Ativista dos direitos das mulheres é detida na Arábia Saudita

Escritora foi uma das primeiras a mulheres a dirigir no país; motivo da prisão não foi divulgado

 Hatun al-Fassi, ativista dos direitos civis na Arábia Saudita
Hatun al-Fassi, ativista dos direitos civis na Arábia Saudita - Fahad Shadeed - 20.abr.2008/Reuters
Diogo Bercito
Madri

No início deste mês, quando conversou com a reportagem da Folha, Hatun al-Fassi celebrava uma vitória pela qual havia lutado por longas décadas: foi uma das primeiras mulheres a dirigir na Arábia Saudita. Essa ativista de 53 anos foi no entanto detida nesta quarta-feira (27). A informação, inicialmente circulada nas redes sociais, foi confirmada pela rede de televisão árabe Al Jazeera.

Essa dinâmica de abertura social e repressão tem marcado a complexa modernização da monarquia saudita. Desde meados de maio outros 13 ativistas foram presos, enquanto o país era louvado no exterior por permitir que as mulheres por fim tomassem o volante.

 A Arábia Saudita também recentemente autorizou a abertura de salas de cinema pela primeira vez em décadas, ainda que em quantidades restritas (os cinemas exibiram “Pantera Negra”).

Fassi é uma das figuras emblemáticas nos movimentos de direitos civis sauditas. Escritora e pesquisadora da história das mulheres no país, ela anteriormente fez campanha para que as mulheres participassem de eleições municipais, algo permitido a partir de 2015. 

No dia 24, Fassi fez parte do seleto grupo de sauditas que puderam dirigir —era exigido que as condutoras já tivessem uma carteira de motorista em outro país, e ela tinha uma britânica.

“Finalmente consegui algo real”, a ativista disse à Folha por telefone às vésperas de poder dirigir, com a esperança de uma abertura mais ampla —mulheres ainda precisam da autorização de um homem para tomar diversas decisões pessoais, como a de viajar para o exterior. “É um documento que me foi negado a vida toda.”

Não está claro por que razão Fassi foi detida nesta semana. Outros casos recentes de prisão de ativistas envolveram acusações de laços com organizações estrangeiras, e diversas foram soltas em pouco tempo. 

A Arábia Saudita também deteve recentemente diversos de seus príncipes, acusados de corrupção.

Apesar de um primeiro momento de elogios, analistas têm criticado o ritmo da abertura saudita, com tantas idas e vindas. 

A liberalização da monarquia, uma das mais conservadoras do mundo, parece ademais ter uma motivação pragmática: o príncipe-herdeiro Muhammad bin Salman (conhecido pela sigla MBS) quer impulsionar a economia saudita, e a incorporação de mulheres à força de trabalho é vista como uma estratégia efetiva.

A economia da Arábia Saudita enfrenta desafios em especial devido à queda no preço do petróleo, com o que a monarquia oferece uma série de subsídios à população. 

Sem esse dinheiro, o receio é de que o país já não seja capaz de manter contida a insatisfação popular —a ideia é agradar os cidadãos com liberdades sociais, enquanto as liberdades políticas seguem negadas. 

“Por meio século, fomos discriminadas, marginalizadas. Agora, o país está mudando”, Fassi disse na entrevista, só algumas semanas antes de sua detenção.

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