Blocos de Carnaval ganham porte de empresa e faturam o ano todo com folia

Projetos passam a se apresentar em espaços fechados, ministram oficinas musicais e têm equipes fixas

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São Paulo

"Deu R$ 600 de prejuízo para cada um", conta o empresário Gabriel Ribeiro, 40, sobre a turma de amigos que organizou o primeiro cortejo do bloco Agrada Gregos, em São Paulo, em 2016.

Eram paulistanos frequentadores do Carnaval carioca —numa época em que não havia festa de rua na capital paulista. Gestaram a ideia em 2015, ao perceber que o Rio de Janeiro rendia "muito perrengue", como define Ribeiro.

No início, os três organizadores reinvestiam no bloco todo os ganhos do período de Carnaval. "Passamos três ou quatro anos sem lucrar", diz Ribeiro. Hoje, ele e a sócia Nathalia Takenobu se sustentam principalmente com os lucros do projeto. O terceiro amigo deixou a sociedade.

Em 2023, o Agrada Gregos juntou 1 milhão de pessoas, segundo os organizadores, que dizem ser o maior bloco LGBTQIA+ do país.

A Agrada Produções, fundada para gerir o cortejo, organiza um festival de música, uma festa de Halloween, quatro blocos em São Paulo e um em Salvador, no tradicional circuito que vai do Farol da Barra à Praia de Ondina.

De costas para a câmera, homem calvo ergue o braço esquerdo em sinal de regência para um conjunto musical carnavalesco. O ambiente é uma casa de shows
Apresentação do Monobloco no Audio Club, em São Paulo (SP). - Lucas Seixas/Folhapress

Outros blocos também começaram pequenos e se tornaram empresas, remunerando equipes fixas, vendendo produtos próprios e organizando apresentações fora da época de folia.

O Monobloco, um dos maiores do Rio de Janeiro, fez trajeto inverso ao do Agrada Gregos. Em 2000, os cariocas da banda Pedro Luís e a Parede estavam em São Paulo para ministrar uma oficina de samba no Sesc Vila Mariana.

A atividade emendou num cortejo pelos salões do prédio, que inspirou os músicos a fazerem algo semelhante no Rio. "Montamos já com a intenção de virar bloco de Carnaval", diz Pedro Luís de Oliveira, cantor nascido na Tijuca e um dos fundadores.

Os alunos da oficina entraram na banda que tocou no primeiro desfile do Monobloco, em 2001, para dez mil pessoas. Em 2023, foram 300 mil foliões no Rio, segundo estimativa própria.

Em 24 anos de existência, o grupo gravou quatro álbuns de estúdio e dois DVDs. Desde 2016, desfila também no pré-Carnaval de São Paulo. O Monobloco Show, braço de apresentações, toca em festivais, eventos corporativos e festas de aniversário.

"É assustador ver o tamanho que tomou", afirma Pedro Luís. Ele se diz feliz ao lembrar que a banda do cortejo absorveu muitos alunos das oficinas, que seguem acontecendo. Outros montaram seus próprios blocos.

O projeto fatura entre R$ 2 e R$ 2,4 milhões por ano. A equipe, hoje com 12 pessoas, tem produtores, profissionais de mídias sociais, funcionários administrativos e financeiros.

O Então Brilha, de Belo Horizonte, começou com um "trio elétrico" composto por "duas caixas de som acopladas em um triciclo, alimentadas por uma bateria de carro", lembra Mariana Fonseca, designer gráfica e presidente. Foi assim por dois anos, até que o som se tornasse inaudível para a maioria dos foliões.

Assim como o Agrada Gregos, o Então Brilha foi criado por foliões que pulavam Carnaval no Rio de Janeiro. Fundado em 2011, reuniu entre 250 e 400 mil pessoas no ano passado, de acordo com estimativa de Fonseca.

Além do cortejo, o projeto organiza seis ensaios de pré-Carnaval com entrada paga. Também toca em eventos corporativos, casamentos, formaturas, festas de 15 anos e despedidas de solteiro ao longo do ano.

A organização leva uma banda de 12 pessoas aos eventos menores, com sopro, percussão, baixo, guitarra e vocalista. Noventa por cento do faturamento dessas apresentações fica com os músicos.

As principais fontes de renda do bloco para a folia de 2024 são, em ordem decrescente: patrocínio direto —no ano passado, tiveram apoio de O Boticário— venda de produtos e bilheteria.

Só Mariana vive das atividades do bloco, em função da remuneração para o cargo de presidente, fixada ano passado. Ela diz que está nos planos pagar de forma estável os diretores financeiro, de comunicação e de produção.

"Não fosse o bloco, talvez a banda não tivesse sobrevivido", diz o saxofonista Thiago França, do bloco Espetacular Charanga do França, que desfila em São Paulo e surgiu de uma banda homônima, fundada em 2013.

Charangas são grupos musicais que combinam sopro e percussão. No Brasil, se popularizaram tocando em estádios de futebol.

Criado em 2015, o cortejo começou com uma postagem "vem quem quiser" no Facebook, chamando outros músicos a somar. Cresceu, atraindo 50 mil pessoas em 2023, segundo estimativa de França, e foi importante para divulgar as apresentações da banda, hoje mais cheias.

O Charanga do França ensaia na casa noturna Mundo Pensante, cobrando ingresso de R$ 20 após certo horário. O dinheiro arrecadado, tanto nos desfiles quantos nos ensaios, é reinvestido no próprio bloco. Serve também para custear oficinas, que são gratuitas, e para pagar a logística de outros eventos no ano.

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