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Indústria, transportes, desmatamento: veja quem são os maiores emissores de CO2 do mundo

Presença de gases poluentes na atmosfera aumenta ano após ano, reduzindo as chances de que metas globais sejam atingidas

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São Paulo

As emissões de gases de efeito estufa de 2023 sequer terminaram de ser computadas e já é dado como certo que o mundo baterá um novo recorde.

No momento em que mais se fala em transição energética e crise climática, países continuam jogando, ano após ano, mais carbono na atmosfera, sem que as medidas de remoção consigam equilibrar o impacto no planeta.

Diante desse cenário, especialistas dizem que não há a menor possibilidade de as metas globais serem atingidas a tempo. Ou seja, na trajetória em que estamos, o mundo não vai conseguir cortar as emissões em 45% até 2030, nem zerá-las até 2050 a ponto de conseguir limitar o aquecimento da atmosfera a no máximo 1,5º acima da média da era pré-industrial.

Horizonte da cidade de Los Angeles, nos EUA, envolvido em forte poluição atmosférica - Mark Ralston/AFP

O principal responsável pelo aumento contínuo dos gases de efeito estufa são os combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, queimados para gerar eletricidade e energia para transporte, por exemplo, ou aquecimento.

Mas os setores que usam essa energia e, portanto, fazem a "emissão final" são diversos. De acordo com o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima), as indústrias respondem por 34% do carbono global, resultado de atividades intensivas como siderurgia, produção de cimento, químicos, entre outros.

Também ligado aos fósseis, o setor imobiliário é responsável por 16% das emissões de gases de efeito estufa. Boa parte dessa pegada ambiental vem da geração de eletricidade e aquecimento, o que está diretamente relacionado à matriz energética dos países.

Só os edifícios residenciais contribuem com 11% desse total, enquanto os outros tipos de construções respondem por 5,9%.

Quase empatado com os edifícios aparece o setor de transportes, que emite 15% do carbono do mundo, segundo o IPCC. Carros, caminhões e outros veículos terrestres contribuem com 10% dos gases, enquanto os navios emitem 1,3%, e os aviões, 1,1%.

No entanto, a queima de combustíveis fósseis, sozinha, não explica todo o cenário de emissões de carbono. A agricultura e o uso da terra respondem por 22% dos gases de efeito estufa do mundo. A maior parte vem do desmatamento (11%), seguido pela fermentação entérica —o famoso "arroto do boi"—, que contribui com 5%.

No debate climático, os dados do IPCC são considerados os mais qualificados, por serem baseados em órgãos oficiais dos países e instituições independentes.

Os valores das emissões, contudo, podem ser diferentes dos que são compilados por outras entidades. O levantamento do IPCC, por exemplo, indica que 60 gigatoneladas de gases de efeito estufa estão sendo jogadas na atmosfera anualmente (cada gigatonelada equivale a 1 bilhão de toneladas ou 1 trilhão de quilos).

Já o relatório do WRI (World Resources Institute), que é feito com base em informações da IEA (Agência Internacional de Energia), aponta para uma emissão na casa das 47,5 gigatoneladas.

Outra diferença é em relação às emissões feitas por cada atividade. Os valores mudam a depender da metodologia, da categorização dos setores ou da fórmula de conversão dos gases em carbono equivalente (carbono equivalente é uma forma de representar os diferentes gases de efeito estufa como se fossem todos gás carbônico, com base em seus efeitos poluentes).

Também é comum ver subdivisões diferentes. Algumas organizações fazem uma desagregação maior dos dados, outras agrupam mais. O relatório do WRI, por exemplo, detalha emissões de setores como tabaco e indústria têxtil.

Paulo Artaxo, membro do IPCC e pesquisador da USP, diz que essas variações são naturais, já que cada instituição considera seus próprios fatores. "Isso é até benéfico, porque mostra que não é uma ciência exata", diz. "Depende dos critérios, é uma questão complexa, dinâmica, que muda de ano para ano", acrescenta.

Artaxo lembra também que o IPCC não faz ciência, mas compila a produção científica feita por grupos, universidades e institutos de pesquisa.

Geralmente, as instituições que fornecem as informações para os relatórios de emissão do Painel são órgãos governamentais, visto que cada país é obrigado, de acordo com a Convenção do Clima, a enviar seus inventários a cada dois anos.

"Mas cada país pode distorcer seus dados de emissão por interesses políticos. Para isso é que existem os órgãos independentes, como o Global Carbon Project, a IEA, o Berkeley Earth Group, na Califórnia", elenca. O IPCC fica responsável por verificar a qualidade dessas informações e utilizar o melhor valor para cada parâmetro.

No Brasil, o órgão que reporta oficialmente as emissões é o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, por meio do Sirene (Sistema de Registro Nacional de Emissões). Uma das instituições independentes é o Seeg (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa), vinculado ao Observatório do Clima.

Mundo já tem o necessário para fazer transição

Os gases de efeito estufa atuam na atmosfera de forma semelhante a um "vidro", retendo a energia solar e o calor irradiado pela superfície da Terra.

O CO2 (dióxido de carbono) é o principal gás de efeito estufa, respondendo por 75% das emissões. A lista também inclui o metano (18%), o óxido nitroso (4%) e os gases fluorados (2%).

Em 2015, no Acordo de Paris, os países concordaram em limitar o aquecimento global a um nível muito abaixo de 2ºC em relação aos níveis pré-industriais. Segundo o IPCC, o mundo já aqueceu 1,1ºC desde o início do século 20, efeito principalmente das emissões provenientes de atividade humanas.

Cada fração adicional de grau traz riscos para o meio ambiente e pessoas, como ondas de calor e escassez de alimentos.

Observando o perfil das emissões globais, fica claro qual o principal problema a ser enfrentado.

"Nossa prioridade top um no nível global é parar de queimar combustíveis fósseis", afirma David Tsai, coordenador do Seeg. "Um dos objetivos da transição energética é sair dessa dependência", acrescenta.

Artaxo do IPCC concorda, acrescentando que também é preciso zerar o desmatamento de florestas tropicais no mundo todo, não só no Brasil, e reduzir drasticamente o nível de consumo de bens de consumo.

"Se quisermos zerar as emissões de gases de efeito estufa até 2050, o IPCC deixa muito claro que nós temos todas as tecnologias hoje para fazer isto. Não precisamos desenvolver absolutamente nada de novo", diz.

Tudo isso depende, ele diz, de políticas públicas que forcem as empresas a reduzir suas emissões —algo que não está acontecendo. Prova disso é que as emissões continuam aumentando entre 2% a 4% ao ano.

"Não existe a menor possibilidade no cenário atual de atingir as metas de redução de emissões de gás de efeito estufa. Nem para 2030, nem para 2050. Nós estamos indo por uma trajetória de aumento da concentração de gás de efeito estufa que vai nos levar a um aquecimento da ordem de 3°C a 3,5ºC", afirma Artaxo.

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