Governo vai criar sistema de alerta com inteligência artificial para desarmar precatórios

Planejamento mapeou tipos e causas de despesa; gestão Lula diz que meteoros, como chamou Guedes, não acabaram

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

Para evitar no futuro novos "meteoros" de precatórios, o governo vai criar um sistema de alertas para corrigir os problemas que têm levado ao aumento explosivo, nos últimos dez anos, desses valores devidos a empresas e pessoas físicas após sentença definitiva da Justiça.

O Ministério do Planejamento já fez uma mapeamento preliminar dos tipos e causas das despesas com precatórios e agora, com apoio da AGU (Advocacia-Geral da União), pretende utilizar inteligência artificial para fazer um sobrevoo ainda mais detalhado sobre os precatórios para corrigir os erros de política pública, administrativos e de defesa da União que fazem essa fatura ser a cada ano maior.

O governo também quer reforçar o controle de fraudes que podem estar alimentando o que tem sido chamado de indústria de precatórios.

Gustavo Guimarães, secretário-executivo do Ministério do Planejamento, em seu gabinete
Gustavo Guimarães, secretário-executivo do Ministério do Planejamento, em seu gabinete - Pedro Ladeira/Folhapress

O diagnóstico da área econômica é que o pagamento pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de R$ 93 bilhões em precatórios atrasados, no final do ano passado, não acabou com o problema fiscal gerado pelo crescimento explosivo deste tipo de despesa ao longo dos últimos anos.

"É como se fosse aquele avião abaixo do radar, só que os meteoros estão vindo e não estávamos mapeando", disse à Folha o secretário-executivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Guimarães.

A palavra "meteoro" para precatórios foi usada pela primeira vez, em meados de 2021, pelo então ministro da Economia, Paulo Guedes, após receber uma fatura de R$ 89 bilhões do Judiciário para pagar em 2022.

Como era ano de eleições e o governo Jair Bolsonaro (PL) queria aumentar o valor do Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família), o Congresso acabou aprovando uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que pedalou parte dessas despesas até 2027.

O texto foi chamado de PEC do Calote. O governo Lula costurou um acordo com o STF (Supremo Tribunal Federal) que permitiu a quitação dos precatórios fora dos limites das regras fiscais. O pagamento dos atrasados ficou conhecido como despelada dos precatórios.

Segundo Guimarães, na segunda etapa, com o uso da inteligência artificial, o governo vai analisar os precatórios com um olhar micro.

"Por que estamos perdendo tantos precatórios em BPC [benefício de prestação continuada], por exemplo, as causas? Onde a União está perdendo? Está concentrado num lugar", disse. "A gente sabe que nas nas regiões pequenas o advogado nem vai, já perdeu", ressaltou.

Como essas sentenças já definitivas são muito pulverizadas, valores abaixo de R$ 10 milhões, principalmente relativos a ações perdidas contra o INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) acabavam ficando fora dos riscos fiscais que o governo é obrigado a mapear todos os anos e enviar ao Congresso.

"Se olharmos o histórico desde 2020, o meteoro não acabou. A solução não virá via regra fiscal nem deveria ser", disse Guimarães.

No ano passado, o Ministério da Fazenda chegou a propor uma regra para permitir classificar parte dos precatórios como despesa financeira de forma definitiva. Após críticas generalizadas, a proposta não avançou.

A medida permitiria ao Executivo ampliar os pagamentos sem estourar os limites do novo arcabouço fiscal nem precisar mudar as metas fiscais já sinalizadas pela equipe econômica.

Guimarães disse que o acordo com o STF deu tempo para o governo enfrentar o problema com melhores armas para não comprometer a sustentabilidade futura do arcabouço fiscal. O sistema vai funcionar como uma espécie de sinal de alerta só que acompanhado de medidas corretivas.

Segundo o secretário, o diagnóstico continua em andamento, mas permitiu constatar que o pagamento de precatórios constitui em muitos casos a última consequência de políticas públicas mal formuladas.

O aprofundamento dos estudos será realizado no âmbito do Comitê de Monitoramento e Acompanhamento dos Riscos Fiscais Judiciais, com o Ministério da Fazenda e com a AGU.

"A partir dessas análises queremos identificar as principais teses jurídicas que têm resultado em pagamento de sentenças judiciais, atuando na origem para evitar o problema, solucionando pela via administrativa ou propondo aperfeiçoamentos legislativos", afirmou.

Por exemplo, se há uma grande concentração de precatórios questionando um ponto específico da concessão do BPC, pago a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, o governo pode propor mudanças na legislação. Ou mesmo corrigindo problemas de pente-fino mal feito pelo governo, que interrompe o pagamento dos benefícios, mas que pode acabar se tornando um precatório mais à frente.

Em 2024, o valor das despesas com pagamento de precatórios e as chamadas RPV (requisição de pequeno valor) é de R$ 86 bilhões.

De um total de R$ 57 bilhões de precatórios, R$ 18 bilhões são de sentenças contra o INSS e R$ 8,2 bilhões relacionados a despesas de pessoal do governo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.