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estados unidos Rússia

Telefone sem fio eleva tensão sem precedente entre potências

Com espaço aéreo no litoral sírio fechado por poderio antiaéreo russo, aumenta risco de erros

Com roupas camufladas, quatro soldados se perfilam no convés do USS Donald Cook
Marinheiros americanos se perfilam a bordo do destróier USS Donald Cook na saída do navio da base de Lamarca, em Chipre - Alyssa Weeks - 9.abr.18/Marinha dos EUA/Reuters
Igor Gielow
São Paulo

Na Guerra Fria, o confronto entre EUA e União Soviética esteve perto de degenerar durante a crise dos mísseis de Cuba em 1962 e por ocasião das tensões que culminaram em novembro de 1983.

Em ambos os episódios, desinformação, retórica inflamada e cálculos errados de lado a lado quase levaram a uma guerra nuclear.

Na era da comunicação instantânea, um proverbial telefone sem fio parece ter feito Donald Trump lançar uma inacreditável ameaça militar direta a Moscou.

O presidente tuitou que a Rússia deveria "ficar pronta", em resposta à ameaça que Moscou teria feito de derrubar ogivas americanas voando em direção à Síria, ditadura apoiada por Vladimir Putin.

O problema é que o Kremlin não fez bem essa ameaça. Desde março, mentindo ou não, autoridades russas dizem que um ataque químico seria armado por rebeldes para culpar o governo de Bashar al-Assad e justificar uma retaliação americana.

O que se repetiu desde então foi que os russos atacariam os americanos caso algum de seus cerca de 5.000 soldados na Síria fosse alvejado.

Na terça (10), o embaixador russo no Líbano, Alexander Zaspikin, disse à TV do grupo xiita Hizbullah que mísseis rumo à Síria e seus lançadores seriam alvejados.

Ele se referia aos comentários de autoridades russas, mas não falou, ou teve a fala editada, sobre a questão da ameaça a tropas russas. Confusão pronta. O episódio demonstra os riscos em jogo, ainda mais que Trump parece decidido ao ataque.

Nesta quarta (11), uma notificação banal da porção grega do Chipre pedia para empresas aéreas evitarem a área entre a ilha e o litoral sírio até 26 de abril, das 9h às 15h.

Já o motivo era sério: a Marinha russa irá conduzir exercícios de tiro de foguetes e solicitou o uso do espaço aéreo até 20 km de altitude.

Ou seja, haverá fogo antiaéreo em uma das rotas para mísseis subsônicos de cruzeiro lançados pela frota americana ao sul do Chipre ou para caças como os britânicos estacionados na ilha e franceses saindo de casa para reabastecimento —considerando que o Reino Unido e a França estejam com Trump.

Os complicadores se empilham, baseados em um ataque químico que nem está caracterizado como tal ainda ou tem sua autoria definida.

Uma ação pontual não intimidaria Assad, como não aconteceu no ano passado. Uma operação maior e talvez multinacional implicaria declarar guerra ao ditador, e aí o Kremlin terá de lembrar o Ocidente de que está em solo sírio para defender Assad.

Isso sem falar em Israel, que atacou alvos sírios antes de Trump falar na hipótese para marcar posição contra os movimentos do Irã, apoiado por Moscou.

Além da escalada retórica, há espaço para erros. Os americanos podem bombardear tropas russas. Os sistemas S-400 e S-300 que Moscou tem na base de Hmeimin e em navios podem derrubar um míssil Tomahawk que considerem ameaçador e ainda dizer que era um exercício.

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