor é superior às emissões da Turquia naquele ano.

Além disso, outros 28,5% das emissões brasileiras vêm da agricultura. Nesse caso, o principal fator é a fermentação entérica dos gados –esses animais emitem metano (CH₄) na atmosfera, principalmente pelos arrotos e flatulências. O metano é 27 vezes mais prejudicial para o meio ambiente do que o CO2 em cem anos, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), da ONU.

Na agricultura, ainda são fatores de emissões a aplicação de fertilizantes nitrogenados no solo, o manejo incorreto de estrume, a gestão incorreta do solo e de pastagens e o cultivo de arroz –este último libera metano na atmosfera.

Só depois desses dois setores a energia aparece como principal poluidora no Brasil (23,2%).

Mas o contexto brasileiro é quase único entre os grandes poluidores. Entre os onze maiores emissores de GEE do mundo, apenas a Indonésia tem perfil semelhante ao do Brasil. No país asiático, 50% das emissões em 2019 vieram do uso da terra (desmatamento incluído).

Globalmente, a história é outra, e é justamente por isso que, para muitos, quando se pensa em poluição a primeira imagem que se vai na cabeça é uma fumaça preta saindo da chaminé de algum parque industrial.

Segundo o IPCC, 34% das emissões globais de gases de efeito estufa saem da indústria. Parte das emissões do setor é liberada na própria produção industrial, como queimas, mas outra parte importante vem do consumo de energia suja, como carvão e gás natural, que junto com petróleo são os combustíveis responsáveis pelas maiores emissões de GEE no mundo.

"Há indústrias que são muito intensivas em energia, principalmente em energia fóssil, como a siderurgia, a metalurgia pesada e a de cimento. A indústria emite muito porque usa energia fóssil", explica Eduardo Viola, professor de relações internacionais do Instituto de Estudos Avançados da USP e da FGV.

Apenas 14% da matriz energética –que considera todos os usos de energia, como acender a luz, movimentar um carro e operar um parque industrial– do mundo vem de fontes renováveis. Segundo o site Our World in Data, da Universidade de Oxford, a fonte mais consumida hoje é o petróleo (31,6%), seguido de carvão (26,7%) e gás natural (23,5%).

Já no Brasil, de acordo com a Empresa de Pesquisa Energética, 45% da matriz energética brasileira vem de fontes renováveis, sendo que a matriz elétrica –que considera apenas a produção de energia elétrica– é mais de 80% limpa (contra 28% de todo o mundo).

Não à toa, no Brasil, a principal forma de reduzir as emissões no setor industrial é a partir de inovação tecnológica para que a produção emita diretamente menos gases de efeito estufa. O mercado de carbono, hoje discutido no Congresso, por exemplo, é um instrumento para essa redução.

Já no setor de transportes, responsável por 15% das emissões globais de GEE, a solução passa pela substituição dos combustíveis fósseis por eletricidade –desde que com fonte limpa. "A matriz energética do Brasil não é uma matriz limpa, mas a matriz elétrica, sim. Quase 90% da eletricidade produzida no Brasil é com energia hidráulica, solar, eólica e biomassa, então, um carro elétrico circulando no Brasil emite pouquíssimo, mas um carro elétrico circulando na China emite muito, porque 60% da eletricidade de lá vem do carvão", diz Viola.

A indústria automobilística brasileira também defende o uso de etanol como alternativa ao petróleo, ainda que sua queima emita CO2 (em condições menores).

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