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Desoneração da folha deixa de valer neste ano se não houver compensação, dizem governistas

Fazenda é alvo de críticas desde anúncio da MP que restringiu o uso de créditos de PIS/Cofins

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Brasília

Diante do diagnóstico da cúpula do Congresso de que a MP (medida provisória) que compensa a desoneração da folha enfrenta resistências para ser aprovada, integrantes do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmam que a prorrogação do benefício aos 17 setores favorecidos ficará sem efeito, caso a solução não seja aceita.

Membros do governo e da base aliada no Congresso dizem que a MP foi a saída encontrada para viabilizar a desoneração e que, para substituí-la, deputados, senadores e setores afetados devem apresentar uma alternativa.

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Lula e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad - Pedro Ladeira - 28.mai.2024/ Folhapress

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que foi avisado anteriormente da medida, relatou a um ministro que a MP dificilmente seria aceita pela Casa. Como mostrou a Folha, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), também havia feito o mesmo diagnóstico ao governo e reclamou de não ter sido consultado previamente.

Desde o anúncio da MP que restringiu o uso de créditos de PIS/Cofins, na última terça-feira (4), o Ministério da Fazenda foi alvo de uma enxurrada de reclamações de associações setoriais e de frentes parlamentares, que pedem a devolução da medida ao Executivo.

Integrantes da equipe econômica afirmam que o envio da medida cumpre a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) de 17 de maio, que exigiu a apresentação de uma compensação para a desoneração da folha em até 60 dias. Restam 39 dias do prazo estabelecido.

Além disso, técnicos do governo argumentam que parte dos setores que estão reclamando nem sequer são atingidos pela mudança nas regras. Seria o caso, segundo essas fontes, de boa parte da indústria.

O mais afetado é o agronegócio, que vai precisar seguir regras mais rígidas para compensação dos tributos pagos sobre insumos na cadeia e não poderá se ressarcir de créditos presumidos, uma espécie de valor fictício concedido como benefício fiscal.

Reportagem da Folha mostrou que a proposta azedou os ânimos de empresários com o governo e foi avaliada como uma demonstração de que a atual gestão está disposta a tirar dinheiro de onde puder para não cortar gastos.

Integrantes da Fazenda e do Planalto afirmam que o governo vai abrir o diálogo setor por setor, mostrando os números para tentar convencer que alguns deles não serão atingidos pela medida.

O governo prevê arrecadar até R$ 29,2 bilhões com a MP, valor mais do que suficiente para bancar a desoneração da folha para empresas de 17 setores e de municípios com até 156 mil habitantes —cuja renúncia é estimada em R$ 26,3 bilhões.

Parlamentares ouvidos pela reportagem dizem que a desoneração é um pleito do Congresso e que o governo precisa apresentar uma fonte de compensação. Dessa forma, caso os deputados e senadores rejeitem a MP, caberá a eles oferecer uma alternativa —ou acabar com a desoneração.

"O governo está apresentando uma fonte para cobrir a desoneração. Se essa fonte não vale, o Congresso precisa responder a seguinte pergunta: qual é a fonte para cobrir? Se não tiver fonte, não vai conseguir viabilizar a desoneração. Isso é uma decisão do Supremo, não é o governo que está dizendo. O governo está só cumprindo a decisão do STF", diz à Folha o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP).

Segundo Randolfe, o governo está sempre aberto para o diálogo e "não há razão para crise". "Se tiver outra fonte e tiver exequibilidade, a gente conversa. O governo quer viabilizar a desoneração, quer cumprir, mas tem que dizer de onde vai sair."

Por outro lado, há reclamação de parlamentares, inclusive no Senado. A senadora Tereza Cristina (PP-MS), líder do Progressistas, defende que a MP nem seja discutida. "O que precisa fazer é devolver a MP", afirmou. Esta hipótese, porém, é rechaçada por integrantes do governo.

Presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), o deputado Pedro Lupion (PP-PR), afirma que os setores estão mobilizados para derrotar a medida. "Não existe emenda que salve o texto, é só a devolução dele", diz.

Pacheco encomendou um parecer à consultoria da Casa sobre o tema e ainda não se manifestou.

Lira, por sua vez, pediu explicações sobre a medida à Fazenda. Segundo relatos, o presidente da Câmara disse a uma pessoa próxima que a proposta não foi negociada previamente com ele e que não sabia de antemão do teor da MP. Por isso acionou a pasta comandada por Fernando Haddad.

A interlocutores, o deputado avaliou ser difícil que a MP consiga reunir votos suficientes para ser aprovada na Casa. Ele também relatou já ter recebido diversas ligações de representantes de diferentes setores questionando a viabilidade da proposta.

Cardeais do Senado, como o ex-presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e o líder do MDB, Eduardo Braga (AM), conversaram pessoalmente com o ministro da articulação política, Alexandre Padilha, nesta quinta-feira (6) e relataram que o incômodo do empresariado tem chegado ao Congresso.

Braga evitou criticar o teor da medida provisória publicamente e se limitou a dizer que não tinha sido avisado pelo governo do conteúdo.

"O que nós queremos fazer com responsabilidade é analisar com profundidade o que foi apresentado. Agora, nós estamos preocupados? Estamos. Tanto que a medida foi pedir à consultoria-geral do Senado que providenciasse um parecer fundamentado sobre a matéria", disse a jornalistas.

Nesta quinta, a Coalizão de Frentes Parlamentares, que reúne representantes de 27 frentes, defendeu que Pacheco devolva a medida provisória e apelidou a iniciativa de "MP do fim do mundo".

Caso não seja possível, afirmou o grupo em nota, que, então, a medida seja colocada em regime de urgência para que o Legislativo possa rejeitá-la, "cessando sua vigência de forma imediata".

Vice-líderes do governo na Câmara, por sua vez, reconhecem que a medida enfrenta grande resistência no parlamento e em setores, mas avaliam ser possível costurar um meio-termo para que ela seja aprovada.

ENTENDA O QUE MUDOU

Crédito do PIS/Cofins em geral

Serão compensáveis apenas na sistemática da não cumulatividade, sem compensação com outros tributos ou cruzada, exceto com débitos do próprio PIS/Cofins. Mantém-se a possibilidade de ressarcimento em dinheiro, mediante prévia análise do direito creditório.

Crédito presumido de PIS/Cofins

Espécie de benefício fiscal concedido a empresas. Leis mais recentes já vedam o ressarcimento em dinheiro, impedindo a tributação negativa ou subvenção financeira para setores contemplados, mas em oito casos a autorização permanecia.

A MP estende a vedação ao ressarcimento para os oito casos que permaneceram e que representaram R$ 20 bilhões pleiteados em 2023. Não se altera a possibilidade de compensação na sistemática da não cumulatividade, ou seja, o direito permanece, desde que haja tributo a ser pago pelo contribuinte.

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