Crise entre Poderes pode afetar avanço da pauta econômica na Câmara

Votações de projetos foram adiadas após insatisfação com decisões sobre emendas; líderes avaliam que Lira quer apresentar reforma tributária como legado

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Brasília

O avanço da pauta econômica do governo Lula (PT) na Câmara poderá ser afetado diante do clima de insatisfação dos deputados com os Poderes Executivo e Judiciário, segundo avaliação de líderes partidários da Casa.

Dois projetos de lei de interesse do governo federal que estavam previstos para serem votados nesta semana foram adiados por decisão dos deputados: a conclusão da votação do segundo projeto de lei de regulamentação da reforma tributária e o projeto que cria o programa Acredita, que estimula o crédito para empreendedores e famílias de baixa renda.

A decisão do ministro Flavio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), de paralisar as emendas parlamentares, chancelada pela corte, e o indicativo de que o governo federal poderá retirar o regime de urgência de um projeto da regulamentação da reforma tributária no Senado geraram contrariedade na cúpula da Câmara.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente da Câmara, Arthur Lira - Gabriela Biló/Gabriela Biló - 18.abr.2023/Folhapress

Há uma avaliação entre deputados de que esse movimento de Dino tem respaldo de integrantes do governo federal. O magistrado é aliado de Lula e foi ministro de Segurança Pública do governo até ser indicado pelo petista para ocupar uma vaga na corte no ano passado.

A conclusão da votação da regulamentação do novo sistema de impostos é a principal prioridade do Executivo no Congresso neste ano. Já o Acredita precisa ser votado até o próximo dia 20, quando a MP (medida provisória) enviada pelo governo perde a validade.

Por causa das eleições municipais, a Câmara não realizará sessões na próxima semana. Dessa forma, os projetos podem voltar ao plenário na semana do dia 26, quando haverá novo esforço concentrado dos parlamentares.

Na avaliação de um cardeal do centrão, no entanto, ainda não há garantia de que os temas sejam apreciados neste mês. Ele diz que o clima hoje é para não aprovar nada de interesse do Executivo, mas pondera que a situação pode mudar a depender das negociações que ocorrerem nos próximos dias entre os três Poderes em busca de soluções para distensionar o clima —principalmente um desfecho para destravar o pagamento das emendas.

Ele também ressalta que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e Lira mantêm uma boa relação de diálogo, e que isso pode ajudar a destravar a pauta.

Na quarta, poucas horas após a decisão de Dino de suspender todas as emendas impositivas apresentadas por deputados e senadores, a cúpula da Câmara resolveu adiar a votação dos destaques do projeto da tributária que estavam previstos para aquele dia.

A proposta trata das regras do Comitê Gestor do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) de estados e municípios que será criado pela reforma.

Mais cedo naquele mesmo dia, Haddad indicou que o governo poderá solicitar a retirada do regime de urgência do projeto que regulamenta o novo sistema de impostos, que foi aprovado em julho na Câmara e agora está no Senado. O regime de urgência prevê que a Casa deve deliberar sobre o tema em até 45 dias —caso contrário, a pauta ficará travada.

Se a urgência for retirada para atender ao pedido dos senadores, isso poderá gerar novo ruído com os deputados, dizem dois líderes ouvidos pela reportagem.

O relator do projeto no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), afirmou à imprensa, ao lado de Haddad, que a votação da matéria na Casa poderia ficar para dezembro, após as eleições municipais.

De acordo com relatos, o próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), reclamou com líderes e com o próprio Haddad sobre essa possibilidade. Lira relatou a interlocutores que o ministro disse a ele preferir que a urgência fosse mantida. O deputado, porém, vê Haddad minado por interesses de senadores que defendem a tramitação mais lenta da proposta.

O presidente da Câmara fez questão de deixar claro o descontentamento com essa hipótese, que pode piorar ainda mais a relação da Casa com o governo, num momento em que já há atritos em razão do impasse em torno das emendas.

Um cardeal do centrão diz que isso representaria uma desmoralização da Câmara e, principalmente, do presidente da Casa, uma vez que os deputados acordaram com o governo o regime de urgência. E, segundo esse parlamentar, seria mais um não cumprimento de acordos por parte do Executivo e uma sinalização de desprestígio dos deputados ao favorecer o pleito dos senadores.

Apesar disso, líderes avaliam que Lira quer apresentar como legado de sua gestão a conclusão da reforma tributária, já que desde o começo da tramitação ele tem se colocado como uma espécie de fiador da proposta. Dessa forma, acreditam que isso deverá ocorrer até dezembro —mas não descartam que as negociações poderão se alongar.

O projeto que cria o Acredita foi enviado originalmente como uma MP, mas diante do impasse do rito de tramitação dessas matérias no Congresso, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), apresentou um projeto de lei com o mesmo conteúdo.

Lira sinalizou a interlocutores, no entanto, que essa não é uma prioridade dos parlamentares neste momento. Na avaliação do alagoano, de acordo com relatos, o projeto não tinha a necessidade de ter sido enviado como medida provisória e, por isso, não cabe à Câmara atender a esse prazo.

Além de não avançar com pautas econômicas de interesse do Executivo, líderes da Casa também dizem que uma resposta ao governo federal poderá vir por meio da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), que define os parâmetros para elaborar e executar o Orçamento do ano seguinte.

Nas palavras de uma liderança influente na Casa, é possível "engessar" o governo ao mirar o Orçamento. Em 2023, por exemplo, os congressistas determinaram pontos sobre pagamento de emendas parlamentares que desagradaram o Executivo.

Na semana passada, o deputado Julio Arcoverde (PP-PI), presidente da CMO, afirmou que suspenderia o prazo de leitura do parecer da LDO até que houvesse uma definição sobre a distribuição das emendas. O governo precisa que a LDO seja aprovada até o final do ano, sob pena de não poder executar o Orçamento de 2025.

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